Fui eleito síndico

Onboarding do síndico: o que checar ao assumir o condomínio?

Processo amplamente difundido no mundo corporativo, um onboarding bem estruturado facilita o planejamento da gestão condominial. Saiba o que não pode faltar no seu!

Por Beatriz Quintas

22/10/24 05:40 - Atualizado há 26 dias


Ao assumir a gestão de um condomínio, raramente o síndico sabe com antecedência tudo o que o espera, mas precisa agir rápido para evitar problemas e passar intacto pela chamada "lua de mel" com o conselho, que nos primeiros meses vai avaliar com muito rigor o seu desempenho e se "deu liga" com o condomínio.

Nesse período de ambientação, seja numa passagem de bastão entre gestores ou na implantação de empreendimentos recém-construídos, há uma série de itens a serem observados para que o "matrimônio" seja duradouro e a renovação de votos, garantida. 

O papel do onboarding é justamente garantir que nada fique de fora do checklist, levando ao esquecimento de etapas cruciais para o bom funcionamento do condomínio, e cada síndico tem uma maneira própria de estruturar esse processo usando as ferramentas com as quais possui maior familiaridade.

Para ajudar seus leitores a enfrentarem essa etapa com tranquilidade, o SíndicoNet apresenta nesta matéria a origem do conceito de onboarding, orientações de especialistas e um checklist completo para iniciar a gestão do condomínio com o pé direito. Boa leitura!

Conceito de onboarding: uma prática absorvida do universo empresarial

Tradicionalmente aplicado no ambiente corporativo, o onboarding tem como missão apresentar a um novo funcionário tudo que ele precisa saber para atingir as expectativas do empregador, tanto no âmbito comportamental quanto nas entregas do dia a dia.

"Indo bem na raiz, basicamente é um processo de clarificação que ajuda as pessoas a estarem minimamente familiarizadas com a cultura e o que irão fazer ao embarcar numa empresa", resume o diretor da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Marcelo Pirani. 

Segundo ele, a chegada de um síndico ao condomínio pode ser comparada à contratação de um alto executivo. "É um processo mais complicado, que exige reuniões de aclimatação, demonstrações de dados e exaustivas jornadas investigando o que precisa ser feito."

Ter alguma bagagem é importante para lidar com as surpresas que surgirem no caminho, no entanto o onboarding é o que dá a ele a capacidade de antever situações de risco e traçar estratégias para lidar com elas da melhor forma.

"Isso traz muitas vantagens não só para a empresa, mas também para quem é contratado. Você diminui a burocracia, otimiza o tempo de adaptação, estrutura processos, tira dúvidas, facilita sua permanência e, acima de tudo, valoriza a humanização que a gente tanto tem buscado", detalha Pirani.

Roteirizar todos esses pontos e registrar sua evolução é o que vai garantir que a jornada de imersão seja concluída com sucesso.

Benefícios do onboarding para síndicos orgânicos e profissionais

Aplicado ao contexto da gestão condominial, o onboarding serve como um guia, trazendo mais organização para a rotina do síndico, em especial quando ele atua profissionalmente e precisa conciliar demandas de múltiplos clientes. Além disso, trata-se de um grande diferencial que valoriza seu trabalho.

"Com indicadores claros fica fácil entender o que fazer em cada momento e, quando o conselho visualiza que você tem esse board de gestão para entrar no condomínio, ele fica muito mais confiante e seguro que a sua iniciação vai ser positiva", pontua Rodrigo Lobo, síndico profissional e CEO da Advanced.

Ele estima que pelo menos 80% dos gestores não têm um processo estruturado devido à inexperiência ou ao excesso de confiança. Essa falta de preparo prévio pode levar a uma iniciação "atropelada", na qual checagens importantes são esquecidas ou postergadas.

Passado algum tempo, começam a surgir problemas como notificações do Corpo de Bombeiros sobre o AVCB que não está em dia ou o fim do prazo para defesa do condomínio num processo que estava correndo na Justiça.

"Politicamente, até existe essa 'lua de mel' em que as pessoas têm uma boa vontade, mas, juridicamente, não. A partir do momento que você está eleito, se houver alguma questão pendente, a responsabilidade jurídica é sua", reforça Maicon Guedes, síndico profissional e CEO da Informma Síndicos.

"Eu costumo falar para o meu time que a gente tem que partir do pressuposto de que está tudo errado, por isso fazemos um diagnóstico completo do condomínio para identificar se não há nenhum 'esqueleto' no armário", complementa.

