Como fazer a fiscalização da administradora de condomínio
Fazer a fiscalização da administradora de condomínio é uma forma de evitar fraudes e golpes, como o recente caso da Fort House. Entenda abaixo quais cuidados tomar
Ninguém contrata um prestador de serviços desconfiando que o mesmo vai “te passar a perna”, certo? Ainda mais quando se trata da administradora do condomínio, uma empresa na qual o síndico e os condôminos devem poder confiar.
Até porque, é da administradora que o síndico vai receber conselhos de todos os tipos, auxiliar na contratação de fornecedores, de funcionários e, principalmente, porque é ela quem cuida do dinheiro do condomínio.
Ou seja, a administradora, via de regra, é quem recebe a arrecadação da taxa mensal e faz os pagamentos de absolutamente tudo. Desde os colaboradores – maior investimento mensal dos empreendimentos – até pequenos reparos.
Desse modo, é importante fazer a fiscalização da administradora de condomínio regularmente. Assim, evita-se fraudes e golpes - como o recente caso do desvio milionário da FortHouse em dezenas de condomínios em São Paulo - e faz-se da prestação de contas um hábito frequente no condomínio.
Pensando nisso, abaixo preparamos um conteúdo completo sobre como fiscalizar a administradora que faz a gestão do seu condomínio e detalhes sobre o caso, com entrevista com a síndica que está liderando um grupo de gestores de condomínios lesados pela Fort House e o advogado que está atendendo 8 empreendimentos. Boa leitura!
Quem fiscaliza a administradora de condomínio?
Nas leis do Código Civil e federais não existe um órgão específico que faça a fiscalização da administradora de condomínio. Pois, via de regra, essa é uma das atribuições do síndico, já que há casos em que os dois fazem a gestão conjunta.
Entretanto, como não dá para confiar fielmente e os condôminos começam a desconfiar de algo, é necessário averiguar se o problema está somente com a administradora ou o síndico é um comparsa no esquema.
Desse modo, com ou sem a ajuda do síndico na fiscalização, é recomendado fazer uma auditoria interna, pelo menos uma vez no ano. Em casos de condomínios grandes, as auditorias podem ser feitas a cada seis meses ou até mesmo mensalmente.
Assim, é preciso contratar uma empresa especialista em auditar contas e escolher uma que não tenha nenhum vínculo com a administradora e nem com o síndico.
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Nesse sentido, a auditoria mostrará se tem casos suspeitos e levará as provas necessárias para a denúncia.
De quem é a responsabilidade civil do condomínio?
Sabemos que o síndico é o responsável legal pelo condomínio, mesmo que ele divida a gestão do empreendimento com uma administradora.
Porém, quando o síndico contrata um serviço desse tipo, a administradora tem, sim, responsabilidade pelos atos dos seus funcionários, como explica Roberto Bigler, diretor jurídico adjunto da ABADI (Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis).
“A empresa é totalmente responsável pelos atos de seus funcionários ou sócios. O condomínio, nesse momento, é o tomador de serviços, e nessa relação incide o que o Código de Defesa do Consumidor entende como ‘responsabilidade objetiva’”, aponta Bigler.
Importante apontar também que, caso sejam comprovadas falhas na prestação de serviço, o condomínio é livre para encerrá-la sem multas ou aviso prévio.
Caso algum condômino esteja desconfiado e queira saber mais sobre as contas do condomínio, ele pode e deve ter acesso aos documentos. Além disso, uma medida preventiva que os condôminos podem exigir é ter um contrato fixo do serviço de auditoria periódica para evitar esse tipo de situação, como dito anteriormente.
Quais irregularidades e fraudes são mais comuns e como evitá-las?
A administradora desonesta pode:
- Pedir para o fornecedor de produto ou serviço fazer uma nota fiscal com valor superior ao real, e ficar com a diferença.
- Tirar dinheiro secretamente do fundo de reserva, que é usado só em caso de emergência. Se não há conferência do saldo e da movimentação do fundo, não se percebe esta irregularidade.
