25/11/20 07:50 - Atualizado há 4 anos
Para que um empreendimento tenha uma gestão condominial bem sucedida, é fundamental que haja sinergia entre síndico, administradora e zelador.
“Sempre enxerguei esse tripé como a chave de sucesso da gestão condominial. Cada ‘perna’ tem a sua função e uma completa a outra. Se uma delas apresenta falha, não está em sintonia com as demais, pode comprometer a operação, com consequências para todo condomínio”, afirma José Roberto Graiche Júnior, presidente da Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC).
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A clareza na definição do papel de cada ‘perna’ desse tripé é a ignição do bom funcionamento da gestão, que deve ser marcada pela sinergia, bom relacionamento e confiança entre síndico, administradora e zelador.
Alinhamento e espírito colaborativo são essenciais para que não haja atropelos e nem sobreposições na execução de tarefas, gerando desgastes e perda de tempo.
O síndico, seja ele morador ou profissional, é o representante do condomínio e tem um papel de gestor, com foco maior no planejamento, na estratégia, e na tomada de decisões.
A administradora assume as tarefas administrativas e rotineiras – mais de 200, segundo a AABIC - que vão do RH ao tributário.
Gestão de equipes (portaria, limpeza, manutenção etc), manutenção, tarefas operacionais e facilities estão entre as atribuições do zelador, que também faz a interface com moradores.
“O segredo para o bom andamento da gestão está no desenho de cada função, que deve ser desempenhada com muita fidelidade e alinhamento de expectativas para não gerar frustração com a não entrega. O que é óbvio e não acontece, frustra, e um erro brutal é não dar a demanda. Por menor que seja a tarefa, se não for pensada antes por uma liderança, não vai dar certo”, diz Décio Tenório, diretor comercial do Grupo Souza Lima, especializado em terceirização de mão de obra.
Quando o síndico assume o cargo em um condomínio, uma medida salutar é fazer um plano de implantação da gestão. Esta é a recomendação e prática de Claudio Gonçalves, síndico profissional em São Paulo, que conduz o processo em alinhamento com o conselho fiscal do condomínio (veja ao final sobre o papel do conselho).
Esse trabalho, que dura em torno de 60 dias na experiência de Gonçalves, inclui:
Com isso em mãos, o síndico profissional detecta os pontos que necessitam de intervenção maior para uma ação mais específica. Zeladoria e administração são pontos sensíveis, afirma.
"Nenhum síndico tem sucesso se não tiver uma administradora e um zelador que trabalhem bem. Quando as atividades estão bem distribuídas, o síndico pode se dedicar mais ao estratégico, às contas, orçamento etc sem se preocupar com tarefas e questões operacionais", destaca Claudio Gonçalves.
Ele se reúne com ambos e também com funcionários para alinhamento ao planejamento e aí inicia a segunda fase, que é a execução do plano tático para ter resultados rápidos nos primeiros seis meses.
"É importante que o condômino tenha percepção de que houve mudanças positivas, especialmente quando o condomínio está em crise. As pessoas estão ansiosas e querem que algumas coisas se resolvam logo", comenta.
Claudio Gonçalves não é adepto ao estilo de mudanças radicais quando assume um condomínio, mas de promover ajustes no que precisa melhorar.
"Não chego trocando tudo e nem prometo isso quando fecho um contrato porque o efeito pode ser pior. Já aconteceu de conselhos pedirem algumas mudanças imediatas, como troca de administradora ou zelador, mas geralmente me deixam a vontade para avaliar e trabalhar com liberdade", comenta.
PRINCÍPIOS DA BOA GESTÃO CONDOMINIAL *
(*) Por Claudio Gonçalves, síndico profissional.
Toda a parte técnica da administração do condomínio deve, de fato, ficar a cargo da administradora, que tem estrutura e recursos para executar as centenas de atividades e se mantém atualizada em termos de sistemas, leis e normas.
E para isso o síndico tem respaldo na lei: o artigo 1.348 do Código Civil permite a transferência das funções administrativas.
José Roberto Graiche Júnior ainda destaca o "pulo do gato", um componente que somente a administradora tem: a compilação da vivência de outros condomínios administrados.
"Essa é a maior riqueza de uma administradora: a experiência de viver a operação e os conflitos dentro de centenas de condomínios. Nós sabemos a melhor forma de conduzir as situações para atender bem toda a comunidade de cada condomínio. Tirando a pandemia de COVID-19, nada é fato novo, nada nos pega de surpresa", afirma o presidente da AABIC.
Outro fator importante é a imparcialidade da administradora, salientada por Graiche.
"Tratamos as situações de forma independente dentro de um condomínio, zelando pelo funcionamento e cumprimento das regras, sem tendências. Por exemplo, se não conduzirmos ou mediarmos bem um conflito entre vizinhos, corre-se o risco de colocar a operação em uma zona de guerra entre os moradores", destaca.