Lobo ainda menciona que o onboarding pode ajudar o síndico a encontrar aliados entre os condôminos, atenuando a oposição nociva:

"Em implantações, por exemplo, é normal que o elevador quebre ou faça mais barulho que o normal. Quando você antecipa situações como esta e as comunica aos moradores, caso surja alguma reclamação nos grupos de WhatsApp, alguém acaba lembrando a pessoa sobre o aviso preventivo. Às vezes o síndico nem precisa se defender. Agora, se ele não deixa isso parametrizado no processo de gestão ou não entende isso como prioritário, vai tomar 'bordoadas' por conta de uma besteira."

 

Onboarding em condomínios: saiba por onde começar!

Cada vez mais, os novos empreendimentos têm como principal chamariz a concentração de serviços e conveniências para que o morador tenha tudo o que precisa por perto, do coworking para os dias de home office ao mercadinho para repor produtos básicos de higiene e alimentação.

Dessa forma, os itens no checklist de obrigações do síndico se multiplicaram e manter o condomínio operacional pode ser mais desafiador que o esperado, principalmente para aqueles que estão iniciando o primeiro mandato e não fazem ideia de por onde começar. 

Como mencionado na introdução desta matéria, o onboarding é um processo adaptável às necessidades do condomínio, mas, sobretudo, ao que o síndico considera que vá trazer mais praticidade para seu trabalho.

"Ele é contínuo, você vai seguindo as melhores práticas do mercado e, com a experiência, vai identificando coisas que ninguém ensina. Só vivendo que se aprende", destaca Lobo.

A seguir, reunimos conceitos básicos e boas práticas que podem te ajudar a estruturar o seu onboarding, com base na experiência dos entrevistados:

Funcionamento do onboarding

Antes de mais nada, é preciso ter em mente que a gestão de condomínios em implantação e condomínios antigos funcionam de forma diferente, logo a lista de documentos e ativos a serem verificados varia conforme o tempo de construção.

"O condomínio novo tem menos surpresas porque você parte do pressuposto de que a construtora está entregando tudo nos conformes, sem vícios. Há uma vistoria acompanhada de engenheiro e a partir dali, se você seguir o manual de uso e operações do empreendimento, terá uma vida tranquila", orienta Guedes.

Graças à nova Norma ABNT 17.170 de Garantias, as incorporadoras entregam esse manual cada vez mais recheado de informações e é preciso estar atento às manutenções preventivas para não perder nenhum direito em caso de vícios construtivos, que é apenas um dos desafios enfrentados nos condomínios já instalados.

Informações que devem ser transmitidas

De modo geral, os especialistas destacam como itens indispensáveis no checklist de onboarding do síndico:

Condomínio em Implantação Condomínio Antigo
  • CNPJ do condomínio
  • Atualização cadastral nas concessionárias de água e energia
  • Regularização perante os órgãos municipais
  • Elaboração da Convenção e Regimento Interno
  • Manuais de operação do condomínio
  • Notas fiscais
  • Chamados abertos
  • Enxoval de áreas comuns
  • Contratações de funcionários e fornecedores
  • Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB)
  • Contratos vigentes de fornecedores e prestadores de serviços
  • Cumprimento de Direitos Trabalhistas dos funcionários
  • Balanço financeiro do condomínio (saldos e dívidas)
  • Processos judiciais correndo a favor ou contra o condomínio
  • Multas a moradores com pagamento ou aplicação pendentes
  • Reunião com conselho e funcionários

Independente do tipo de condomínio que está sendo assumido, cabe também providenciar:

Para que o síndico eleito tenha em mãos essa lista de tarefas sempre que for necessária, o SíndicoNet disponibiliza um checklist gratuito para impressão. Confira aqui!

Quando implementar o onboarding?

Segundo o diretor da ABRH, num dos modelos de onboarding utilizados pelas empresas, o funcionário não executa as atividades para as quais foi contratado de imediato. 

Ao longo da primeira quinzena ou do primeiro mês de trabalho, sua única função é entender o papel que vai exercer ali dentro, adquirindo conhecimentos e estabelecendo as conexões necessárias para tanto. Esse seria o cenário dos sonhos para qualquer síndico recém-eleito, no entanto, a realidade é outra.

"São raros os condomínios que fazem eleição com antecedência, o que é totalmente lícito quando especificado no edital o mês de início do mandato. O mais correto seria seguir essa mesma periodicidade, realizando as assembleias 30 dias antes, o que facilitaria até a parte documental e financeira", recomenda Guedes.

