07/07/21 03:20 - Atualizado há 3 anos
O equilíbrio financeiro é uma das premissas para o sucesso da gestão de um condomínio. E isso depende de alguns fatores, como bom planejamento, previsão orçamentária adequada e o compromisso dos condôminos em manter a cota condominial em dia.
Quando a arrecadação começa a ser inferior ao valor das despesas, a cobrança extrajudicial não surte efeito e a inadimplência vira uma bola de neve a ponto de comprometer o pagamento pontual de contas essenciais, a cobrança garantida em condomínio pode ser uma alternativa temporária (ou não) para colocar a casa em ordem. Mas exige cautelas por parte do síndico na contratação.
Nesta matéria você vai ver:
Uma modalidade que vem ganhando força pelo Brasil é a chamada cobrança garantida em condomínio, ou “crédito garantido”. Bastante difundido no Sul do País, segundo o advogado especializado em condomínios Zulmar Koerich, que atua em Santa Catarina, o sistema tem sido visto com bons olhos por parte de gestores de outras regiões também.
Basicamente a dinâmica da cobrança garantida em condomínio funciona assim:
"Ou seja, primeiramente o valor da contribuição dos condôminos será creditado à conta da garantidora que transferirá ao condomínio a totalidade da receita estimada, cobrindo a inadimplência e retendo o valor de seus honorários", explica Zulmar Koerich.
Resumo: o condomínio recebe mensalmente da garantidora o valor total da arrecadação prevista, em troca de um honorário por esta prestação de serviço, ficando a cobrança da inadimplência a cargo dela.
Para Roberto Piernikarz, diretor geral da administradora de condomínios BBZ, a garantidora é uma alternativa apenas quando um condomínio:
"Quando todas as medidas de contenção da inadimplência foram ultrapassadas, sofrendo o condomínio de forma descontrolada a ponto de impedir a realização de obras e melhorias no condomínio, bem como a contratação ou manutenção de serviços, a melhor solução é a contratação de uma empresa de crédito garantido", opina Zulmar Koerich.
Piernikarz concorda com ele: "A contratação de uma garantidora é a última alternativa para estabilizar a saúde financeira do condomínio. Quanto mais alta a inadimplência, mais alto vai ser o custo da garantidora. Os adimplentes saem prejudicados", alerta.
Por isso, o condomínio deve fazer um estudo prévio e cuidadoso sobre sua situação financeira, histórico de inadimplência etc antes de decidir pela contratação da empresa.
Dez dos 20 condomínios em que o síndico profissional Felipe Bonavite atua optaram por ter uma garantidora devido à grande desordem financeira em decorrência da inadimplência mensal recorrente, impactando o fluxo de caixa e comprometendo o pagamento das contas. Para ele, quando a inadimplência supera 11%, é a hora de avaliar a contratação de uma garantidora.
"Comecei a ter que pagar as contas com juros e multa de atraso. Cheguei a ter condomínio com R$ 500 mil de inadimplência acumulada. Todos os meses tinha uma inadimplência nova. É uma bola de neve", diz o diretor executivo da Bonavite & Carvalho, atua há mais de 12 anos principalmente na Grande São Paulo.
Segundo Bonavite, com a contratação da garantidora, a inadimplência mensal deixa de existir. "Com dinheiro em caixa, não só consigo pagar as contas em dia, como comecei a dar andamento a benfeitorias, como pinturas, troca de piso etc. que estavam paradas devido à falta de dinheiro", relata.
O condomínio mais crítico da carteira dele, com 400 unidades, estava com 25% de inadimplência e, após 1,5 ano com a garantidora, ficou abaixo de 7%. "O condomínio ficou saudável financeiramente. A garantidora ajuda também a atravessar crises, como a pandemia, em que há maior desemprego."
O síndico Fabio Quintanilha, da Grande Florianópolis, chegou a avaliar a contratação do serviço de cobrança garantida. A inadimplência no condomínio dele sempre foi bem controlada e não ultrapassava 2%.
DOWNLOAD 2: Cartaz de conscientização sobre a importância de pagar a cota em dia
"Porém, há um ano, a inadimplência aumentou, chegando a 8%. Alguns condôminos fecharam suas empresas, outros perderam o emprego e tem aqueles cuja receita familiar diminuiu muito. Infelizmente eles escolhem pagar outras contas onde a taxa de juros é maior ao invés de pagar a taxa de condomínio. Por esse motivo considerei avaliar a contratação de uma garantidora", justifica Quintanilha.
Ele compartilhou o assunto com os conselheiros. A primeira medida foi a contratação do serviço de cobrança extrajudicial. Se não resolver, vai convocar uma assembleia extraordinária para deliberar sobre as propostas de garantidoras.
Pode parecer um sonho para o síndico ter em caixa todo mês o valor integral da arrecadação e poder fazer tudo conforme o planejado: do pagamento das contas básicas às benfeitorias. Mas o gestor deve se lembrar que isso implica em uma taxa fixa mensal considerável durante o tempo de vigência do contrato com a garantidora.
Embora a taxa cobrada varie de acordo com o cálculo de risco do condomínio feito pela garantidora, se, por exemplo, a arrecadação for de R$ 100.000,00 e a empresa cobra 5% ao mês, ao final de um ano, o empreendimento terá pago R$ 60.000,00 pelo serviço - é aqui que os adimplentes saem prejudicados na visão de Piernikarz.
