Retrofit

Condomínio com rooftop: Laje funcional e até lucrativa

Saiba as características e usos de um rooftop em condomínio residencial, vantagens, riscos e etapas para transformar a laje de cobertura em área de lazer

Por Thais Matuzaki

28/09/23 06:47 - Atualizado há 1 ano


As lajes de cobertura dos prédios podem deixar de ser áreas frias e obsoletas para serem transformadas em um espaço de lazer nas alturas bastante popular em condomínios comerciais: o rooftop. Em condomínios residenciais, esse local se torna um grande diferencial. 

Nesta matéria, apresentamos as características de um rooftop, as diversas formas de uso em condomínios residenciais (inclusive com intuito comercial), quais as vantagens e os riscos de reutilizar o topo do prédio como área de lazer, bem como quais as etapas para reformar esse ambiente com segurança técnica e jurídica. Confira e avalie essa ideia para o seu condomínio!

O que é um condomínio com rooftop?

Traduzindo do inglês, o termo rooftop significa "topo do telhado". Esse conceito arquitetônico utiliza a laje de cobertura dos prédios, também conhecida como terraço, para criar espaços de lazer em altura, promovendo mais privacidade e, claro, o maior atrativo: vistas panorâmicas dignas de uma boa selfie.

Os rooftops surgiram por volta dos anos 1980 nos Estados Unidos, por ali se popularizaram até ganharem a Europa e alguns países da América do Sul, como o Chile, por exemplo. No Brasil, esses espaços têm se tornado muito comuns em edifícios comerciais, principalmente no centro da cidade de São Paulo, como os já famosos Sesc Paulista, o bar Skye do Hotel Unique e restaurante Esther Rooftop.

É uma área que pode ser coberta ou ao ar livre, oferecendo diversas formas de ocupação, como um local para eventos, restaurantes, lounges e bares, ou mesmo só para relaxar e observar a paisagem.

Em condomínios residenciais, a laje de cobertura (considerada aqui uma área comum e não privativa de uma unidade) costuma ser utilizada como uma área técnica fria, onde normalmente encontram-se os reservatórios d'água, casa de máquinas de elevadores e as caixas de ar-condicionado.

Novos edifícios residenciais vêm sendo construídos com rooftops na cobertura, enquanto prédios já existentes têm apostado na reforma para transformar o espaço em uma área de lazer. 

Rooftops em condomínios residenciais podem abrigar piscina, jardim, solário, academia, espaço gourmet, salão de festas, mobiliários diversos, enfim, infinitas possibilidades de uso.

Dá para simplesmente ser um lugar de relaxamento e contemplação dos moradores, sendo possível praticar atividades como yoga, alongamento e meditação, bem como plantar uma horta ou mesmo tomar uma ducha gelada após um banho de sol numa espreguiçadeira e papear com os vizinhos. 

Vantagens de um condomínio com rooftop

O SíndicoNet conversou com quem tem experiência em projetar edifícios que utilizam a laje de cobertura como espaço de lazer. Marcelo Falcão, arquiteto e fundador da incorporadora especializada em retrofit SomaUma, e Milton Bigucci Junior, diretor-técnico da construtora MBigucci, listaram as vantagens de condomínio com rooftop, confira abaixo. 

Transformar uma área obsoleta e subaproveitada

De maneira geral, as lajes de cobertura dos edifícios residenciais são áreas técnicas frias que costumam acomodar caixas d'água, antenas de telefonia ou mesmo instalações de ar-condicionado. A depender do prédio, são espaços consideravelmente amplos e em boa parte vagos, mesmo com a presença de máquinas como essas.  

A síndica profissional Cassia Capuzzo conta que no Edifício São Tomás, prédio de 74 anos localizado no centro de São Paulo e tombado como patrimônio histórico, a antiga casa do zelador se integrou ao espaço que antes existia o telhado para dar lugar a um salão de festas, sala de ginástica, jardins e uma piscina. Veja, nas fotos abaixo, como ficou a piscina com espreguiçadeiras, áreas ajardinadas e a vista:  

"A casa do zelador não tinha mais utilidade, uma vez que a assembleia decidiu que o funcionário não moraria mais no condomínio. Assim o espaço ficou sem serventia, além de obsoleto, por isso decidimos transformá-lo numa área comum à disposição de todos os condôminos e mais moderna", ela descreve.

