Mercado

Processo de desapropriação

Construtora vendeu área de favela como de condomínio para vender unidades

Por Mariana Ribeiro Desimone

domingo, 13 de abril de 2014


Moradores acusam construtora de vender favela incendiada como área de condomínio

Fogo que destruiu 70 barracos atingiu cinco andares de uma das torres; promessa era de que a comunidade seria retirada e um paisagismo ocuparia os fundos para uso dos condôminos
 
A produtora editorial Renata da Silva, de 25 anos, está com quase tudo pronto para casar. O último detalhe é receber as chaves do apartamento que ela financiou em 2012 e que deve receber em novembro deste ano. Mas o sonho prestes a se realizar se converteu em um pesadelo no final da tarde do dia 2 de abril, quando um incêndio reduziu a cinzas 70 barracos da Favela Aracati, na Penha, fincada em um terreno logo atrás do condomínio Way Penha, onde Renata vai morar.
 
O incêndio não só deixou feridos e dezenas de famílias desalojadas como atingiu cinco andares de um dos prédios do condomínio ainda em construção. Irritada, Renata cogita processar a Construtora Living, acusada pelos futuros condôminos de enganá-los: “A vendedora me garantiu que aquela comunidade seria removida em breve porque parte do terreno fazia parte do condomínio, como mostra a maquete.”
 
Em um e-mail trocado com a vendedora, e repassado ao iG, a promessa de remoção da favela foi refeita depois do primeiro incêndio que atingiu a comunidade, ainda em 2012. “Soube que teve um incêndio lá e algumas famílias já foram embora. Como uma parte vai ficar para dentro do condomínio, é certeza que serão todos retirados”, afirmou a vendedora, de nome Kalynka.
 
Na maquete em exposição durante a venda, o terreno da favela é um grande gramado verde com o símbolo do condomínio. “Eles disseram que o terreno havia sido cedido pela prefeitura, que na área ocupada seria feito um paisagismo, que o pedido de desapropriação já estava feito e que antes de iniciar as obras eles teriam que sair de lá”, se recorda a securitária Fernanda Miranda (31), que pagou R$ 327 mil por sua unidade. “Hoje eu moro com a minha tia. Comprei na Penha para ficar perto da minha família.”
 
O taxista Gabriel Rocha Luz (28) se lembra da promessa feita pelo “vendedor Cardoso” antes de decidir comprar o apartamento 23 na torre 3: “Ele informou que seria pago um valor de R$ 5 mil a cada morador da favela além de um auxilio aluguel para a retirada deles até o inicio das obras.”
 
Com o passar do tempo, no entanto, as torres subiram, a favela cresceu e os compradores começaram a pressionar a construtora. “Aí eles começaram a negar a informação que me deram”, diz Renata. “Acho muito fácil contar qualquer história para fazer a venda e depois lavar as mãos. Na maquete, no fundo à esquerda, note uma parte com muitas árvores. Quando a vendedora me mostrou, disse que essas árvores eram pertencentes à comunidade e fariam parte do nosso condomínio. Esse é o meu primeiro imóvel, não tive condições de avaliar as informações que me foram passadas de modo mais crítico. Fui induzida a erro.”
 
O bancário Keiller Nascimento Coppi, de 26 anos, confirma a acusação: “Procurei a construtora antes do incêndio e me informaram que havia um processo aberto pela prefeitura para remoção da favela.”

Fonte: http://surgiu.com.br/