Diego Basse

Os reflexos da MP 927/2020 na esfera trabalhista

Medida Provisória, aprovada recentemente por conta do coronavírus, também atinge condomínios

Por Thais Matuzaki

25/03/20 04:06 - Atualizado há 4 anos


Por Diego Basse*

Além de todas as considerações já realizadas pelo Poder Público, autoridades da saúde, bem como levando em consideração à evolução das prevenções determinadas e impostas pelo Estado, abaixo trazemos algumas questões de forma objetiva no Âmbito Trabalhista que ao nosso ver podem ser aplicadas como forma de prevenção e que trarão menor impacto tanto nesse momento quanto futuramente.

Na tentativa de mitigar os desafios econômicos que o país está enfrentando em decorrência do surto da COVID-19, doença causada pelo novo coronavirus, o governo adotou, no último dia 22/03, a Medida Provisória nº 927, trazendo uma série de medidas trabalhistas.

Entendemos que no cenário atual a Medida Provisória é a mais apropriada diante da emergência, haja vista sua entrada imediata em vigor, que engloba tópicos específicos e que permite, de alguma maneira, flexibilização temporária de normas trabalhistas. São eles:

As medidas têm objetivo de evitar demissões neste período de pandemia e facilitar as negociações trabalhistas de modo a reduzir os custos do contrato de trabalho para as empresas, dentro dos limites previstos na Constituição Federal.

Isto porque, importância é tanta, que de acordo com a LEI Nº 13.979, de 6 de Fevereiro de 2020, se for indicado ao empregado ficar de quarentena (até 14 dias) esse período é considerado como falta justificada (contrato de trabalho interrompido), devendo a empresa pagar os dias normalmente não havendo desconto.

Feitas as considerações iniciais analisaremos de forma objetiva cada proposta.

I – Regulamentação do teletrabalho

Em situações normais, quem tem trabalho regular e passa para o teletrabalho, deve assinar um aditivo contratual explicando a mudança e as alterações de contrato, além de seguir um período de 15 dias antes de mudar de um para o outro.

Com a Medida Provisória, essa burocracia foi reduzida, o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho à distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração (aditivo) no contrato individual de trabalho. A alteração deverá ser notificada ao empregado com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, por escrito ou por meio eletrônico. 

II – Antecipação de férias individuais

Durante o estado de calamidade pública, o empregador informará ao empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado.

As férias não poderão ser gozadas em períodos inferiores a cinco dias corridos; poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido. 

Adicionalmente, empregado e empregador poderão negociar a antecipação de períodos futuros de férias, mediante acordo individual escrito. Os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do coronavirus (COVID-19) serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas.

O empregador poderá ainda, suspender as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de quarenta e oito horas.

O pagamento da remuneração das férias concedidas em razão do estado de calamidade pública a que se refere a Medida Provisória, poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias, bem como o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina.

III – Concessão de férias coletivas

É um instrumento previsto na CLT, e as férias são chamadas assim quando são concedidas, de forma simultânea, a todos os funcionários da empresa, ou para determinados setores da companhia. 

Segundo a regra, as férias coletivas só podem ser concedidas em dois períodos anuais distintos e nenhum deles pode ser inferior a 10 dias corridos.

Com a Medida Provisória, o empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas e deverá notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, não aplicáveis o limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na CLT. 

Ficam dispensadas a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional.

IV – Do aproveitamento e da antecipação de feriados

Durante o estado decretado, os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.

O aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.

V – Do banco de horas

Ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado, estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.

A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias. A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo.

VI – Da suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho

Durante o estado de calamidade pública, fica suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais.

Os exames serão realizados no prazo de sessenta dias, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública. O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias.

Fica suspensa a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho. 

Os treinamentos serão realizados no prazo de noventa dias, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública. 

Durante o estado de calamidade pública, os treinamentos poderão ser realizados na modalidade de ensino à distância e caberá ao empregador observar os conteúdos práticos, de modo a garantir que as atividades sejam executadas com segurança.

As comissões internas de prevenção de acidentes poderão ser mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública e os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.

VII – Do direcionamento do trabalhador para qualificação (suspensão do contrato de trabalho) – (revogado)

O texto previa que durante o estado de calamidade pública, o contrato de trabalho poderia ser suspenso, pelo prazo de até quatro meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional não presencial oferecido pelo empregador, diretamente ou por meio de entidades responsáveis pela qualificação, com duração equivalente à suspensão contratual.

