14/10/14 02:40 - Atualizado há 10 anos
Por Alexandre Marques (*)
É entendimento comum da maioria dos síndicos e equipe diretiva que o condômino, antes de ser multado, quando da infração as regras do condomínio, deve ser advertido e que pode apresentar recurso a assembleia, sendo que esta última premissa, sempre gera dúvida, quando não consta expressamente da convenção à respeito.
Pois é, ainda que não expressamente previsto na convenção dos condomínios é entendimento comum, mormente nos dias de hoje da supervalorização do “politicamente correto” que o condômino (no sentido do previsto no §2º do artigo 1334 do Código Civil), antes de ser multado por infringir as normas condominiais constantes da convenção e do regimento interno, ou mesmo da deliberação assemblear específica, deve ser ADVERTIDO e, na reincidência, MULTADO. Ora, esta regra se aplica, com base no princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, que deve permear mesmo as relações condominiais, albergado na Constituição Federal da República do Brasil (inciso LV do Art. 5º):
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
João Batista Lopes e. doutrinador na área condominial do direito, assinala: “...a cobrança judicial, em juízo, segundo o magistério de João Batista Lopes "deverá ser instruída com prova de que o condômino foi regularmente cientificado da imposição da multa e nada alegou em sua defesa, ou ela foi rejeitada". E prossegue o ilustre jurista "a imposição e cobrança de multas pelo síndico, sem observância do direito de defesa acarreta nulidade desses atos por ofensa ao princípio básico de que ninguém pode ser punido (judicial ou extrajudicialmente) sem ser ouvido". (Condomínio, 9ª ed., pg. 194).” De forma mais atual Francisco Loureiro, Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, ensina em seu voto de julgado recente: "para imposição da multa, deve ser feita relevante diferenciação, tomando como base sua causa. Se houver previsão em ato constitutivo ou convenção, poderá o síndico aplicar diretamente a multa prevista para as hipóteses do art. 1.36, § 2º, do CC/202, antes conferindo oportunidade para a defesa do condômino apenado. Caso, porém, sejam o ato constitutivo e a convenção omissos, somente a assembleia poderá impor a multa, mediante quorum de dois terços dos condôminos restantes. No que tange às causas elencadas no art. 1.37, a regra é outra, pois somente a asembleia pode impor a multa. A regra é cogente e não pode ser suplantada por cláusula convencional que delegue ao síndico tal poder".(grifamos) Quanto ao síndico, como sabemos, compete cobrar dais sanções, sob pena de ser responsabilizado diretamente em caso de omissão: inciso VI do art. 1.348 do Código Civil compete ao síndico: "Compete ao síndico: cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas". Haverá, porém, situações infracionais que de tão gravosas, não cabe a prática da advertência e somente no caso de reincidência a aplicação de multa, pela direção condominial, sob pena de assim sendo, ocorrer uma verdadeira tragédia no condomínio. Por exemplo, o menor que é flagrado dirigindo veículo em alta velocidade ou morador que ao chegar embriagado em casa, da mesma forma dirige em alta velocidade e abalroa colunas e outros veículos. Outro exemplo bem comum é o do menor que atira objetos pela janela na área de trânsito de condôminos em área comum, enfim, inúmeras situações que no caso de uma reincidência, se ocorrer, pode ter resultados catastróficos, inclusive em termos de responsabilidade civil e criminal por parte do síndico e da massa condominial solidariamente. Nesses casos, entendemos que o condômino por ser diretamente multado e na reincidência multado de forma mais grave, como previsto nos §2º do Art. 1.336 e 1.337 e parágrafo único ambos do Código Civil. A gravidade da situação será tal que não será difícil ao condomínio comprovar em juízo até, se necessário, a conduta de risco e delitiva do infrator, seja por prova material, seja testemunhal. O que não pode é a equipe diretiva ser omissa em relação ao seu dever de atuar prontamente rechaçando tal postura delinquente, irresponsável e temerária por parte do condômino infrator. Leitores haverá que indagarão qual o embasamento legal para a imposição direta da multa, visto que sempre se lê da obrigatoriedade da advertência prévia e a defesa do morador, citamos para estes então:
O Código Civil é um diploma legal que tem como premissa maior a interpretação aberta de seus artigos de lei, da mesma forma a Lei de Introdução as normas do Direito Brasileiro (Lei 12.376/2010), assim estipula:
“Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”
Ou seja, dada a gravidade da situação, pode o condomínio multar e, o condômino que se sentir prejudicado recorrer da multa ao judiciário que jamais deixará de apreciar seu pleito: Artigo 5º da Constituição Federal da República, inciso XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito;" Assim, o juiz (julgador) irá relativizar as normas do condomínio, com a conduta descrita como gravosa, faltosa e irá julgar de acordo com os preceitos acima. Se razão assistir ao condômino este será tutelado pelo Estado. Lembramos ainda que o consagrado direito de defesa que o multado tem de apresentar seu pleito em assembleia, requerendo sua “absolvição” do ilícito imposto, não é atingido pela imposição direta da multa, ele pode sim, recorrer a assembleia subsequente para tentar anular a imposição da multa, como bem ressaltado por Loureiro, porém, se terá êxito ou não é outra história... O que não pode, o que não é crível, o que não é aceitável como razoável é a massa condominial ficar a mercê de um comportamento perigoso, colocando todos em risco, sob o pretenso guarda-chuva da ampla defesa e contraditório prévio a imposição de qualquer penalidade imposta ao condômino. Isso sim é inadmissível! Abusivo!
(*) Alexandre MarquesAdvogado militante Consultor em Direito Condominal; Colunista SíndicoNet; Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil; Especialista em Processo Civil pela ESA e Direito Imobiliário pelo UniFMU; Relator do Tribunal de Ética da OAB/SP , Diretor de Ensino da Assosíndicos (Associação de Síndicos de Condomínio Comerciais e Residenciais do Estado de São Paulo); Conferencista da OAB/SP, CRECI e SECOVI/RO; Sindicato dos Corretores de Imóveis de São Paulo, Conferencista convidado pela Faculdade Dois de Julho - Salvador/ BA, no curso de Pós-Graduação, Co-Autor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação”, Editora Saraiva, Articulista de vários meios de mídia escrita e falada.