Nas fotos abaixo, o resultado da transformação em um salão espaçoso e funcional: 

Já no histórico Edifício Baronesa de Arary, situado na Avenida Paulista e inaugurado em 1957, o síndico morador Ignacio Aronovich pretende reaproveitar o topo do prédio até para uso comercial. Por enquanto, o projeto segue em estudo.

O local está dividido em duas partes. A primeira consiste em um salão de aproximadamente 200 m², no qual o casal de artistas e moradores Walmor Chagas e Cacilda Becker encenavam as peças que eram proibidas pelo regime militar. 

Esse espaço, que era conhecido como "Teatrinho da Paulista" por receber atores, saraus e diversos eventos culturais, foi arrematado em leilão, está desocupado, mas há grande chance de retornar às mãos do condomínio através de uma ação judicial.

"Encontrei nos arquivos do prédio uma pasta que continha um documento assinado pela Cacilda com firma reconhecida, doando o referido salão para o prédio. Estamos aguardando a decisão do juiz", comenta Ignacio. 

Enquanto isso, a segunda parte da laje de cobertura do Baronesa de Arary é uma área comum que possui cerca de 150 m² e aloca os reservatórios de água e antenas de locação de topo do prédio. 

"Nós temos muito a ser explorado. Se ganharmos na justiça a outra parte da cobertura onde se encontra o salão, aí o prédio ganha outro potencial, inclusive, para futuramente utilizar essa área para uso comercial, aberta à visitação e com direito a elevador panorâmico externo, já pensou?", anima-se Ignacio.

Resolve a escassez de área de lazer no térreo

Reformar o topo do prédio para reutilizá-lo como área de lazer é uma ótima opção para condomínios que não têm mais espaço no térreo para criar esses ambientes, como é o caso do Baronesa de Arary que só possui um jardim interno. 

"Devido à localização das lajes de cobertura, sempre com vista privilegiada, faz todo sentido investir nesse tipo de espaço. Em todos os nossos projetos usufruímos desse lugar, a exemplo o RBS 700 e o Edifício Virgínia, ambos localizados na região central de São Paulo",  situa Marcelo Falcão, da SomaUma.

Abaixo segue foto do rooftop do edifício RBS 700, concebido pelo escritório SomaUma.

Baixo investimento

É possível criar um rooftop no topo do prédio do condomínio sem desembolsar grandes valores. Dispor objetos simples pelo ambiente, como vasos, cadeiras, mesas e pufes confortáveis já são suficientes para mudar o espírito do lugar. 

No entanto, tudo vai depender da concepção do projeto. No caso do Edifício São Tomás, por exemplo, a reforma da cobertura custou caro, não só por conta das instalações mais complexas (piscina e jardins), mas, sobretudo, pelo prédio ser tombado. Isso exigiu apresentar previamente o projeto ao Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico) para obter a autorização para executar a obra.

Vista privilegiada

Esquina com o Masp e vizinho do Parque Trianon, o Baronesa de Arary realmente é fora da curva neste quesito.

É um mirante de 360º da cidade de São Paulo. Dá para avistar os prédios gigantescos do bairro do Tatuapé na Zona Leste, o Pico do Jaraguá e a Chácara do Jockey na Zona Oeste, bem como o Parque Ibirapuera, além de contemplar os aviões do Aeroporto de Congonhas sumindo em meio aos prédios de Moema.

Isso sem contar os eventos que tomam conta da Avenida Paulista, como Parada LGBTQIAP+, Corrida de São Silvestre e o Réveillon. 

"Já é um prédio icônico e se conseguirmos fazer um mirante, ele literalmente abrirá novos horizontes, com enorme potencial para virar um ponto turístico. Dali as pessoas poderão enxergar a cidade de outra forma e isso tem muito valor. Basta olhar aos sábados e domingos as filas de um quarteirão para entrar no Sesc Paulista", conta o síndico Ignacio. 

A maioria dos edifícios que citamos até agora está localizada em São Paulo, próximos a diversos pontos turísticos, mas a verdade é que a partir da perspectiva do topo dos prédios, qualquer paisagem vista das alturas se torna exuberante. Como resume Ignacio, você tem "um oásis de tranquilidade ao ver tudo lá de cima!".

