Diego Basse

Vigilância Sanitária e o uso de máscaras em condomínios

A resolução do governo de SP que obriga o uso de máscaras em espaços públicos também torna o condomínio passível de fiscalização. Entenda como funciona

Por Thais Matuzaki

07/07/20 04:14 - Atualizado há 4 anos


Por Diego Basse*

Considerando as discussões da última semana, em face da edição da Resolução SS 96 do Governo do Estado de São Paulo, que atribui à Vigilância Sanitária a prerrogativa de fiscalizar e autuar estabelecimentos e cidadãos que por ventura estejam nos espaços públicos ou em locais de trânsito de pessoas sem a utilização da máscara de proteção, há a necessidade de esclarecimento das principais dúvidas no âmbito condominial.

Antes de qualquer discussão, temos que nos situar desde março de 2020, considerando o decreto estadual 64.881/2020

Toda a população paulista está vivenciando a quarentena face a necessidade de controle e prevenção ao contágio pela COVID-19 (coronavírus). O cenário de pandemia nos tirou dos afazeres cotidianos e mudou a rotina de toda a população. 

Os condomínios são organizações que possuem legislação própria (regulamento e convenção), têm seus dirigentes (síndico e conselho), observam processo eleitoral (em alguns casos com acirrada disputa), têm como premissa maior observar e resguardar o bem comum, qual seja a vida/saúde dos condôminos e moradores e o patrimônio coletivo.

Ou seja, estamos diante da fotografia de uma pequena cidade, com seu prefeito e secretários/vereadores, munícipes, logradouros públicos e a necessidade de impor regras de convívio para organizar a coletividade e manejar a arrecadação mensal, obtida por meio do obrigatório rateio de cotas, tal e qual a arrecadação tributária. 

excepcionalidade do momento pandêmico traz reflexos diretos na condução do cotidiano condominial, seja pelo aspecto comportamental ou pelas questões jurídicas e legislativas.

apesar dos condomínios serem espaços privados, as resoluções governamentais condomínio passível de fiscalização de órgãos públicos, incluindo a Vigilância Sanitária, conforme veremos a seguir. 

Em meio a tantas dúvidas suscitadas quanto à obrigatoriedade do uso das máscaras de proteção nas áreas comuns e a possibilidade do condomínio ser multado pela Vigilância Sanitária, desenvolveremos um raciocínio sem perder de vista a similaridade dos condomínios com os municípios e premissas maiores inseridas na Constituição Federal. 

Há o Princípio de Direito Implícito na Constituição Federal (nossa Lei Maior), que incide em ato jurídico e por via acessória também refletem no âmbito condominial. E qual seria esse princípio norteador? O Princípio da Primazia do Interesse Público sobre o Interesse Privado.

No dia a dia, nos apegamos em demasia às formas e esquecemos que a lei e os atos jurídicos têm como finalidade obter a ordem, a harmonia social e o bem estar comum

Diante da pandemia (nos perdoe o trocadilho, mas que nos trouxe o “pandemônio”), é necessário que alguns atos jurídicos, inclusive dos governantes, sejam analisados e colocados em prática sob esse prisma: o da primazia do interesse público

Se estamos diante de uma pandemia, situação não vivenciada por nossa geração, é natural que medidas extremas sejam adotadas para conter o coronavírus, e a Resolução SS 96, que impõe multa aos estabelecimentos comerciais e aos cidadãos pela ausência do uso de máscara, tem esse viés: o de proteger a toda coletividade, ainda que tenha que penalizar os que individualmente não buscam tal proteção.

Dessa forma buscamos ponderar diante da questão: 

O Governo do Estado de São Paulo, ampliando o alcance do Decreto n° 64.959/2020 (que impõe o uso obrigatório de máscaras nos espaços públicos paulistas), por meio da Resolução SS 96 determina e dá competência aos fiscais da Vigilância Sanitária para impor multa aos pedestres e estabelecimentos comerciais. No tocante aos condomínios a obrigatoriedade é extensiva. 

Tire aqui algumas dúvidas sobre isso abaixo.

A Vigilância Sanitária promoverá fiscalização em face dos condomínios de forma proativa ou mediante denúncia? 

Conforme publicação no website do governo do Estado de São Paulo, os condomínios, no tocante à circulação de pessoas nas áreas comuns das edificações (residenciais e comerciais), é obrigatório utilizar a máscara de proteção nas áreas comuns.

havendo denúncia, os agentes da Vigilância Sanitária poderão fiscalizar e autuar o condomínio, impondo multa de R$ 5.025,02.

Caso o condomínio seja multado pela Vigilância Sanitária, em razão de condômino ou prestador de serviços não estar utilizando a máscara de proteção, quem deve arcar com a referida despesa? 

No caso da autuação da Vigilância Sanitária, é possível em sede preliminar, apresentar defesa administrativa, no entanto, se a multa for convalidada, o condomínio deve pagar para evitar que o CNPJ/MF do condomínio seja inscrito na dívida ativa do Estado.

Contudo, em sede regressiva, o condomínio pode voltar-se em desfavor do condômino/morador ou ainda do prestador de serviços, para receber o valor da multa.      

Independente da multa aplicada em face do condomínio, o condômino pode ser penalizado?

O condômino pode ser duplamente penalizado, considerando a possibilidade de arcar com a multa inserta no artigo 1337 do Código Civil, há possibilidade de suportar a multa eventualmente paga pelo condomínio. 

Vale destacar que o condômino deve exercer seu direito de propriedade observando a seguridade, saúde e sossego de toda a massa condominial e que pode ser apenado, caso não cumpra com seus deveres, conforme disposto na  lei em comento. 

Portanto concluímos: por questões culturais, a mera conscientização não traz o efeito desejado pelo Poder Público ou por aqueles que precisam impor determinadas condições à população, como o uso das máscaras de proteção para evitar o contágio pela COVID-19.  

Reconhecidamente, a tendência das pessoas é observarem regras somente quando diante da possibilidade de punição pecuniária, caso contrário não há adesão total

Estamos vivenciando um momento excepcional, cuja premissa maior é a proteção da saúde das pessoas. 

o mais importante é que o uso das máscaras de proteção deve ser imposto pelo síndico (decisão sempre de forma colegiada), com o intuito de proteger a todos que circulam pelos condomínios.

Essa deve ser a motivação do uso das máscaras, o afastamento da COVID-19 da massa condominial.

(*) Diego Gomes Basse (OAB/SP 252.527) é palestrante e sócio titular da Banca de Advogados Gonçalves, Basse & Benetti Advogados (escritório associado à AABIC e ao SECOVI/SP.). É também consultor e advogado especialista em Direito Condominial; militante na área há mais de 15 anos. Basse é ainda presidente da Comissão de Direito Condominial da Subseção da OAB /SP da Comarca de Barueri; e consultor e colaborador do Instituto Cacau Show.