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Locação de temporada e plataformas x proibição em condomínio

Advogada analisa caso concreto de condomínio de Porto Alegre que obteve decisão favorável do STJ para proibir locação por caracterizar hospedagem

Por Morgana Schoenau da Silva

30/04/21 04:09 - Atualizado há 3 anos


Por Morgana Schoenau da Silva **

condomínio pode vedar a locação do tipo "hospedagem" pela plataforma Airbnb, divergindo do voto do relator.

hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de imóveis ou quartos por curto tempo e em contrato não regulado por legislação, já que, dessa forma, não são considerados residenciais.

Inúmeros veículos midiáticos, com manchetes sensacionalistas, alegam que o STJ decidiu favorável ao condomínio proibir locação pelo aplicativo Airbnb, pois retira o caráter residencial.

Análise do caso concreto

Na realidade, o condomínio localizado em Porto Alegre, ajuizou uma obrigação de fazer contra proprietários de três unidades que acomodavam em torno de quatro pessoas diferentes, sem vínculo entre si, mediante o pagamento de aluguel por cada uma.

alteração da destinação residencial do edifício para comercial.

A proprietária de um dos apartamentos, inclusive, alterou o layout do imóvel, aumentando o número de quartos de três para cinco, pois dividiu a sala em mais dois quartos. 

Desta forma, moravam cinco pessoas no mesmo imóvel, uma em cada quarto, sem nenhum vínculo entre si. Além da locação, a proprietária agregou serviços de internet e lavagem de roupas.

O ilustríssimo magistrado do caso, ao sentenciar, entendeu que o negócio jurídico proposto pela proprietária a terceiros não se amolda à locação residencial (art. 47 da Lei de Locações) ou mesmo à locação por temporada (art. 48 e seguintes).

assemelhando-se ao contrato de hospedagem.

hospedagem pressupõe serviços, conforme se caracterizou no caso concreto e, portanto, desvirtuou a finalidade do condomínio, que é exclusivamente residencial

hospedagem reflete na seara administrativa e tributária caracterização comercial. 

Destaca-se que nos argumentos apresentados na sentença, o Magistrado registrou inexistir óbice à locação dos imóveis dado o exercício do direito de propriedade. O que não pode ser admitido, em face da expressa disposição da Convenção Condominial, é a alteração do contrato típico de locação disciplinada pela Lei 8.245/91, dentro dos parâmetros ali estabelecidos.

sentença foi procedente ao condomínio, para abstenção dos proprietários em exercer a atividade de alojamento e/ou hospedagem nas unidades, mediante locação de quartos e prestação de serviços, sem prejuízo da locação das mesmas unidades para fins residenciais e nos moldes da legislação pertinente.

E o que o Airbnb tem a ver com tudo isso?  

A proprietária utilizava a plataforma para anunciar a locação dos espaços compartilhados em sua propriedade, ou seja, era o Airbnb que fazia o vínculo entre anfitrião e "hóspede".

STJ - Convenção de Condomínio X Direito de Propriedade

Durante o julgamento, os ministros ressaltaram que o caso não proíbe a oferta e uso de serviços por plataformas como o Airbnb, ou mesmo que, por meio dele, sejam fechados aluguéis por temporada. O incômodo do condomínio foi exatamente o oposto disso: a alta rotatividade de hóspedes.

“Realmente, não se trata de uma destinação meramente residencial. Foge, portanto, ao permitido na convenção de condomínio, a qual estão vinculados todos os condôminos”, disse a ministra Isabel Gallotti.

não é possível a proibição absoluta da cessão do imóvel sob o argumento do desvirtuamento da finalidade residencial do prédio. A destinação econômica do apartamento não se confunde com atividade comercial.

A locação por temporada é prevista em lei, seja por aplicativo ou não, e a proibição integral pode gerar uma demanda judicial ao condomínio.

Condomínio pode proibir que o proprietário pratique locação por temporada?

Importante destacar o que a lei entende por locação por temporada. E para isto é preciso observar o art. 48 da Lei 8.245/91:   Art. 48. Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.

A locação por temporada é aquela de até 90 (noventa) dias e sem prazo mínimo. Portanto, em que pese o condomínio possuir áreas comuns, que devem se sujeitar a regras da coletividade de moradores, os apartamentos ou casas, áreas estas consideradas privativas, sujeitam-se ao direito de propriedade de cada proprietário, que pode locar a unidade na sua totalidade.

Em geral, o argumento referente à proibição da locação por temporada é a questão da segurança. Só que a proibição simples da locação por temporada nos condomínios, de forma geral, é vedada.

Por isso, é extremamente necessária a regulamentação desta prática nas convenções e regimentos internos dos condomínios, com regras claras e rígidas sobre a questão. Assim, o proprietário não teria seu direito de propriedade maculado e o condomínio poderia evitar futuros conflitos com os condôminos

Importante observar, ainda, que a partir do momento que o condomínio estabelece tais regras, é preciso que o proprietário, ao anunciar seu imóvel em imobiliárias, sites e aplicativos de locação, deixe bem claro as regras aplicáveis no condomínio.

Com a recente decisão do STJ, passamos a ter um precedente para casos análogos (não é uma decisão em recurso repetitivo para todos os casos que tratam do mesmo assunto - locação - temporada - Airbnb, nem tem validade "erga omnes").

Ou seja, vale como precedente para casos semelhantes, onde a unidade é utilizada de forma desvirtuada da destinação residencial, ou seja, alojamento/hospedagem com locação de cômodos/quartos a vários inquilinos e com oferta de serviços, sendo evidente não se tratar do contrato típico de locação de temporada previsto em lei federal.

Lembrando que a generalização e a divulgação de manchetes polêmicas - sem a devida e minuciosa explanação do caso, nunca é saudáve.

O direito não é uma ciência exata. E, inclusive, cabe citar que na própria Lei de Locação, existem diversas formas e modalidades de se operar o instituto, tem sido operacionalizada por empresas e plataformas digitais e, nem por isso, se enquadram em atividade comercial ou desvirtuam a finalidade prevista numa convenção condominial.

Posso proibir no meu condomínio a locação por temporada e locações por plataformas digitais? 

Não, não pode! Sob pena de ferir o direito de propriedade do condômino, até porque o síndico não é xerife! Mas o condomínio pode e deve regulamentar as locações nas suas diversas modalidades previstas em lei, alterando suas normas internas – especialmente a Convenção do Condomínio, por se tratar de matéria de propriedade.

É possível regulamentar os tipos de locações que serão permitidas e desenhar o que não será permitido. Assim como criar regras operacionais (Regulamento Interno) que estabeleçam maior segurança jurídica para todos os envolvidos na relação condominial.

*Até a presente data o acórdão do julgamento ainda não havia sido publicado. 

(*) Morgana Schoenau Da Silva - Advogada atuante em Direito Condominial. Palestrante. Influenciadora Digital - Participante do projeto @Condomínio7mulheres – e representante do escritório Stankievicz, Ponciano & Rachkorsky Advogados Associados, localizado em Balneário Camboriú - com atuação extrajudicial no Brasil (http://sprjuridica.com.br).