- Não especificar as contas a pagar e desviar dinheiro do condomínio.
- Em casos mais graves, deixa de pagar contas e o condomínio fica inadimplente (água, luz, gás, outros fornecedores).
Além das irregularidades acima, deve-se fazer a fiscalização da administradora de condomínio nos seguintes setores:
Fornecedores contratados
Algumas administradoras têm seus "fornecedores cativos", que lhe destinam "por baixo dos panos" uma porcentagem (de 5% a 10%, geralmente) do valor do serviço ou produto oferecido ao condomínio.
Por isso, dificilmente são as melhores empresas ou as que fazem o menor preço. Para se prevenir contra esse problema, exigir abertura de cotações sempre com 3 orçamentos para compra de produtos ou contratação de serviços.
É conveniente que o síndico ou o conselho confirmem diretamente com as empresas o valor do orçamento e seus principais pontos, para evitar a possibilidade da administradora "maquiar" os preços ou serviços oferecidos.
Nas despesas maiores, sugere-se que o próprio síndico ou os conselheiros façam diretamente cotações com fornecedores. Também pode-se aceitar orçamentos apresentados por condôminos.
No caso de fornecedores de produtos que necessitam de constante renovação, como materiais de limpeza, é interessante promover um rodízio entre as empresas de que se compra. Assim, diminui a possibilidade de "conchavo" com a administradora e pode-se verificar a diferença de qualidade entre os produtos e serviços oferecidos.
Os orçamentos de contratação de serviços e compras de produtos devem ser aprovados em assembleia. Qualquer alteração de valores deve motivar a convocação de nova assembleia. Exceções: serviços de emergência; despesas correntes (material de escritório, limpeza), que muitas vezes não precisam de aprovação.
Calote nas contas de consumo do condomínio
Outro ponto que pode ser um foco de fraudes da administradora de condomínio é o não pagamento de contas de concessionárias, como água, luz, gás e telefonia.
“Se há desconfiança de que algo está errado, o síndico pode checar nos sites das próprias companhias se as contas estão em dia”, sugere Marco Gubeissi, diretor de administradoras do Secovi-SP.
Foi justamente o pagamento em atraso de uma conta de água que fez a síndica Ana Leticie Herrera desconfiar de que algo estava errado no serviço da FortHouse.
"Em julho de 2022, notei que a conta de água estava vindo com incidência de juros por pagamento em atraso, o que não justificava, pois o condomínio estava com caixa. Questionei a administradora e começaram a me enrolar, primeiro dizendo que tinha sido erro no banco, depois que havia sido erro do sistema da administradora", relata a gestora.
Contribuições trabalhistas
Uma das fraudes mais comuns cometidas por administradoras desonestas é não pagar as contribuições trabalhistas dos funcionários dos condomínios.
Há casos relatados de falsificação de autenticação bancária nas guias de recolhimento. A administradora cobrava o dinheiro do condomínio relativo às contribuições trabalhistas, mas não as pagava, entregando cópias adulteradas das guias.
Esta foi uma das descobertas de Ana Leticie Herrera: a administradora deixou de recolher o INSS do funcionário e o condomínio acumula R$ 180 mil de dívida com o INSS.
"A FortHouse parou de pagar o INSS em 2016. São duas dívidas, sendo que uma delas já está na dívida ativa", lamenta. E na prestação de contas constava que tudo estava em dia, ou seja, falsificaram comprovantes.
Independentemente de a administradora ser a responsável pelo débito, neste caso, os condôminos são obrigados a saldar a dívida previdenciária, conforme determina o artigo 123 do Código Tributário Nacional. Para ressarcimento dos valores, o condomínio deve entrar com ação na Justiça contra a administradora.
Recomenda-se ao síndico ou aos conselheiros realizar pessoalmente a emissão da CND (Certidão Negativa de Débito) do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Isso pode ser feito via internet. O documento tem validade de 60 dias.
