Administração

Cota condominial

Mudança no sistema de cobrança se faz cada vez mais presente

Por Mariana Ribeiro Desimone

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014


APARTAMENTOS MAIORES PAGAM MAIS, É JUSTO ISTO?
 
A minha resposta a esta pergunta é: DEPENDE.
 
Depende porque em alguns casos é justo sim pagar mais, mas em outros é injusto. E o grande erro de algumas pessoas é adotar a resposta mais conveniente sem antes entender o porquê que depende, e é este entendimento que pretendo demonstrar abaixo.
 
Para condomínios onde todas as Unidades são iguais este texto é de pouca valia, pois ele é mais destinado aos condomínios com unidades de diversas frações ideais (tamanhos), com coberturas etc. e, consequentemente, valores de taxa condominial desiguais.
 
Mesmo ciente de que há um enorme paradigma a ser vencido por muitos leitores, numa só frase eu gosto de definir o seguinte: é INjusto que unidades maiores paguem mais SE todas as contas de consumo já estiverem individualizadas, pois o que resta para o rateio ordinário não é imposto, mas é a simples divisão de despesas que independem da fração ideal.Ponto.
 
E tendo em vista o aumento dos proibitivos custos de se morar em condomínios, este tema tem ganhado espaço e temos tido notícias de projetos de lei, sentenças judiciais, debates entre especialistas condominiais, ou calorosas discussões entre condôminos e, a meu ver, toda essa confusão se deve a esta má interpretação do problema e a indefinição das Leis, sendo assim, vou expor abaixo o que penso, de forma bastante detalhada. Não para tentar convencer, mas sim, para levar a uma reflexão pragmática e talvez, a um novo posicionamento de cada um.
 
Não raro em alguns prédios, ouvimos outra pergunta: “É justo quem mora no térreo (ou no 1º andar) pagar igualmente pela taxa do elevador?”. A resposta para elevador não é simples devido a outros fatores envolvidos, e poderíamos mencionar outras perguntas como: “Eu não uso a piscina, ou a quadra, etc. etc.”, então, vamos pular essas polêmicas para não complicar ainda mais.
 
Voltando ao ponto deste texto, a má interpretação que falei é porque algumas pessoas insistem em confundir despesas ordinárias com impostos, e somente estes, os impostos, é que devem ser proporcionais ao valor patrimonial. As despesas ordinárias, nem sempre. Ponto.
 
Vejamos as Leis: Lei dos Condomínios/1964, § 1º, artigo 12: “Salvo disposição em contrário na Convenção, a fixação da quota no rateio corresponderá à fração ideal de terreno de cada unidade.”, e
Inciso I, do artigo 1.336, em Jan/2002: “contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais” e aí alguém disse: “Ops! Comemos bola!” e em Ago/2004, acrescentaram o: “salvo disposição em contrário na convenção.”, portanto, está claro que desde 1964 que os legisladores deram liberdade aos condomínios para decidirem por si mesmos a fórmula que achassem
justa para o rateio das despesas, sendo elas ordinárias ou extraordinárias. Bastando que esta vontade esteja expressa na respectiva Convenção.
 
Pois bem, penso que quando os legisladores estavam escrevendo a Lei dos Condomínios em 1964 e chegaram ao impasse do rateio das despesas, eles quiseram encontrar uma fórmula justa de divisão para obrigar através da Lei, e começaram a computar quem mora no térreo, quem tinha carro, idade, número de moradores por unidade e um cem número de variáveis, e a formula foi ficando imensa e impraticável. E aí, me permito supor que num dado momento, para não desistirem de definir algo, os legisladores se voltaram para o “consumo”, que é óbvio, varia proporcionalmente ao maior ou menor número de pessoas consumindo.
 
E chegaram ao passo seguinte, que é outra suposição: acharam que para a Lei fazer alguma justiça, o rateio deveria ser proporcional à área da unidade, uma vez que em unidades maiores, mais pessoas poderão morar e o consumo ser maior. Mera possibilidade.
 
Mas tanto não ficaram satisfeitos com este raciocínio que incluíram o famoso: “salvo disposição contrária na convenção”. É claro que nesta minha suposição do parágrafo anterior não estou levando
em consideração alguns detalhes, e até poderia excluir esta quase brincadeira, mas tendo sido ou não o raciocínio de 1964, adiante verão que fazem sentido as minhas afirmações, não para despesas extraordinárias, mas sim para a Taxa Ordinária, que é o “rateio das despesas previsíveis com antecedência”, composta pelos consumos, salários, e outras parcelas.
 
Então, vamos imaginar o seguinte exemplo: a construtora acabou de construir um edifício residencial com 38 aptos, sendo 18 de 2 dorms, 18 de 3 dorms, e 2 coberturas. Vendeu todas as unidades, mas ninguém poderá entrar no prédio por um motivo qualquer nos próximos 3 meses, porém, os serviços de portaria e limpeza já foram contratados. Ou seja, ninguém está morando, subindo ou descendo de elevador, gastando água ou gás, então por que razão as coberturas teriam que pagar mais caro pela taxa ordinária? Ou seja, seria INjusto porque as despesas até então contraídas INDEPENDEM do tamanho dos aptos. O porteiro estará lá tendo ou não moradores. Certo?
 
Prédio liberado, todos já terminaram as suas reformas e já estão morando. Os salários continuam os mesmos, não sobem só porque agora mais pessoas passam pela portaria, mas as contas de água, gás e eletricidade sobem imediatamente e aí, passa a ser justo que aptos com mais pessoas morando paguem mais porque consomem mais tudo. Certo? Mas fazer o rateio pelo número de pessoas seria impossível, pois em determinado mês a família foi viajar, ou recebeu os parentes do interior e por aí vamos encontrando hipóteses para tornar inviável o rateio pelo número de pessoas e voltamos à mera “possibilidade” de mais pessoas em aptos maiores, ou seja, ratear proporcionalmente à fração ideal do terreno. E penso que foi assim que esta forma de ratear se tornou quase uma regra.
 
