Jurídico

Em litígio

Condomínio em Goiânia é fruto de disputa entre partes há 20 anos

Por Mariana Ribeiro Desimone

terça-feira, 10 de junho de 2014


Condomínio de incertezas

Embate judicial deixa famílias locatárias com futuro indefinido
 
Desde o ultimo sábado moradores de 65 apartamentos do Residencial Negrão de Lima estão duvidosos sobre seu futuro no local. O condomínio, localizado no Setor Negrão de Lima, em Goiânia, está sendo requerido por duas partes que brigam na Justiça, tanto em âmbito estadual, quanto federal. Diante de uma decisão judicial favorável à Construtora Leo Lynce, as famílias residentes tiveram que escolher entre ser desalojadas ou pagar aluguéis mais caros, quase o dobro do que pagavam. 
 
O prazo máximo para as pessoas deixarem seus apartamentos foi ontem, pela manhã, até as 10h. O mandato de reintegração de posse à Construtora foi dado pelo juiz Ricardo Teixeira Lemos, e previa que a ordem fosse cumprida por dois oficiais de Justiça, bem como por reforço policial. O juiz entendeu que os imóveis "vinham sendo administrados de forma delituosa por José Eduardo Yaghi".
 
Este ostenta uma decisão do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, dando-lhe direitos, e a seu sócio, sobre cerca de 140 apartamentos no residencial. Nesse fogo cruzado entre as partes litigantes, os moradores estão se organizando para terem garantias respeitadas. Renato Gomes Rodrigues, 39 anos, mora em um dos prédios do condomínio, desde janeiro de 2010, e resolveu contratar um advogado para conseguir manter-se em sua casa.
 
Segundo ele, no sábado, pela manhã, havia 12 caminhões de mudanças para tirar as famílias que moram nos apartamentos reintegrados à construtora. "Eu contratei um advogado para defender a minha moradia", conta. Mas, conforme suas informações, quatro famílias teriam se mudando ainda no fim de semana passado.
 
Aluguel
 
Para não sair do apartamento que locava de José Eduardo, por R$ 450, ele assinou um contrato, ontem, com a construtora no valor de R$ 800. "O problema é que já pagamos por esse mês para o José Eduardo, e agora, de acordo com o contrato, precisamos pagar a Leo Lynce até dia 10 [hoje]".
 
Sobre o valor do novo aluguel o síndico do residencial há dois mandatos, Carlos Alberto Nascimento, comenta que haverá uma reunião na próxima quarta-feira, 18, com o novo fiel depositário Leo Lynce Roriz de Araújo. A intenção é de que se discuta o valor, que para o síndico é inviável devido às condições estruturais atuais dos apartamentos em questão.
 
Conforme Carlos Alberto, o aluguel de um apartamento de dois quartos é de R$ 700 e o de três quartos R$ 800. De acordo com o síndico os valores cobrados anteriormente ficavam entre R$ 450e R$ 600.
 
Orientado por seu advogado, Renato pretende formar uma associação dos moradores para enfrentar a questão. "Queremos pagar nossos aluguéis em juízo e até ser definitivamente decidido que tem direito ao residencial", informa o locatário. Ontem, uma reunião foi realizada para decidir quais os próximos passos que os moradores tomarão diante do embate que cria uma instabilidade em suas vidas, de acordo eles.
 
Segundo Alex Paulino, advogado contratado pelos moradores, os locatários querem agora fazer uma negociação com os três envolvidos, Construtora, Caixa Econômica Federal e José Eduardo, para tentar adquirir os imóveis. "Eles já foram fiéis depositários dos imóveis em que moram. É uma questão muito complicada, mas é um momento bom para negociar", alega.  
 
Outra decisão, segundo o advogado, é contestar judicialmente o atual contrato com a construtora. "Esse contrato foi imposto, os moradores foram coagidos a assiná-los ou seriam despejados", comenta Alex.
 
De acordo com ele os moradores do local não podem ficar sem destino. "A construtora alega que construiu, a Caixa alega que pagou a construção e ainda tem o José Eduardo requerendo a posse por não pagamento pela construtora, enquanto os moradores ficam sem saber o que acontecerá", completa o advogado.
 
Entenda o caso
 
A história do residencial é antiga e passa por muitas fases. Tudo teria começado, na década de 1980, quando a Construtora Leo Lynce teria comprado de Francisco Negrão de Lima 20 terrenos. Conforme José Eduardo Yaghi, o valor atual dos terrenos equivaleria a cerca de R$ 10 milhões. De 1989, há uma certidão de confissão de dívida em que a Leo Lynce Engenharia e Comércio se compromete a ceder a Roberto Negrão de Lima, filho de Francisco, os imóveis já que não houve pagamento pelo terreno.
 
José Eduardo tornou-se sócio de Roberto e hoje é o responsável pela locação de 140 imóveis, conforme sua contabilidade. Segundo ele, a Construtora teria "comprado os terrenos sem pagar, realizado dois financiamentos com a Caixa Econômica Federal, em valores exorbitantes, sem concluir os imóveis, não pagou os funcionários e não registrou o empreendimento, além de vender ágios a promitentes compradores sem entregar os imóveis".
 
Em 1993, foi iniciada uma ação em esfera federal para tentar resolver a questão do Residencial Negrão de Lima. Em 1996, quem tinha adquirido o ágio de apartamentos, teria começado a invadir o local. Também é deste ano o início da ação em âmbito estadual. Em 2000, José Eduardo, de acordo com o mesmo, teria encontrado a estrutura do condomínio em situação de abandono e desde então teria tentado juntamente com o sócio a retomada do empreendimento.
 
Em 2008, os dois teriam entrado na Justiça Federal contra a construtora, obtendo decisão favorável, tendo José Eduardo se tornado fiel depositário dos apartamentos. Depois de 13 anos, a construtora conseguiu 65 apartamentos de volta, tornando-se nova fiel depositária.
 
Conforme as informações obtidas pelo Diário da Manhã, a construtora alega que a documentação que José Eduardo tem não seria verídica. A reportagem tentou entrar em contato com o advogado da Leo Lynce, para ouvir a versão desta parte, mas não obteve sucesso até o fechamento da edição. 

Fonte: http://www.dm.com.br/