03/04/24 09:31 - Atualizado há 7 meses
Você, síndico, não sabe o que fazer com as bicicletas abandonadas no condomínio, ocupando a garagem há anos? Pois é, o descarte de bikes esquecidas pelos moradores na garagem é uma questão que gera muitas dúvidas, pois envolve aspectos civis, ambientais e condominiais.
A seguir, serão apresentados os principais pontos a serem considerados pelo síndico para realizar o descarte das bicicletas abandonadas no condomínio de forma legal e segura. Vamos lá!
As bicicletas estão guardadas no bicicletário do condomínio, que é uma área comum de uso coletivo, conforme o artigo 1.331, § 2°, do Código Civil.
Essa área comum deve ser utilizada pelos condôminos de forma a não prejudicar o uso dos demais, conforme o artigo 1.336, inciso IV, do Código Civil. Além disso, essa área comum deve ser administrada pelo síndico, que tem o dever de zelar pela sua conservação e manutenção, conforme o artigo 1.348, inciso V, do Código Civil.
Nesse sentido, o síndico deve observar se a convenção do condomínio possui alguma previsão sobre o uso e o descarte de bicicletas no bicicletário.
Se a convenção do condomínio possuir essa previsão, o síndico deve segui-la, respeitando os direitos e os deveres dos condôminos, bem como as normas civis e ambientais aplicáveis.
Caso o documento não tenha essa previsão, é recomendável que o condomínio regularize essa situação, através de um regimento interno, devidamente aprovado por meio de uma assembleia geral, para regulamentar o uso e o descarte de bicicletas no bicicletário.
Essas regras deverão conter previsão clara acerca dos critérios para:
O síndico deve comunicar aos condôminos sobre a alteração na convenção e/ou do regulamento, por meio de edital afixado em local visível e de fácil acesso, informando os principais pontos da alteração e a data de sua vigência.
Independentemente da existência de previsão condominial ou não atinente à guarda e descarte de bicicletas abandonadas, a questão pode ser tratada com base na lei.
As bicicletas são bens móveis que pertencem aos seus proprietários, os quais, por sua vez, têm o direito de usá-las, gozá-las e dispor delas, conforme o artigo 524 do Código Civil.
No entanto, esse direito não é absoluto e pode ser limitado por normas de convivência social e de proteção ao meio ambiente. É certo, 'a priori', que o abandono de bens móveis pode acarretar a perda da propriedade, conforme o artigo 1.275, inciso II, do Código Civil.
Nesse sentido, antes de se cogitar o descarte de bicicleta alheia, o síndico deve observar se as bicicletas estão realmente abandonadas, ou seja, se os proprietários não manifestam interesse em recuperá-las, nem pagam as despesas de sua conservação, nem exercem qualquer ato de posse sobre elas.
Para isso, o síndico deve notificar os proprietários das bicicletas, por meio de carta com aviso de recebimento ou outro meio idôneo, informando sobre a intenção de descartar as bicicletas e concedendo um prazo razoável para que eles se manifestem.
Esse prazo pode variar de acordo com as circunstâncias do caso, mas recomenda-se que seja de no mínimo 30 dias, conforme o artigo 1.276 do Código Civil.
Se os proprietários não se manifestarem dentro do prazo, o síndico pode entender que houve o abandono das bicicletas e proceder ao seu descarte, desde que respeitadas as normas ambientais e condominiais aplicáveis.
Se, porventura, os proprietários se manifestarem dentro do prazo, o síndico deve devolver as bicicletas aos seus donos, mediante o pagamento das despesas de conservação, se houver.
Se os proprietários se manifestarem após o prazo, mas antes do descarte, o síndico deve devolver as bicicletas aos seus donos, mediante o pagamento das despesas de conservação, se houver, e de uma multa pelo atraso, caso esta seja prevista na convenção ou no regulamento do condomínio.
Se os proprietários se manifestarem após o descarte, entende-se por precluso o direito, eis que o condomínio agiu de boa-fé ao dar ciência ao proprietário acerca da necessidade de retirada da bicicleta, bem como iminente descarte caso o prazo previsto na notificação não fosse observado
É importante que todas as etapas sejam devidamente documentadas, desde as tentativas de contatar o proprietário, até as provas de que o descarte da bicicleta foi, de fato, realizado após exaurimento do prazo.
Isso porque se os proprietários podem recorrer à via judicial para reclamar danos, mas terão que provar que não houve abandono das bicicletas e que o síndico agiu de má-fé ou com negligência.
Se o dono da bicicleta não for condômino nem morador, como por exemplo, uma pessoa que já se mudou do prédio, o síndico deve tentar localizá-lo por meio dos dados cadastrais que ele forneceu ao condomínio ou por outros meios disponíveis.
Se ele não for condômino nem morador, o condomínio pode considerar o descarte como um serviço público. Nesse caso, o condomínio pode assumir a responsabilidade pelo descarte e pagar as taxas associadas.
