21/02/13 02:57 - Atualizado há 11 anos
Por Alexandre Marques (*)
Tempos atrás comentei, nesse mesmo espaço, sobre as preconizadas mudanças que haverão nas ações de cobrança de débitos condominiais em razão do novo código de processo civil brasileiro. Considerando que este não é um sítio eletrônico jurídico, trato dos temas processuais sempre da forma mais didática e clara possível.
Para quem não sabe, o código de processo civil é um compêndio de artigos da lei federal nº 5.869/1973 que regula como as ações judiciais que tramitam na esfera cível, principalmente, devem tramitar.
É como se fosse um manual de instruções de como os operadores do direito e todos os demais envolvidos no processo devem atuar, conduzir, instrumentar, portar-se, manifestar-se no desenrolar do processo para um resultado ágil, justo e eficaz. Obviamente que esses critérios são subjetivos e, ultimamente dado o grande volume de ações judiciais, o legislador vem buscando alternativas para tornar o tramitar das ações mais célere e eficaz.
Nosso atual código de processo civil que é de 1973, já passou por inúmeras reformas, mudanças, alterações, tornando-se uma verdadeira colcha de retalhos do que os operadores do direito, junto com os legisladores imaginam ser uma atualização desse manual, sendo certo ainda que buscam, nessas modificações, atender aos anseios e expectativas do tempo atual.
Pois bem, atentos a isso, nossos políticos, legisladores, operadores do direito, juristas, e sociedade civil organizada, reuniram-se e elaboraram um novo código, e é desde que falaremos.
Na sistemática atual as ações de cobrança de débitos condominiais tramitam sob as regras do rito sumário, segundo dita a letra “b”, inciso II do artigo 275, sendo proposta na forma de processo de conhecimento, atendendo aos requisitos necessários a esse tipo de ação (artigo 282 do CPC). Deve o condomínio juntar à peça inicial (aquela pela qual o juiz toma conhecimento “inicial” do pleito do autor da ação), a procuração, ata que elegeu o síndico (ou quem o representa), certidão da matrícula atualizado do imóvel de acordo com o cartório de registro de imóveis local), cópia da convenção do condomínio (se tiver), cópia das atas assembleares que aprovaram as despesas do período, memória descritiva e detalhada do débito cobrado. Se possível, segunda via dos boletos condominiais, cópia da inicial e contra-fé (aquela que o oficial de justiça ou carteiro, entregará ao devedor para que ele tome conhecimento da ação, após determinação do juiz, nesse sentido), comprovante do recolhimento de custas processuais e demais documentos que o autor da ação julgar necessários.
Como se vê, não é pouca coisa, geralmente isso cria autos do processo, com um volume de 40 ou 50 folhas, para “conhecimento” do juiz que determinará o que é de direito.
Não é necessário ser advogado para imaginar o quanto esta tarefa demanda tempo do julgador e trabalho dos funcionários de cartório.
Feito isso, e, estando tudo em ordem em termos das condições da ação, possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual (artigo 267, VI do CPC) o juiz determinará a citação da parte contrária, ou seja, ato pelo qual o oficial de justiça ou correios, dará conhecimento ao réu da ação que ele está sendo processado e, porquê, afinal, é dado a parte saber o porque da demanda contra si.
A partir daí é que se abre ao requerido (como se chama a pessoa processada nesse tipo de ação), a possibilidade de defesa, na forma de contestação (defesa técnica) - momento no qual ele terá que se manifestar em termos de sua defesa com todos os argumentos que tiver, caso os tenha (artigo 300 e seguintes do CPC).
Quais seriam? Se deixou de pagar o condomínio por alguma razão específica que assim justificasse, se a dívida não é aquela realmente, se a dívida já está paga, se há excessos na cobrança, se ele não é a pessoa legitimada para responder pelo débito e aí terá que trazê-la à ação, mas, o mais importante, deverá fazer prova de suas afirmações, não bastando apenas informá-las ao juiz.
Existem outras providências que podem ser adotadas pelo requerido (devedor), como por exemplo, a reconvenção (art. 315 do CPC), etc., mas, não vamos esmiuçá-las aqui.