O Presidente Jair Bolsonaro, através de suas redes sociais, determinou a REVOGAÇÃO do artigo 18º da Medida Provisória 927/2020, que tratava da suspensão sem pagamento de salários para qualificação profissional do empregado, portanto, esta medida não poderá ser adotada nos contratos de trabalho.

VIII – do diferimento do recolhimento do fundo de garantia do tempo de serviço

Fica suspensa a exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente. 

O recolhimento das competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência da atualização, da multa e dos encargos.

O pagamento das obrigações referentes às competências mencionadas será quitado em até seis parcelas mensais, com vencimento no sétimo dia de cada mês, a partir de julho de 2020. Para usufruir, o empregador fica obrigado a declarar as informações, até 20 de junho de 2020.

IX – Demais considerações e recomendações

Entendemos que diante do quadro atual que está em crescimento e com medidas sendo implantadas de acordo com as demandas, levando em consideração os Princípios do Direito do Trabalho que visam a proteção do empregado (Princípio da Proteção; Princípio “in dubio pro operário”; – Princípio Norma Mais Favorável; Princípio da Condição mais benéfica ao empregado) e também um dos basilares que é o Princípio da Alteridade, algumas condutas, imediatamente, podem ser adotadas pelos empregadores, no sentido de prevenção do empregado.

1 – A antecipação das férias individuais pode ser negociada com aqueles empregados que já completaram o período aquisitivo, como forma de adiantamento, mesmo sem que a empresa siga o prazo determinado prévio de 30 dias e sem sanções ao empregados ante a Medida Provisória 927/2020 (art. 6º);

2 – Antecipação de férias pelo período proporcional ao trabalho daqueles empregados que ainda não completaram o período aquisitivo, podendo inclusive ser objeto de negociação individual (termo) a forma de compensação ou de desconto futuro, desde que o empregado não seja prejudicado, cabendo também os trabalhos em dias de feriados não religiosos (art. 6º);

3 – Alteração de jornadas e escalas de trabalho, implementando inclusive rodízios entre os empregados, dando condições e contribuindo com a prevenção indicada, sem que, entretanto, prejudique o trabalhador, mesmo que não haja previsão da Medida Provisória, aplicando aqui o bom senso, podendo também ser instituído banco de horas a favor do empregador mediante materialização por termo no que tange ao cumprimento por parte do empregado (art. 6º);

4 – De comum acordo com o empregado, implantar, temporariamente, o teletrabalho quando for possível essa modalidade (devendo estabelecer responsabilidades pelo fornecimento de material e demais obrigações), ou como mais adotado o trabalho home office (art. 4º);

5 – Concessão de férias coletivas, que agora independe da intervenção do sindicato da categoria, respeitando apenas o prazo de 48 horas, entretanto, algumas empresas, por retornarem recentemente de férias, estão descartando a possibilidade e negociando de forma individual (art. 11º);

Todas as condutas acima elencadas, foram trazidas após análise da Medida Provisória pelos advogados (especializados na área trabalhista) do escritório, e que são sugeridas aos nossos clientes, estudando caso a caso, podendo certamente ser enfrentada a questão na Justiça do Trabalho, entretanto, entendemos que são menos gravosas e demonstram que a empresa não foi negligente no cuidado com o ambiente de trabalho, visando tão somente manter a dignidade do empregado.

Certamente, caso mais adiante a justiça do trabalho analise casos análogos, será utilizado o bom senso e analisada a questão sob a ótica dos princípios que se aplicam ao caso que, como vimos, são todos favoráveis ao empregado e que com as alterações, negociações e possíveis descontos, desde que autorizados, demonstram a preocupação do empregador no mesmo sentido.

E se não bastassem as condutas acima indicadas que algumas serão acordadas por termo individual entre empregadores e empregados, as empresas poderão (enquanto perdurar o Estado de Calamidade Pública) transacionar sem entretanto, dispor contrariamente à Constituição federal, sendo que tal acordo prevalecerá sobre: Instrumentos Normativos; Legais e Negociais; conforme disposto no artigo 2º da Medida Provisória, sendo prudente a assessoria de um advogado.

Esperamos com este documento sanar as possíveis dúvidas habituais trabalhistas que poderão refletir frente a este cenário atual.

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(*) Diego Gomes Basse (OAB/SP 252.527) é palestrante e sócio titular da Banca de Advogados Gonçalves, Basse & Benetti Advogados (escritório associado à AABIC e ao SECOVI/SP.). É também consultor e advogado especialista em Direito Condominial; militante na área há mais de 15 anos. Basse é ainda presidente da Comissão de Direito Condominial da Subseção da OAB /SP da Comarca de Barueri; e consultor e colaborador do Instituto Cacau Show.