segunda-feira, 1 de dezembro de 2014
Os fatores são falta de qualificação em segurança, guaritas em locais inapropriados, terceirização e a não colaboração de moradores As portarias dos edifícios residenciais passam uma falsa sensação de segurança. Na realidade, apesar de sistemas de videomonitoramento, as entradas dos prédios estão vulneráveis e os porteiros também. O motivo? A maioria dos porteiros não é treinada em segurança.
“Já fiz um curso voltado para segurança que é oferecido de graça pelo sindicato, mas não é obrigatório. A administração do prédio não obriga, é opcional. No curso, um policial explica noções de segurança, como se portar em caso de assalto, que é por as mãos na cabeça e não reagir. A gente não pode usar armas. O sindicato não autoriza. Só vigilante pode trabalhar armado. No curso, a gente também é orientado a observar situações suspeitas, pessoas estranhas que caso se aproximem do prédio, a gente é orientado a não ficar com nenhuma chave de apartamento; não abrir o portão da garagem para carro estranho, mas, na prática, é diferente”, disse o porteiro de um edifício localizado na Rua Nabuco de Araújo, no bairro do Embaré, em Santos, que pediu sigilo sobre sua identidade. Ele trabalha neste edifício há 11 anos.
O porteiro ressaltou que moradores também não colaboram com a segurança. “A orientação é que o morador abra o vidro do seu carro pra gente identificar quem é e abrir o portão, mas a maioria não abre. Se um morador chegar no carro com um ladrão, numa situação em que ele é refém e o vidro for filmado e estiver fechado, vai entrar no prédio ‘tranquilo’, infelizmente”, lamenta o profissional. “Aqui no prédio não aconteceu, mas sei de casos em outros prédios que os colegas contaram”, complementou. Questionado sobre se ele recebeu orientações para operar o sistema de videomonitoramento do edifício, o porteiro disse que não. “Eu sei operar, mas por iniciativa minha. Eu cheguei no técnico e perguntei como funcionavam as câmeras”, disse. Outro porteiro, que também terá sua identidade preservada nesta reportagem, trabalha há oito anos no mesmo edifício na praia de Pitangueiras, em Guarujá. Ele afirmou que nunca fez um curso de segurança, mas ressaltou que ninguém pode entrar no prédio sem ser identificado. Porém, assim como o colega de Santos, ele também disse que moradores não colaboram com a segurança.
“Os moradores, às vezes, chegam e não se identificam, ficam parados buzinando, com o vidro fumê do carro fechado”, disse ele.
No edifício onde o porteiro trabalha, muitos apartamentos são de veraneio. “A maioria dos moradores é de São Paulo e, às vezes, eles vêm com carros diferentes e não informam o edifício. Nós é que nos preocupamos em anotar as placas dos carros”, afirmou o funcionário. “Os entregadores de pizza não entram no prédio, o morador tem que descer para pegar. Já as correspondências nós somos autorizados a receber e depois entregamos para o morador, temos um livro de correspondências que nós marcamos para o morador retirar, assinar”. O único treinamento que recebeu foi contra incêndios, do Corpo de Bombeiros.
O especialista em segurança Ronei Silva Filho, empresário da área de segurança e automação predial, com mais de dez anos de experiência no setor, revela uma realidade preocupante. “Os condomínios buscam investir mais em equipamentos, mas não na capacitação dos funcionários”. De acordo com Silva Filho, as técnicas de atendimento em segurança em portaria são fundamentais. “O funcionário tem que ser treinado para observar, interpretar indícios de risco como, por exemplo, alguém que pode estar sempre observando o edifício, um carro parado em frente ao prédio, alguém que pergunte sobre moradores, sobre aluguel. Esses são os principais indícios”. Ele afirmou que tem casos de porteiros que trabalham há 20 anos em edifícios e mal sabem atender um interfone. O especialista explicou como é o modus operandi, ou seja, o modo de operação de uma quadrilha que pratica roubos a edifícios. “A quadrilha escolhe um condomínio. Observa a rotina dos condôminos, dos funcionários do prédio, quem passeia com cachorro, etc”. Mas, o especialista afirmou que administradoras de condomínios de Guarujá e Praia Grande são as que mais se preocupam com segurança e investem na qualificação dos empregados de edifícios. “No meu curso, de cada dez alunos, oito são de Guarujá e Praia Grande e apenas dois de Santos”, disse. “Guarujá e Praia Grande são mais preocupados com segurança. Já Santos é extremamente vulnerável”.
“A qualificação de pessoal reduz muito o trabalho das administradoras”, afirmou Silva Filho.