Então, após alguns outros trâmites, o juiz irá exercer a sua jurisdição, prolatando a sentença, que pode ser favorável ou não ao autor (condomínio) ou ainda parcialmente favorável . Sendo certo que o magistrado irá, porque assim determina a lei, especificar as razões que o levaram a julgar daquela forma, contendo a sentença, relatórios, fundamentos e dispositivo (art. 458 do CPC). O vencido ou mesmo o parcialmente atendido (autor), poderão, apelar da decisão ou manejar outros recursos e procedimentos judiciais buscando reverter ou complementar o pedido formulado.
Ao final, estando a decisão finalizada, transitada em julgado, não cabendo mais recursos, abre-se ao autor a segunda fase do processo que é uno, dentro do atual modelo sincrético processual (uma das mudanças mais significativas do atual código), de pleitear o cumprimento da sentença pelo vencido, sendo certo que, aquele, se não atender espontaneamente ao determinado, arcará com uma penalidade na forma de multa sobre o valor da dívida. Não pagando, inicia-se a fase de expropriação de seu patrimônio pelo Estado, seguindo uma ordem de bens a serem penhorados. Chegando ao final, se não houver mais nenhuma outra possibilidade, a penhora do imóvel, enfim, do próprio apartamento o qual o débito condominial está indissolúvel e inarredavelmente atrelado, por tratar-se de uma chamada obrigação “propter rem”.
O imóvel será então avaliado e levado a hasta pública (bens móveis são leiloados e imóveis são levados a hasta). Com o produto da hasta, o condomínio finalmente verá atendido seu pedido: a dívida satisfeita, como regra geral, pois, por vezes, o valor do próprio imóvel já não é suficiente para a satisfação do débito.
Muito bem, tudo isso é um resumo bem apertado de como funciona hoje, pela atual sistemática, uma ação de cobrança de débitos condominiais. Como veem é complexo e mais ainda, demorado e caro para o condomínio, pois, o imóvel até chegar a fase da hasta pública, passará por uma avaliação por um perito judicial para ter seu valor determinado e uma série de outras despesas como publicação do edital de hasta pública em jornal.
Com a vigência do novo código de processo civil, resgatou o legislador a possibilidade que existia no código de 1939, portanto anterior ao atual que é de 1973, da cobrança ser feita pela via executiva, ou seja, pela ação de execução (artigo 743, IX do Novo Código de Processo Civil), processo muito mais célere e eficaz que o chamado processo de conhecimento. Esse prescinde que o julgador tome conhecimento de forma detalhada de uma série de informações que passam a ser desnecessárias face a instrumentalização da ação. Ou seja, os documentos juntados pelo autor, agora chamado de exequente, que comprovaram a relação jurídica que o executado (antigo requerido) tem com ele e, a comprovação da existência da dívida através de um documento específico, levando ao magistrado a verificar apenas se o título que está sendo cobrando é hábil, atendendo aos requisitos legais e se há ainda legitimidade das partes envolvidas.
O novel diploma jurídico exigirá pronto e tão somente para a execução em geral de acordo com o artigo 742: “A execução para cobrança de crédito se fundará sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível”.
Comprovada estas condições a execução é aceita. É como se saltasse direito da parte inicial da ação de conhecimento a qual mencionamos acima, para aquela segunda fase de cumprimento de sentença, a hora em que o devedor deve, simplesmente...pagar!
Aliás, a sentença judicial é um título executivo mesmo no modelo atual.
De modo que o condomínio poderá propor esta ação pelo simples inadimplemento do condômino em cumprir com sua obrigação, certa, líquida e exigível consubstanciada em um título executivo (art. 744 no novo CPC), que é o boleto condominial, revestido do formalismo jurídico necessário.
Sim, pois a certeza está na obrigação que cabe a cada comunheiro em pagar o débito condominial, conforme preconizado pelo código civil (artigo 1.336, I do C.C.), liquidez e exigibilidade, estarão presentes na forma da aprovação assemblear da previsão orçamentária do período, com valores e despesas descriminadas detalhadamente, com a correlata atribuição a fração ideal de sua unidade ao valor cobrado como igualmente determina o direito material civil (idem artigo e incisos acima mencionados), e registro da ata em cartório, dando a devida publicidade e solenidade ao ato. Logo, não cabendo questionamento por parte do condômino quanto à legalidade e legitimidade do condomínio para a cobrança da obrigação condominial inadimplida.
