30/12/21 03:56 - Atualizado há 2 anos
Por Marilen Amorim*
Em plena era tecnológica, vivemos tempos de ultraconexão. É preciso falar sobre o descanso do empregado, o chamado "direito à desconexão", que é o direito de "se desligar" do trabalho, de poder aproveitar o tempo livre, dedicar-se a atividades pessoais, familiares.
Esse direito à desconexão pode incluir desligar o computador, o telefone ou qualquer outro meio tecnológico utilizado para a comunicação com o empregador.
A obrigatoriedade da concessão de descanso não é novidade e sempre esteve presente na legislação trabalhista brasileira com a finalidade de proporcionar ao empregado a oportunidade de repor suas energias físicas, mentais e emocionais.
A própria Constituição Federal traz a limitação da jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 semanais. Temos também outras normas trabalhistas que tratam dos intervalos de descanso do trabalhador, como o intervalo intrajornada (dentro da jornada diária) e o intervalo interjornada (entre um dia e outro de trabalho).
Porém, o controle era mais fácil em tempos de trabalho exclusivamente presencial. Como o ambiente de trabalho moderno foi alterado pelas novas tecnologias de comunicação, quase não há mais limites entre a vida profissional e a pessoal.
Se, de um lado, as ferramentas digitais trouxeram mais facilidade aos empregados, por outro, também têm criado muitos problemas quando não há imposição de limites adequados.
crescente movimento social buscando a discussão do direito à desconexão.Apesar de não termos uma legislação específica sobre o tema, como em outros países, já começam a aparecer projetos legislativos, como o PL nº 4931/2020, que surgiu para aperfeiçoar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) no que se refere ao teletrabalho.
O texto do PL foi inspirado no Acordo-Quadro Europeu sobre Teletrabalho, no Código do Trabalho de Portugal, no Estatuto dos Trabalhadores da Espanha, no Anteprojeto de Lei de Trabalho à distância da Espanha e na lei francesa relativa ao direito à desconexão.
O documento prevê que "o empregado em regime de teletrabalho terá direito à desconexão digital, a fim de garantir o respeito a seus períodos de descanso e férias, bem como a sua intimidade pessoal e familiar".
Apesar do projeto de lei se referir especificamente ao teletrabalhador e o trabalho nos condomínios ser essencialmente presencial, não há dúvidas que este assunto se aplica também ao ambiente condominial.
Nesse sentido, cabe aos empregadores se atentarem para a necessidade de criação de regras que regulem, de forma clara e razoável, o uso dos meios telemáticos de comunicação.
Na ausência de normas gerais sobre o tema, ele deve ser tratado por meio de políticas internas, sob pena da criação de passivo trabalhista não só por eventual dano existencial, mas também por danos à saúde e segurança do trabalho, em razão de acidentes ou doenças ocupacionais decorrentes do excesso de jornada.
Além disso, é uma questão de responsabilidade social, já que o direito a se desconectar do trabalho não é um direito individual do trabalhador, mas da família e de toda a sociedade.
(*) Marilen Maria Amorim Fontana é advogada especialista em Direito Imobiliário e Previdenciário; membro efetivo da Coordenadoria de Direito Condominial da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB-SP.