O pagamento do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) pode ser acompanhado pelo funcionário, que deve receber periodicamente em sua residência extratos de sua conta de contribuição, enviados pela Caixa Econômica Federal. É interessante verificar com os funcionários se eles realmente estão recebendo esta correspondência.
Conta corrente do condomínio
É necessário fazer um acompanhamento constante da movimentação da conta corrente do condomínio: no mínimo, semanal.
É comum o síndico dar procuração para a administradora fazer a movimentação da conta do condomínio para programar pagamentos, colocar contas em débito automático, entre outras medidas.
Mas o advogado Márcio da Silva Geraldo, que está cuidando de 8 condomínios do escândalo da FortHouse, lembra que atualmente existem instrumentos tecnológicos que limitam a ação das administradora na movimentação, como a etapa que exige a aprovação das transações, que pode ser o síndico ou um conselheiro.
"Quando esses instrumentos de segurança são usados na conta corrente do condomínio, desvios só acontecem quando há conluio entre administradora e síndico", afirma.
Se o condomínio tem "conta pool", ou seja, o dinheiro fica numa conta comum da administradora (junto com outros clientes), verificar minuciosamente os relatórios por ela enviados sobre a movimentação, comparando com as despesas alegadas.
A "conta pool" proporciona ao condomínio economia de taxas bancárias, mas aumenta a possibilidade de fraudes, porque o condomínio não tem os extratos fornecidos pelo banco, apenas o relatório da administradora. É lógico que, se a conferência dos relatórios for atenciosa, fecha-se esta brecha.
“A conta pool pode ser uma ótima ferramenta para uma administradora honesta. É importante não diminuirmos o trabalho correto que muitas empresas fazem se utilizando dessa modalidade”, pesa Roberto Bigler.
Suspeita de fraude da administradora
Se há suspeita de fraude da administradora ou do síndico anterior, o melhor a fazer é ter uma postura discreta, num primeiro momento.
É interessante juntar o maior número de documentos que provem a irregularidade. Há muitos casos de processos por calúnia e difamação motivados por acusações de fraude em condomínios.
Pode-se contratar uma auditoria, em suspeita de fraude ou má administração. Foi exatamente o que fez Rosana Candreva, síndica do Condomínio Camburi, na Vila Mascote, em São Paulo.
"A FortHouse administrou meu condomínio há mais de dez anos e percebemos algo estranho na movimentação da conta corrente. Na época, havia uns débitos altos de uma conta para outra e voltava um valor diferente. A empresa tinha procuração e mexia na conta. Questionávamos, uns dois meses depois devolviam o valor, depois tiravam de novo. Aí explicaram sobre a conta pool, alegando que pagavam tudo por lá. Mas tínhamos débito automático de contas grandes de concessionária e serviços, não fazia sentido", relembra Rosana.
Ela conta que, com a desconfiança, o condomínio buscou outra administradora e, paralelamente, uma empresa que fizesse auditoria nas contas.
"Com a auditoria feita, a FortHouse acertou a confusão de caixa e mudamos de administradora", conta a síndica, alivada. "Fomos rápidos! Agradeço ter uma subsíndica presente e um conselho atuante. Checar contas, saldo é de muita responsabilidade e dá trabalho."
A atual administradora do Condomínio Camburi faz as movimentações com conta pool, porém o condomínio tem uma conta corrente própria que somente os representantes do condomínio acessam. Rosana explica que só transfere para a conta pool o valor referente às despesas do mês e para cobrir eventual inadimplência. O saldo e o fundo de reserva ficam investidos na conta própria e ela envia o extrato bancário para a prestação de contas.
Embora sejam comuns os boatos e suspeitas de irregularidades, poucos casos chegam à Justiça. Um dos motivos é a duração deste tipo de processo: pode demorar até três anos só em primeira instância.
Nesse período, o réu pode desfazer-se dos bens. Assim, caso ganhe a causa, o condomínio ainda corre o risco de ficar sem receber.
Se existirem provas documentais constatando crime, uma ação penal deve ser movida com pelo menos uma das seguintes acusações: estelionato, apropriação indébita ou falsificação ideológica.