O condomínio, a exemplo do que acontece com o protesto da cota condominial, quando operado, deve fazer constar da ata assemblear que aprova a previsão orçamentária do período, qual o valor que cada unidade pagará de acordo com sua fração ideal, se for este o critério de rateio das despesas condominial ou o valor “per capita”, se o caso, dando desta forma a taxa condominial a literalidade, certeza e exigibilidade previstas em lei.
Na instrução da peça inicial da execução, que será extrajudicial (letra “a”, I do Art. 755) o exequente deverá juntar nos termos do artigo 755, I e letras do novo CPC:
Lembrando que, uma vez distribuída a ação, pode o credor averbar em registro público, para conhecimento de terceiros, no ato do ajuizamento da execução e dos atos de constrição realizados.
No caso, trata-se a execução por quantia certa (artigo 781 e seguintes do novo CPC), sendo certo que, nesses casos o devedor poderá sofrer a expropriação de seus bens por adjudicação ou alienação do imóvel.
Importante ressaltar que o executado poderá a todo tempo antes da efetiva alienação ou adjudicação remir a execução, pagando ou consignando a importância atualizada da dívida, além de juros, custas e honorários advocatícios.
Na ordem de bens preferenciais para a penhora o imóvel está em quarto lugar (Inciso IV do artigo 792 do novo CPC), mas, nada impede que o condomínio assim requerida, “ab initio”, constatada a provável insolvência do devedor.
O devedor, uma vez citado, terá três dias para remir a dívida (artigo 786 do novo CPC), contados da juntada nos autos do mandado de citação válida, sob pena de, não o fazendo, prosseguir a execução com todo seu gravame, leia-se penhora de bens, expropriação do próprio imóvel. Pois de acordo com o parágrafo primeiro do mesmo artigo citado do próprio mandado de citação constará a ordem de penhora. Isso quer dizer que o oficial de justiça irá reter uma via do mandado com ele e verificar em três dias se houve o cumprimento da obrigação, caso contrário irá cumprir o mandamus da lei, penhorando e, se apto, avaliando a penhora.
O executado, a exemplo do que ocorre hoje, poderá obviamente defender-se em juízo ofertando embargos à execução (artigo 870 do NCPC). Na defesa, o executado poderá alegar as razões elencadas no art. 873 NCPC que, não vamos enumera-las por não ser este o foco dessa matéria, mas, em regra, são as mesmas praticamente do código de processo civil atual.
O importante, entretanto, é o leitor, síndico de condomínio, conselheiro, administrador, advogado e condômino entender que a partir da vigência do novo diploma legal processual civil, a cobrança do débito condominial ficará muito mais célere e gravosa ao devedor. Muito mais do que hoje, levando a uma satisfação imediata quase da dívida, sob pena de penhora e hasta pública do imóvel, bem este, que é o teto de uma família. O que o devedor tem a perder é mais do que um teto sobre a cabeça, tem a perder um lar...onde eventualmente viu os filhos crescerem, construiu a história de uma vida, viveu sua identidade. Então, exortamos a todos os devedores de condomínio, procurem a direção de seus condomínios ou mesmo o advogado, ou ainda o administrador e, se ninguém ouvir o apelo necessário para uma facilitação no pagamento do débito, propugnem por uma assembleia, mas, resguardem-se ao máximo para que a dívida não seja objeto de uma cobrança como esta, que poderá ter consequências avassaladoras.
(*) Alexandre Marques
Advogado militante Consultor em Direito Condominal; Colunista SíndicoNet; Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil; Especialista em Processo Civil pela ESA e Direito Imobiliário pelo UniFMU; Relator do Tribunal de Ética da OAB/SP , Diretor de Ensino da Assosíndicos (Associação de Síndicos de Condomínio Comerciais e Residenciais do Estado de São Paulo); Conferencista da OAB/SP, CRECI e SECOVI/RO; Sindicato dos Corretores de Imóveis de São Paulo, Conferencista convidado pela Faculdade Dois de Julho - Salvador/ BA, no curso de Pós-Graduação, Co-Autor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação”, Editora Saraiva, Articulista de vários meios de mídia escrita e falada.