"Você só consegue fazer movimentações bancárias depois que a ata está registrada. Até pegar a assinatura de todos, levamos de 10 a 15 dias, aí eu não consigo pagar ninguém e tenho que depender de favor da administradora", ele explica.

Aplicando o onboarding

A administradora desempenha um papel essencial na gestão condominial, especialmente durante a transição de síndicos e conselhos. Ela deve manter cópias de todos os contratos e documentos financeiros de forma digital, garantindo que essas informações sejam acessíveis e organizadas.

Isso facilita a continuidade da gestão, mesmo quando há troca completa de conselheiros, que geralmente funcionam como a "memória viva" do condomínio, ou fatalidades como a morte do síndico antecessor.

Além disso, disponibilizar esses documentos no site da administradora para os moradores reforça a transparência e o acesso às informações, sem segredos.

Exemplos de onboarding

Segundo Rodrigo Lobo, na Advanced, o aplicativo Notion é utilizado como a ferramenta central para onboarding do síndico. Esta plataforma de produtividade e anotações (com recursos de gestão de tarefas, projetos, listas de tarefas e marcadores) é colaborativa, permitindo que tanto os funcionários quanto os condomínios tenham acesso a um planejamento anual detalhado.

“Eu já deixo tudo parametrizado, desde os itens básicos que devem ser trabalhados até como as apresentações devem ser feitas para os moradores”, explica.

Ao entrar em um novo condomínio, Lobo explica que, obrigatoriamente, faz uma revisão dos contratos. "Isso faz parte dos nossos padrões", afirma.

Esse processo inclui um treinamento, que não é voltado apenas ao síndico, mas também aos colaboradores, garantindo que todos estejam alinhados com a cultura e metodologia da empresa, que aposta em tecnologias como checklists operacionais com QR codes.

Partindo para a comunicação com os moradores, são criados grupos de transmissão com fotos e logos padronizados, além de links para um kit de boas-vindas com as regras do condomínio. 

Por fim, pesquisas de satisfação são aplicadas com os moradores e com o conselho. Já os funcionários respondem à eNPS (employee Net Promoter Score), que busca entender seu ponto de vista sobre o ambiente de trabalho no condomínio.

5 dicas sobre onboarding para uma gestão condominial de sucesso

1. Não complique o que pode ser simples

Um onboarding muito complicado pode acabar se tornando um "Frankenstein", dificultando a implementação. Muitas vezes, o básico é o que funciona

2. Não se perca no 'disse me disse'

Ao iniciar em um condomínio já implantado, escute o que funcionários e moradores têm a dizer. É importante saber se os colaboradores conhecem seu escopo de trabalho e sabem executá-lo corretamente, por exemplo. Por outro lado, "você vai receber muitas informações, como 'esse grupo não presta', 'aquele é bom', mas é importante liderar para todos, não para uma minoria", previne Guedes. 

3. Lembre-se que a gestão é colaborativa

É importante marcar uma reunião com o conselho logo ao assumir. No caso de passagens de bastão, procure entender por que a gestão anterior foi trocada e o que não estava funcionando, pois vai ajudá-lo a agir com mais foco.

4. Deixe tudo registrado

Caso o seu antecessor ou a construtora não entreguem os documentos solicitados, informe o conselho e crie o hábito de fazer protocolos com todas as informações, retificando-as quando for prudente. Isso servirá como uma precaução, caso surjam problemas omitidos.

5. Use ferramentas para auxiliar no onboarding

Ferramentas digitais são essenciais, especialmente quando o síndico começa a gerenciar vários condomínios, tornando a gestão de tarefas humanamente inviável. Além do Notion, mencionado no exemplo de Rodrigo Lobo, o síndico também pode testar: Trello, Asana, KanbanFlow MeisterTask.

O interessante é compartilhar esse board com os funcionários, atribuindo as tarefas a cada um para um acompanhamento em tempo real da evolução da sua gestão nos primeiros meses.

Agora que você já sabe como estruturar o seu onboarding para assumir a gestão de um novo condomínio sem dores de cabeça, confira também nossa matéria completa sobre troca de síndico ou administradora de condomínio!

Fontes consultadas: Maicon Guedes (síndico profissional e CEO da Informma Síndicos); Marcelo Pirani (diretor da ABRH); Rodrigo Lobo (síndico profissional e CEO da Advanced).