Mas também gosto de pensar que se em 1964 as contas de consumo já fossem todas individualizadas, os legisladores já teriam definido que as contas restantes: salários, água e luz das áreas comuns, fossem igualmente divididas pelo número de unidades e não proporcionais à área, pois o consumo por pessoas, cada unidade já estaria pagando o seu.
 
Eu poderia parar por aqui, mas como até mesmo eu levei um bom tempo para me livrar do paradigma de confundir consumo com imposto, pois eu também achava que quem comprou a cobertura tinha que pagar mais, vou prosseguir com uma analogia que me ajudou a mudar: um mesmo cidadão comprou a cobertura e também uma Ferrari. Pagou milhares a mais pelos seus bens. Pagou e pagará impostos (IPTU e IPVA e até seguros) muito mais caros que os demais proprietários do seu predio. Mas quando ele vai ao posto abastecer ou trocar o óleo de sua Ferrari, pagará os mesmos preços que pagará o dono de um carro popular. Ou seja, o consumo independe do valor patrimonial, porque não é um imposto. Até o pedágio de uma Ferrari é igual ao de um Fusca, ou não é verdade?
 
Há ainda outro importante e pertinente argumento contra as cotas iguais que é o “seguro predial obrigatório”, pois em caso de sinistros o seguro predial deverá pagar ao dono da cobertura um valor proporcional ao patrimônio e não um valor igual um apto de 2 dorms. 
 
Perfeita a observação. Mas para mim, após muito refletir, não se concretizou como uma razão suficiente.
 
E sem querer polemizar, sabemos que o “seguro predial” é uma despesa ordinária, instituído por mais uma Lei brasileira que retira do cidadão um direito e impinge-lhe um dever (tipo o voto). E o que a Lei exige é que o seguro cubra toda e qualquer hipótese de destruição total ou parcial da edificação. Mais nada. Ponto. Mas basta olhar qualquer apólice de seguro (e concordo com elas) e iremos encontrar, entre outras coberturas, inclusive, “responsabilidade civil do síndico”, e o que o dono da cobertura tem com isto? Ou seja, por causa de uma remota possibilidade de sinistro, eu não acho justo que eternamente a cobertura pague mais que os outros, até porque, sabemos que no “pacote” estão coisas que independem das áreas ou do valor do patrimônio das Unidades. Talvez, o mais o justo seria o seguro ser desmembrado como pode ser o IPTU e mais, não ser obrigatório por Lei, e sim um opção de cada um.
 
O tema é complexo como quase todos na área condominial, mas, em síntese, é o que eu penso a respeito de seguros. Finalizando: é claro que o rateio igual até mesmo para prédios com todos os
gastos/consumos individualizados não é a fórmula perfeita. Não é. Mas a comum divisão proporcional também não é perfeita e nem é justa, pois há os diversos fatores que não entram na conta, como por exemplo: aqueles que moram nos andarem mais baixos, ou os que moram sozinhos, ou não possuem carro, ou os aptos pequenos que moram 200 pessoas, há os que têm banheira, e por aí vai uma infinidade de variáveis impossíveis de serem computadas.
 
E só mais algumas considerações:
 
Neste meu arrazoado não defendi a implantação indiscriminada de cotas condominiais iguais. Eu quis tão somente estimular a reflexão de todos para observarem que podem estar sendo vítimas da mesmice condominial, criada ao longo de muitos anos quando não era possível a fácil individualização de todos os consumos;
 
Espero ter conseguido deixar claro que consumo não é imposto e é sobre esta verdade que os justos devem se debruçar para decidir como deverão fazer o rateio de suas contas; Não justo que alguém pague mais só porque pode pagar mais. É um abuso, é se aproveitar dos outros;
 
O salão de festas não fica maior, ou melhor quando os proprietários da cobertura o alugam, no entanto, não é raro em alguns condomínios, onde a mesmice impensada impera, eles pagarem mais caro, pois o aluguel é definido por um percentual X da cota ordinária;
 
E o que diz a Constituição sobre todos serem iguais?  Repito: este meu raciocínio se aplica somente às cotas ordinárias, pois as extraordinárias provavelmente seja mais justo permanecerem proporcionais à área; e Sei que a reflexão, aceitação ou negação da minha lógica não encontrará unanimidade, pois senso de justiça não é 2+2=4, e é algo que varia de pessoa para pessoa, e muitas serão influenciadas pelos seus interesses para não pagar mais ou para pagar menos.
 
Conclusão: Não creio que o Estado deve interferir e mudar a Lei, pois o “salvo  disposição contrária na convenção” já estimula que cada condomínio, no uso dos seus direitos, busque e adote um rateio igual ou desigual adequado a sua realidade, e que com toda certeza, não importando qual alternativa adotem, não será a fórmula perfeita, mas poderá ser a fórmula mais justa. Só não acredito que a imensa maioria das pessoas que pagam menos aceite pagar mais, mesmo entendendo ser isto o mais justo.
 
E encerro com uma frase do pensador Alexandre Herculano: “Eu não me envergonho de corrigir meus erros e mudar as minhas opiniões, porque não me envergonho de raciocinar e aprender." É o que eu penso.
 
Nilson Soares,
55 anos, é Síndico Profissional, presta assessoria condominial desde 2006 e é membro da ASSOSÍNDICOS.