O descarte de bicicletas abandonadas em um condomínio é possível desde que seja feito de maneira legal e de acordo com as normas ambientais.
As bicicletas são consideradas resíduos sólidos, que devem ser gerenciados de forma adequada, conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos (lei 12.305/10).
Essa lei estabelece que os resíduos sólidos devem ser submetidos à coleta seletiva, à reciclagem, ao reuso, ao tratamento ou à disposição final ambientalmente adequada, de acordo com as normas técnicas e sanitárias vigentes.
Além disso, essa lei determina que os geradores de resíduos sólidos devem ser responsáveis pelo seu manejo, desde a geração até a destinação final, observando a hierarquia de prioridades: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento e disposição final.
Nesse sentido, o síndico deve verificar se o condomínio possui um plano de gerenciamento de resíduos sólidos, que contemple as ações e os procedimentos para o manejo adequado dos resíduos gerados no condomínio, incluindo as bicicletas.
Se o condomínio não possuir esse plano, o síndico deve providenciá-lo, seguindo as orientações do órgão municipal competente. Recomenda-se também fazer uso de uma empresa especializada na coleta, no transporte e na destinação final dos resíduos sólidos, que atenda às exigências legais e técnicas.
A depender da demanda do seu condomínio, uma opção além do descarte das bicicletas abandonadas seria reformá-las para disponibilizar o uso gratuito e compartilhado aos moradores.
Além disso, vender as bikes reformadas, revertendo o valor arrecado para algum fundo do condomínio também é válido.
Outra alternativa para as bikes esquecidas na garagem do condomínio é a doação das mesmas para alguma instituição de caridade, que possa aproveitá-las para fins sociais, educacionais ou ambientais, como é o caso do Aromeiazero - uma ONG parceira do SíndicoNet.
Essa alternativa pode ser mais vantajosa para o condomínio, pois além de evitar o desperdício de recursos e a geração de resíduos, pode contribuir para a promoção da cidadania, da solidariedade e da sustentabilidade.
No entanto, a doação de bicicletas abandonadas no condomínio também requer alguns cuidados por parte do síndico, tais como:
Obter a autorização dos proprietários das bicicletas para a doação das mesmas, ainda que tacitamente, por meio de notificação, conforme já explicado anteriormente.
Se os proprietários não se manifestarem dentro do prazo, o condomínio pode entender que houve o abandono das bicicletas e proceder à doação, desde que respeite as normas ambientais e condominiais aplicáveis.
Escolher uma instituição de caridade idônea e reconhecida, que tenha interesse e capacidade para receber as bicicletas e utilizá-las de forma adequada.
Além do Aromeizaro, também temos o projeto "Bicicleta velha, bota pra rodar", em Santos, iniciado em 2017 como resultado de uma parceria entre a Associação Brasileira de Ciclistas (ABS), a ONG Sem Fronteiras e a Secretaria de Governo da cidade, tem como intuito a revitalização de bicicletas para posterior disponibilização para pessoas carentes.
A retirada das bicicletas pode ser agendada através do telefone (13) 3025-7373 ou 99135-0360. É possível realizar o agendamento também por e-mail, basta encaminhar para abciclistas768@gmail.com.
O síndico deve formalizar a doação das bicicletas por meio de um termo de doação, que deve conter:
O termo de doação pode ser inclusive registrado em cartório, para dar maior segurança jurídica à transação.
O síndico deve guardar uma cópia do termo de doação e exigir um recibo da instituição de caridade, comprovando a entrega e o recebimento das bicicletas.
O síndico deve comunicar aos condôminos sobre a doação das bicicletas, por meio de edital afixado em local visível e de fácil acesso, informando:
O síndico deve também prestar contas aos condôminos sobre a doação das bicicletas, por meio de relatório apresentado na assembleia geral ordinária ou extraordinária do condomínio, demonstrando a regularidade e a transparência da operação.
Concluindo, o descarte de bicicletas abandonadas no condomínio é uma questão que envolve aspectos civis, ambientais e condominiais, que devem ser observados pelo síndico para realizar o procedimento de forma legal e segura.
O síndico deve:
Uma alternativa ao descarte é a doação das bicicletas para alguma instituição de caridade, que possa aproveitá-las para fins sociais, educacionais ou ambientais, observado apenas que essa alternativa requer os mesmos cuidados do descarte. Isso evita possíveis conflitos futuros com a pessoa que se sentir eventualmente lesada pelo descarte realizado.
(*) Advogado, Sócio-Fundador do escritório "Garcia Advogados", Diretor da OAB/PG, pós-graduado em Direito do Trabalho e em Processo Civil pela Universidade Católica de Santos/UniSantos (Via Migalhas: https://www.migalhas.com.br/depeso/401270/descarte-de-bicicletas-abandonadas-em-condominio, com edição SíndicoNet).