Bem estar aos moradores e convívio social

De acordo com Ignacio, antes de pensar a laje de cobertura do condomínio como uma forma de receita, o mais importante é o síndico enxergar esse projeto de reforma como uma oportunidade de melhorar a qualidade de vida dos moradores e a convivência entre os vizinhos. 

Quem mora nos andares mais baixos de um prédio é impossível ter uma vista privilegiada, muito menos da cidade. E mesmo os apartamentos que ficam lá em cima, mas não dispõem de varanda/sacada e estão "enjaulados" por telas de proteção, acabam restringindo um pouco a experiência de desfrutar da paisagem. Um condomínio com rooftop cria novas perspectivas.

No Baronesa de Arary, os moradores das quitinetes de 37 m² poderão deixar um espaço reduzido e ganhar amplitude, sem precisar sair do condomínio. Para Ignacio, é um "acréscimo na qualidade de vida".

"Observar as coisas de cima é uma forma de aumentar o alcance das pessoas para elas vislumbrarem algo mais distante. Poder enxergar da sua casa o horizonte numa cidade que é tão verticalizada, densa e populosa como São Paulo, é um privilégio que faz a diferença na saúde mental", continua Ignacio.

Na foto abaixo, vista do por do sol do topo do Baronesa para a Avenida Paulista:

Mais do que prestigiar a vista, um condomínio com rooftop ganha mais um espaço de lazer para ser palco de encontros entre os vizinhos e fortalecimento dos laços. Organizar um grupo para a prática de yoga e outras atividades nesse ambiente só tende a melhorar a convivência em comunidade.

Valorização do patrimônio

Aqui é a junção de todas as outras vantagens listadas acima. Sair de uma quitinete de 37 m² e em questão de segundos estar na cobertura do prédio que oferece um mirante de 360º da cidade com certeza é uma condição que faz a diferença na hora de comprar ou vender o imóvel e ainda valoriza o condomínio. 

Etapas para um condomínio transformar a laje de cobertura em rooftop

A reforma da laje de cobertura do condomínio em rooftop precisa passar por algumas etapas para que seja feita com segurança técnica e jurídica. São elas:

1) Estudo técnico e legal

Tudo dependerá do uso e do projeto. Mas a princípio, segundo o advogado e síndico profissional Maicon Guedes, qualquer novo elemento que traga carga adicional ao terraço do condomínio deve integrar um estudo aprofundado feito por engenheiro com conhecimento em cálculo estrutural.

Nesse sentindo, se o condomínio optar por um jardim, com árvores e um volume significativo de terra, por exemplo, será necessário uma avaliação estrutural para checar se laje, pilares e vigas vão precisar de algum reforço.

Além disso, o peso esperado de pessoas que frequentarão o espaço também deve ser levado em conta. Um espaço de laje utilizado por duas, quatro pessoas por metro quadrado ao mesmo tempo, em regra, estará dentro dos limites já previstos.

Caso o rooftop seja aberto para visitação externa, é bem provável que o acúmulo simultâneo de pessoas seja maior do que um espaço de uso de exclusivo de moradores. 

"Imagina se mil pessoas subirem até a cobertura para assistir aos fogos no Réveillon, essa estrutura não foi feita para sustentar o peso de tanta gente. Então precisamos ter um laudo de um especialista para fazer esse teste de carga, que determinará quantas pessoas podem estar lá de uma vez só", reforça Ignacio.    

Aprovação da Prefeitura

Se o projeto do rooftop do condomínio contemplar um acréscimo de área, como um novo salão de festas ou área gourmet, há necessidade de aprovação pela Prefeitura, com expedição de alvará, cálculo do potencial construtivo e registro na matrícula mãe do empreendimento.

Deve-se observar também se a construção da nova estrutura está dentro do coeficiente de aproveitamento (área total, em metros quadrados, que pode ser construída dentro de um terreno) permitido pela Lei de Zoneamento do município.

Não havendo aumento de área construída, como um parquinho, bancos, horta, redário, instalação de pergolados ou pequenas reformas como pintura e troca de piso, não são necessários trâmites de aprovação de projeto junto a órgãos públicos ou mesmo cuidados com potencial construtivo.

De toda forma, é muito importante que qualquer intervenção no espaço seja examinada e respaldada por especialistas, afinal, alguns projetos complementares podem ser necessários, como veremos mais para frente.