O condomínio não vai reaver o custo da prestação de serviços da garantidora. Na simulação citada, os R$ 60.000,00 poderiam ser usados em alguma benfeitoria, como um novo mobiliário e equipamentos para o salão de festas, por exemplo.
"O condomínio também deixa de auferir os rendimentos com as multas e juros daqueles que pagam poucos dias após o vencimento, ou mesmo após curto período de inadimplência", adiciona Zulmar Koerich.
Sim, a inadimplência é um ativo financeiro do condomínio, por mais esquisito que possa parecer.
"Quando um empreendimento tem uma inadimplência baixa, esta acaba por ser um ativo financeiro porque o condomínio vai receber dos devedores a qualquer momento com reajuste e atualização financeira: 1% juros + 2% correção", justifica Roberto Piernikarz, diretor da BBZ.
O principal benefício para o condomínio que contrata o serviço de cobrança garantida é o ajuste financeiro imediato. "Começa a resolver problemas de forma instantânea. É um crédito que chega em bom momento para equalizar as contas", diz Roberto Piernikarz, diretor da administradora BBZ.
Outros benefícios:
Guto Germano, sócio diretor da Pontual Garantidora, lista alguns diferenciais que uma empresa garantidora pode oferecer ao atender condomínios:
"Temos uma psicóloga que atua junto com a equipe de cobrança. Essa formação humana dos funcionários aliada à tecnologia, abordagem assertiva, linguagem e forma correta de falar com o condômino formam o componente do sucesso de recuperação de crédito", comenta Guto Germano, da Pontual Garantidora.
De acordo com ele, a empresa, que atende 700 condomínios em 9 estados, já foi contratada por empreendimentos com níveis de inadimplência entre 30% e 40% que, após o início da cobrança garantida, reduziu para 10%.
De acordo com o advogado Zulmar Koerich, para a contratação de uma garantidora, não basta a aprovação pela administração e conselho do condomínio.
"A contratação implicará em gastos mensais por um período mínimo de um ano, por isso tal contratação deverá realizar-se por meio de aprovação de assembleia, salvo previsão expressa na convenção autorizando", esclarece Koerich.
Guto Germano explica que a cobrança dos inadimplentes do condomínio passa a ser feita pela própria garantidora, que tem autonomia para firmar os acordos.
"A garantidora quer facilitar o pagamento para aqueles que não conseguem dentro da régua do condomínio, não temos interesse em levar o imóvel a leilão. Mas caso vire um processo judicial, escritórios de advocacia parceiros fazem a execução", relata o sócio diretor da Pontual Garantidora.
O advogado Zulmar Koerich esclarece que a empresa garantidora também se responsabilizará por cobrar os condôminos inadimplentes, não em nome próprio, mas em nome do condomínio.
"Ou seja, o condomínio não transfere a titularidade dos créditos para a empresa garantidora, que continua sendo do empreendimento, sendo este parte ativa nos processos de cobrança eventualmente promovidos", explica Koerich.
Os especialistas entrevistados apontam sete cuidados que o condomínio deve tomar na hora de escolher a empresa garantidora com a qual firmará contrato:
De acordo com o advogado Zulmar Koerich, o contrato celebrado entre a garantidora e o condomínio poderá se revestir de diferentes cláusulas, de acordo com a empresa contratada e até mesmo a região do País.
"Em Santa Catarina, por exemplo, como o serviço é bastante disseminado e a concorrência entre as empresas é acirrada, os honorários foram sendo reduzidos ao longo dos anos. Hoje há empresas que aplicam a retenção entre 2% e 5% do valor da receita. Há cerca de cinco anos ainda existiam empresas que aplicavam o índice de 6%", exemplifica Koerich.
Além de negociar bem o valor da taxa, o síndico deve se atentar também a outros pontos:
Quando o condomínio não tiver mais interesse na continuidade do serviço, o advogado orienta o empreendimento a estabelecer que, ao término do contrato, os valores em aberto seguirão o ciclo normal de cobrança e pertencerão com exclusividade à garantidora.
"O condomínio promoverá todos os atos necessários para a continuidade destas cobranças, como fornecimento de procuração, documentos, presença em audiência etc, mas não haverá reembolso por parte do condomínio", explica Koerich.
Assim que o condomínio ajustar suas finanças, recuperar o controle financeiro e estiver estabilizada, significa que a cobrança garantida cumpriu seu papel. "O condomínio não precisará mais do serviço e o contrato pode ser encerrado", diz Roberto Piernikarz, da administradora BBZ.
Embora a duração dos contratos varie de acordo com cada empresa ou negociação, a prática de mercado é de 12 meses, podendo ser mantida por mais tempo caso a inadimplência não tenha sido reduzida para o nível almejado.
Com o controle financeiro restabelecido, uma boa alternativa indicada por Zulmar Koerich é a formação de um fundo de contingenciamento voltado para compensar a inadimplência.
"Ao longo de um ano, por exemplo, constitui-se um caixa com a arrecadação de 5% da receita mensal (equivalente à taxa praticada por muitas garantidoras). Ao final do período, o condomínio terá reservas para suportar eventual inadimplência. A grande vantagem desta medida é que o valor gasto pelos condôminos ficará no condomínio", destaca o advogado.
Fontes consultadas: Fabio Quintanilha (síndico), Felipe Bonavite (síndico profissional), Guto Germano (Pontual Garantidora), Roberto Piernikarz (BBZ), Zulmar Koerich (advogado)