18/02/19 03:35 - Atualizado há 5 anos
Por Inaldo Dantas*
Em recente matéria publicada aqui no Portal Síndiconet, fiz uma comparação entre a tragédia de Brumadinho e os condomínios. Pois bem, infelizmente, mais uma vez me inspiro em outra tragédia como fonte para essa nova abordagem.
Pelo que se apurou até o momento, tudo indica que o incêndio no alojamento do “Ninho do Urubu” foi provocado pela instalação de algum aparelho de ar-condicionado. Mas o que isso tem a ver com os condomínios? Explico.
Muitas são as demandas judiciais que envolvem colocação de aparelhos de ar-condicionado nos prédios. Mas, infelizmente, em quase todas essas demandas, o “foco” da discussão diz respeito à “alteração de fachada”.
Esses equipamentos, de fato, trazem desequilíbrio à harmonia arquitetônica da edificação. Porém, outro ponto deve servir de preocupação para os síndicos e advogados que patrocinam as causas: a questão da segurança.
Tais questões judiciais só ocorrem pelo fato de que os aparelhos são colocados em locais não previstos. Até aí, aparentemente, nenhum problema do ponto de vista da segurança, correto? Digo que não, meu caro leitor.
Acompanhem meu raciocínio: se o aparelho está sendo instalado em local não previsto, é óbvio que ele também não foi previsto. As instalações elétricas de uma edificação são resultado de um projeto que exige um dimensionamento de carga (disjuntores, fios, etc.). Normalmente, tais projetos preveem uma quantidade definida de aparelhos de ar-condicionado que, diga-se de passagem, é o maior consumidor de energia dentro de uma residência.
Pois bem, se para cada apartamento já existe uma previsão de quantos aparelhos a instalação suporta e onde deverão ser instalados, não tem porque novos espaços na fachada serem abertos para contemplar outros aparelhos (aqueles não previstos).
Se isso está ocorrendo é porque o morador está aumentando a quantidade de aparelhos em seu apartamento e, consequentemente, aumentando também, a carga elétrica. E isso ocorre, e quando ocorre, pode provocar um incêndio, como já aconteceu em vários edifícios Brasil adentro, a exemplo do trágico episódio do Edifício Joelma, em São Paulo.
Costumo dizer que a lei brasileira atende satisfatoriamente todas as relações condominiais. Até hoje, em todas as demandas que tive participação, sempre encontrei o embasamento, e nesta questão, também. O Código Civil é claro quando trata de obras que comprometem a segurança da edificação:
Art. 1.336. São deveres do condômino:
II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação.
Apesar de textualmente a lei não proibir a sobrecarga de consumo de energia, deixa claro o dever do condômino de não realizar qualquer obra que comprometa a segurança da edificação.
Vale dizer que a instalação de aparelhos de ar-condicionado não previstos, é sim, uma obra de engenharia, pois envolve alvenaria e instalação elétrica. E risco de incêndio, é sim, ameaça à segurança da edificação.
Dois passos são extremamente importantes: o primeiro, a conscientização; e o segundo, fiscalização.
Quanto à conscientização, é dever do síndico promover a segurança não só da edificação, como daqueles que nela vivem ou circulam. Uma boa campanha visando a perfeita manutenção dos equipamentos, das instalações elétricas e, principalmente, o respeito quanto à carga elétrica projetada para consumo é fundamental.
Já a fiscalização, essa deve ser efetiva. Ao primeiro indício de que se está havendo obras que signifiquem ou sinalizem o consumo de energia além do projetado, deve-se intervir para que isso não ocorra. Notificar o condômino é o primeiro passo, não sendo suficiente, a demanda judicial, não apenas sob o argumento de “alteração de fachada” mas, principalmente pelo risco iminente, deve ser tratado preliminarmente, para que force o poder de justiça a conceder medida cautelar com vistas a impedir imediatamente qualquer risco de incêndio.
Assim como aconteceu no “Ninho do Urubu”, onde a omissão parece ter sido também uma das causas, restando responsabilidade criminal a quem de direito (muito provavelmente ao presidente do clube), ao síndico é quase que certa a imputação pelo que venha a ocorrer no condomínio, caso fique comprovado que ele, tendo tomado conhecimento do problema, nada fez para que isso não viesse a provocar a tragédia por uma possível “gambiarra” ou um “aumento de carga”.
A responsabilidade criminal do síndico acontece quando este não cumpre suas atribuições, levando-o não apenas a uma omissão, mas a uma prática que pode ser entendida como criminosa ou contravenção.
O Código Civil estabelece que:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Que os exemplos sirvam de lição para que novas vítimas não sejam atingidas.
(*) Inaldo Dantas é advogado, síndico profissional, administrador de condomínios, presidente do Secovi-PB, editor da Revista Condomínio, colunista do Jornal Sindiconews, comentarista da Band-TV Clube, palestrante e autor do Livro “O Condomínio ao Alcance de Todos”.