Aprovação em assembleia

Se a laje de cobertura que se transforma em rooftop não passar por obras e continuar uma área livre, o advogado Maicon assegura que o quórum de maioria simples é suficiente. Caso envolva obras, vai depender se útil (maioria absoluta) ou voluptuária (2/3 dos condôminos).

Pensando em condomínios residenciais que desejem abrir o rooftop para o público externo com intuito comercial, alterando a destinação do edifício para uso misto, deve-se respeitar o quórum de 2/3 dos condôminos segundo a recente Lei 14.405/22

Caso aprovada a obra/uso do rooftop do condomínio, Maicon orienta que na mesma assembleia seja definido um regramento próprio para conservar o espaço e manter um convívio respeitoso entre os condôminos. Lembre-se destas: 

Riscos e pontos de atenção ao criar um rooftop na laje do condomínio

Durante a reforma de uma laje de cobertura em rooftop são vários os pontos de atenção, mas as questões de segurança e acústica se sobressaem.

A segurança é por conta da altura elevada. Para Ignacio, é preciso lembrar que infelizmente o espaço também se torna um local para as pessoas praticarem coisas ruins, desde arremessarem coisas ou mesmo atentados contra a própria vida, por exemplo.

Guarda-corpos acima do 1,10m indicado pela ABNT NBR 14.718 e instalação de câmeras de segurança são indispensáveis. Ignacio é ainda mais cauteloso e sugere a contratação de um bombeiro civil

"Sou contra alguém simplesmente pegar a chave da cobertura e subir, pois não dá para contar com a boa vontade dos condôminos de que eles vão se comportar. Ter um profissional acompanhando o espaço assegura que ninguém se pendure no guarda-corpo, atire objetos ou se jogue dali. A meu ver, não adianta ter câmeras, pois não dá tempo de chegar lá em cima e impedir algo. É um custo a mais para o condomínio, mas pode ser feito por fases, começando aos finais de semana, por exemplo", ele recomenda. 

Por mais esse motivo que é muito importante contar com o apoio de um engenheiro para pensar nesse tipo de projeto, uma vez que situações de risco como essas podem ser minimizadas com a devida orientação técnica. 

Em relação à acústica, a preocupação existe em função dos andares superiores que estão próximos à cobertura, sobretudo, dos apartamentos situados logo abaixo.

É muito importante preservar o sossego desses moradores, investindo em isolamento acústico e sempre reforçando a todos sobre as regras de uso

Paralelo a isso, de acordo com o projeto arquitetônico, pode ser necessária a contratação de projetos complementares, como elétrica, hidráulica e impermeabilização (principalmente se forem feitos jardins e piscina, pois o risco de ocorrer infiltrações é maior).

Como a maioria das edificações possui elevadores que vão até o último andar de pavimento-tipo, exigindo a utilização de um lance de escada para acessar a cobertura, adequações de acessibilidade também podem ser inevitáveis. 

Por fim, sendo esta mais uma área de lazer, representando, portanto, mais despesas com manutenção e limpeza, é possível que a taxa condominial sofra algum aumento. 

Condomínio residencial com rooftop para uso comercial

Na visão de Marcelo, a transformação da laje de cobertura de um condomínio residencial em rooftop para visitação externa causaria mais problemas do que soluções.

Em condomínios comerciais e mistos, esse projeto pode ser mais fácil pois não configura mudança de destinação de edifício, assim, dispensa aprovação em assembleia nesse sentido (mas se tiver obras, prevalece o quórum citado acima).

Fora isso, os procedimentos e a estrutura de controle de acesso estão mais apropriados a lidar com esse tipo de demanda e público. 

"O acesso ao rooftop precisa ser independente da área residencial, senão não vai funcionar", adverte Marcelo. Além disso, seria necessário um estudo da viabilidade técnico-financeira, uma vez que o trânsito de pessoas estranhas ao condomínio demandaria investimentos em segurança, tecnologia e treinamentos/equipe.

"Dessa forma, o síndico precisa verificar se as receitas geradas farão valer a pena o investimento", finaliza Maicon Guedes.

Fontes consultadas: Marcelo Falcão (arquiteto e fundador da incorporadora especializada em retrofit SomaUma); Milton Bigucci Junior (diretor-técnico da construtora MBigucci); Cassia Capuzzo (síndica profissional); Ignacio Aronovich (síndico morador); Maicon Guedes (CEO da Informma Síndicos, síndico profissional e advogado).