Para o síndico profissional Claudio Gonçalves, é imprescindível que as administradoras tenham agilidade para dar o suporte que o síndico precisa, em especial no envio de informações estratégicas para a gestão e no atendimento e envio de respostas ao morador.
Quando um novo síndico assume o cargo, Graiche explica que a boa prática da administradora é marcar reunião para colocá-lo a par do funcionamento do condomínio e para ele inteirar de toda parte burocrática.
"A administradora é a memória viva do condomínio. Em uma troca de síndico, não se perde o fio da meada com o nosso auxílio nessa transição, dando continuidade à administração. Quando é um síndico inexperiente, instruímos, fornecemos cartilhas, damos consultoria", explica o presidente da AABIC.
Se a administradora é o braço direito, pode-se dizer que o zelador são os olhos do síndico. É ele quem está por dentro de tudo e articula o dia a dia do condomínio.
"O zelador também é o elo de comunicação entre síndico e condôminos e síndico e administradora. Numa alusão ao futebol, o zelador é o meio-campista: não faz o gol, mas é fundamental na jogada", ilustra Décio Tenório, diretor comercial do Grupo Souza Lima.
O síndico profissional Claudio Gonçalves conta que a zeladoria é um dos pontos que mais "ataca" logo que assume um novo condomínio: segurança, limpeza, manutenção. Ele verifica tudo e começa a fazer mudanças onde as pessoas têm maior percepção. Às vezes são problemas crônicos que basta um ajuste de manutenção para resolver.
"O zelador, o gerente predial ou o manutencista (a depender do condomínio) deve fazer as coisas de acordo com o plano desenhado. Sempre digo que ele é os olhos do síndico, tem que ser de inteira confiança", diz Gonçalves.
Ele faz um trabalho de treinamento e de adaptação deste profissional às ferramentas que usa, investe em cursos ligados à manutenção e até informática quando há empenho e comprometimento.
Se a adequação não for bem sucedida e a capacidade de entrega ficar aquém do esperado e planejado, é chegada a hora de buscar um novo profissional.
PERFIL DO ZELADOR DE CONDOMÍNIO RESIDENCIAL
Para que a contratação seja assertiva, é muito importante que sejam levados em consideração alguns pontos listados por Décio Tenório, do Grupo Souza Lima:
SÍNDICO NOVO E ZELADOR ANTIGO
E quando um novo síndico assume e o zelador já está estabelecido no condomínio, como conduzir esse início de parceria e adaptações?
Para Décio Tenório, na chamada "transição de síndicos" o ideal é que haja uma reunião de passagem de bastão, promovida pelo síndico anterior ou pela administradora - às vezes, pelo conselho.
No caso de zelador terceirizado, Tenório explica que deve participar da reunião um representante da empresa prestadora de serviço para entender quem saiu, por que saiu e quem está chegando para alinhar expectativas antes da apresentação do novo síndico ao zelador. "O representante da terceirizadora faz a apresentação do zelador, suas qualificações, pontos fortes etc."
Quando é um zelador orgânico, a transição é feita diretamente pelo síndico, às vezes com presença de alguém da administradora, explica Tenório.
"O zelador vai trazer a memória e o histórico do condomínio ao síndico que está assumindo, colaborando para que a transição seja bem sucedida", afirma o diretor do Grupo Souza Lima.
Transparência é a palavra que resume a base da construção de uma relação de confiança entre os três pilares - síndico, administradora e zelador - da gestão condominial bem sucedida.
"É uma relação em que há 'gavetas sem chaves'. Confiança não vem de perfil e nem se descobre em entrevista de emprego ou avaliação psicológica. É tempo, continuidade de trabalho, é relacionamento. É como um cristal: quando trinca, não se remenda e tira-se da prateleira", ilustra Décio Tenório.
O síndico profissional Claudio Gonçalves lembra que este tripé deve permanecer unido trabalhando de forma direcionada pelos mesmos objetivos e interesses.
Não pode haver sonegação de informações entre as partes, que devem sempre trabalhar em prol de todos, com respostas positivas, firmeza e segurança nas orientações. Claro que nem tudo deve ser compartilhado com todos - vai de acordo com a função e a necessidade.
Há muitas informações de cunho administrativo, financeiro, de gestão e estratégia em poder do síndico e da administradora que não compete repassar ao zelador, por exemplo. E ele, por sua vez, deve separar com cuidado as informações que podem ser repassadas de acordo com os níveis de alçadas abaixo dele.
Mas tudo que é pertinente às tarefas e atribuições que estejam dentro do planejamento deve ser tratado com o zelador para que haja reciprocidade, lembrando-o sempre que estão no mesmo time.