Segundo ele, “Santos não tem essa cultura de qualificar os funcionários de edifícios em segurança. Quando eles (porteiros) vêm fazer é por iniciativa própria, por interesse deles. São poucos os condomínios que buscam a qualificação dos funcionários em Santos”. Segurança depende de zelo conjunto, diz sindicalista O diretor-presidente do Sindicato dos Empregados em Edifícios, Condomínios e Afins nos Municípios de Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe (Secamp), José Francisco da Rocha, disse que os porteiros que trabalham em edifícios de cidade dormitório como a Praia Grande, por exemplo, estão mais vulneráveis do que em outras cidades. “Nossa categoria está vulnerável”, alertou. Francisco explica que um sistema de monitoramento não garante a segurança necessária aos profissionais de portaria e aos moradores do prédio. Segundo ele, uma série de fatores põe em risco a segurança de todos. “Em Praia Grande, 60% dos moradores dos prédios são de fora. O condomínio tem que ajudar os porteiros informando quem são os moradores”, disse ele. Os porteiros precisam identificar os moradores para permitir a entrada no prédio.
“A segurança deve ser discutida conjuntamente entre o condomínio, os funcionários e os moradores. Se um falhar, põe em risco todo mundo no prédio”, afirmou Francisco.
Outro agravante é em relação às guaritas. “A cabine onde os funcionários trabalham geralmente fica muito próxima à calçada. O empregado fica exposto”. Ele disse que o sindicato tem exigido de administradoras cabines mais seguras e que os entregadores não tenham acesso às áreas comuns dos prédios. Segundo ele, o sindicato faz a sua parte. Anualmente, entre 300 e 400 porteiros são qualificados nos cursos promovidos pela entidade de classe, que representa ao menos 4 mil profissionais nas cidades de Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe.
A terceirização de funcionários que trabalham em condomínios também favorece a falta de segurança devido à rotatividade do pessoal contratado. A afirmação é do presidente do Sindicato dos Empregados em Edifícios e Condomínios de Guarujá e Bertioga (Seeclag), Celso Silvério Ferreira. O sindicato representa em torno de sete mil trabalhadores. Ferreira disse que incentiva os condomínios a investirem em equipamentos de segurança. “Com referência aos monitoramentos sempre aconselhamos aos síndicos, condôminos e administradores que invistam nisso, como exemplo: câmeras, portões automáticos, guarita, fechamento de portão, entre outros recursos”. Mas, Ferreira ressaltou que a terceirização dos funcionários dos condomínios é a principal barreira na segurança de um edifício. “O maior problema que temos em condomínios é a terceirização, que alguns prédios insistem em contratar na tentativa de redução de despesas (o que na realidade não acontece). Os funcionários terceirizados têm maior rotatividade do que os contratados, e, no entanto, não conseguem tempo para conhecer os moradores e frequentadores”, explicou. O presidente do sindicato disse também que há moradores que implicam com os funcionários dos prédios. “Os veranistas que descem à praia, em feriados prolongados e temporadas, quando são abordados pelo trabalhador do condomínio para se identificar, a maioria discorda e alguns até ameaçam tomar providências em relação ao empregado, em especial o mais jovem. Então, o que precisamos é uma parceria urgente com os condomínios através da colaboração do sindicato patronal (econômico), tanto para a qualificação de mão obra, como nas instruções sobre segurança e atendimento, para melhorar o sistema”, revelou. Ferreira lembrou que assaltos, arrastões e invasões de prédios em Guarujá aumentam durante as temporadas de férias, quando existe maior circulação de turistas e veranistas na cidade.
“Os trabalhadores de condomínio trabalham assustados, em especial àqueles que trabalham à noite, pois não portam armas e tampouco tem poder de polícia, portanto estão sempre vulneráveis, por mais cuidado que tenham mesmo porque existem prédios que não investem em segurança. Às vezes ficam expostos, o que facilita a entrada de meliantes”, revelou o representante da categoria.
Ferreira disse que o curso de qualificação em segurança está entre os que são oferecidos pelo Seeclag. “No entanto, vamos buscar a parceria dos condomínios (sindicato patronal) para que juntos possamos fazer cada vez melhor”. O sindicalista disse que hoje não existem empregados qualificados suficientes para atender a todos os condomínios. “Não, porque a maioria dos condomínios não colabora na qualificação da mão de obra e busca reduzir custos, despesas. Como já dito anteriormente, os condôminos acham que terceirizando reduz despesas. Se o sindicato patronal (econômico) tiver interesse em colaborar, podemos em conjunto criar um balcão de empregos, que selecionaremos o pessoal através de triagem para encaminhar aos condomínios e melhorar a mão de obra da nossa base”, concluiu.
Fonte: http://www.diariodolitoral.com.br/