"O zelador deve ter muita franqueza e agir de acordo com a cartilha da função. Todos somos factíveis a erros e o síndico deve encorajá-lo a reportá-los rapidamente. Se a correção é feita em tempo hábil, a penalização é quase nula. Assim ganha-se confiança", orienta Tenório.
A interação entre administradora e zelador também deve ser fluida e recíproca:
"Estamos em contato diário. É a administradora que muita vezes faz essa coordenação e fiscalização junto ao zelador no dia a dia para o síndico", diz José Roberto Graiche Júnior, da AABIC.
O síndico Claudio Gonçalves costuma aplicar pesquisas junto aos moradores quando assume um condomínio, repetindo anualmente, para orientar seu plano de trabalho. Itens que não faltam em suas pesquisas que avaliam o grau de satisfação (nota de 1 a 5):
"Com base nisso é possível mapear as áreas que têm menos satisfação para tomar providências, como reformas e troca de equipamentos, e começo a entender o que as pessoas desejam no condomínio", explica.
Em uma gestão condominial, há muitas coisas de bastidores, essenciais para o pleno funcionamento do empreendimento, mas que não estão no campo de visão dos moradores. Exemplos: CFTV, segurança, bombas.
Gonçalves costuma fazer uma lista dos itens que merecem atenção e pede para os moradores colocarem em ordem de prioridade para eles. "Levo para aprovação na assembleia e fica muito mais fácil. A satisfação das pessoas é maior com são consultadas."
As administradoras também podem apoiar o síndico aplicando elas próprias pesquisa de satisfação com os moradores, por meio de suas ferramentas.
Pesquisa de satisfação do síndico com o serviço da administradora também é uma boa prática para ter a percepção e a expectativa deste que é o cliente direto da empresa.
"A ideia é preservar o cliente e a pesquisa é um bom recurso para identificar onde estamos falhando e fazer ajustes", afirma Graiche, da AABIC. A sua recomendação é que esta pesquisa seja anual.
AVALIAÇÃO DO ZELADOR
No caso do zelador, Décio Tenório, do Grupo Souza Lima, explica que a pesquisa mais sincera é a mediação dos condôminos, com resposta “sim ou não”, sobre tópicos como vai a prestação de serviço como um todo, se o tratamento está adequado.
Na visão dele, as pesquisas de satisfação devem ser feitas mensalmente, com um condômino, geralmente alguém do conselho, que é o ponto focal naquele condomínio sobre a entrega de serviços do zelador.
Os três especialistas entrevistados foram unânimes em afirmar que o melhor meio de comunicação entre eles é o whatsapp, seguido de ligações para o celular e pelo e-mail, usado mais para documentar e registrar autorizações, determinações e ocorrências, inclusive para fins de se manter histórico, além de cotações, contratos etc.
"A ferramenta mais prática é o whatsapp, desde que a relação entre os envolvidos seja madura e haja alinhamento, com instrução quanto a horários e sinalização de urgência. A depender do condomínio, é possível criar grupo com as três pessoas: síndico, zelador e gerente da administradora", diz Décio Tenório, do Grupo Souza Lima.
Ele ressalta que em casos de urgência, é bom que se estabeleça que deve ser feita uma ligação, já que no whatsapp as pessoas geralmente respondem quando podem. E antes de criar o grupo e colocar as pessoas, é de bom tom que as partes sejam consultadas previamente. Inclusão só mediante autorização.
Claudio Gonçalves usa muito o whatsapp para acompanhar vistorias e atividades feitas pelo zelador ."Ele manda fotos de serviços feitos via whatsapp, que depois gravo e uso para prestar contas, fazer antes e depois", comenta.
Em especial nos condomínios com síndico profissional, a função e a contribuição do conselho ganha mais protagonismo, podendo ser considerado como o quarto pilar para o sucesso da gestão do empreendimento.
"Quando há um síndico contratado, o conselho acaba sendo muito mais atuante porque há uma expectativa de diminuir problemas e por saber exatamente o que o condomínio quer e precisa, afinal é o patrimônio dele", diz o José Roberto Graiche Júnior, presidente da AABIC, lembrando que há muito conselhos atuantes mesmo em condomínios com síndicos orgânicos.
Em sua experiência como síndico profissional, Claudio Gonçalves considera o conselho um pilar importante, juntamente com comissões temáticas, especialmente em condomínios-clube (esportes, kids, segurança, por exemplo).
"Há conselhos bem participativos e atuantes, que trazem ideias e sugestões, ajudam a planejar, fazer levantamentos. Já outros são mais tranquilos, dão uma ou outra contribuição. É um pilar importante, dá equilíbrio ao condomínio. Procuro fazer reuniões semanais ou quinzenais, mantê-lo sempre junto para poder colaborar na gestão", diz Gonçalves.
Fontes consultadas: José Roberto Graiche Júnior (AABIC), Claudio Gonçalves (síndico profissional) e Décio Tenório (Grupo Souza Lima).