Se a acusação permanecer apenas no âmbito civil, pode ocorrer condenação patrimonial e posterior negociação entre as partes.
No vídeo abaixo, o advogado e especialista SíndicoNet Jaques Bushatsky explica o que é apropriação indébita. Assista!
Prestação de contas
Para evitar um problema dessa proporção, o ideal é acertar com a administradora uma prestação de contas periódica mais detalhada, além da mensal.
Nesta prestação detalhada, devem constar, por exemplo, guias pagas de todos os tributos e certidões negativas de débito.
Além da possibilidade de ter seus bens penhorados para o pagamento da dívida, o síndico de um condomínio vítima de desvio de dinheiro pode ser preso por negligência administrativa.
É preciso provar que não foi omisso, que estava continuamente fiscalizando as contas do prédio para poder ficar isento de um processo.
Golpe da FortHouse: desvio estimado em R$ 30 milhões de 40 condomínios
Ana Leticie Herrera, síndica de um dos mais de 40 condomínios vítimas do golpe da administradora FortHouse, relata que a empresa administrava há mais de 12 anos seu condomínio, na região do Jabaquara, em São Paulo, antes mesmo dela ser síndica - cargo que assumiu em 2018.
Síndico e conselho acompanhavam as contas pelo extrato do banco e pelo balancete emitido com todas as contas.
“Até setembro de 2015, a administradora anexava na pasta de prestação de contas o extrato original do banco e a gente conferia e tudo batia. Depois, com a digitalização, a empresa passou a usar uma planilha para espelhar o extrato e não mais anexavam o original", relata Herrera. Foi a partir daí que as irregularidades deram início.
Cronologia do golpe da FortHouse
Como já citado, a síndica estranhou a incidência de juros por atraso no pagamento da conta de água em julho de 2022 e ouviu justificativas furadas de que houve problema no banco e depois que foi problema no sistema.
Em setembro, Ana Leticie decidiu ir ao banco pessoalmente para tirar a história a limpo e pegou o extrato dos últimos três meses e percebeu outro sinal do golpe: transferências não autorizadas para a conta da FortHouse. O condomínio dela tem conta própria (e não conta pool).
"Na planilha que a administradora dizia espelhar o extrato do banco constava 'aplicação automática', enquanto no extrato oficial do banco aparecia 'transferência' para a conta da FortHouse. Eu confrontei o João Carlos Capporicci (sócio da FortHouse) mostrando o extrato original e perguntei porque estava diferente um documento do outro e ele só me dizia que se tratavam das tais aplicações que estavam no próprio banco", relata.
Além de constatar as transferências indevidas, Ana Leticie descobriu que, além de não ter R$ 222 mil do Fundo de Reserva aplicado, o condomínio estava usando o cheque especial há anos e, naquele momento, estava negativo em R$ 35 mil, em atraso com duas contas de água, uma conta de luz e três parcelas do conserto do elevador de R$ 8 mil cada uma - fora os juros pelo atraso.
"Reportei tudo ao conselho e exigi que o João transferisse as aplicações de volta para a conta do condomínio. Passaram dois meses e nada de devolver os valores. Sempre dizia que precisava de mais tempo porque tinha um valor elevado investido e prometeu que dia 10/2/23 faria toda devolução", diz.
Em janeiro de 2023, Ana Leticie revogou os acessos dele e dos procuradores à conta bancária do condomínio e ela mesma começou a fazer a administração.
Importante destacar que é uma prática comum na gestão condominial que a movimentação bancária seja feita pela administradora com uso de procuração. Mas isso não significa um carta branca para a administradora fazer o que quiser.
Antigamente, para dar mais segurança às movimentações, síndico e subsíndico (ou conselheiro) assinavam ambos os cheques para cada pagamento. Com as inovações tecnológicas bancárias, e o desuso do cheque, atualmente é possível limitar a ação da administradora implementando a etapa de aprovação das transações, conforme explicado anteriormente pelo advogado Márcio Geraldo.
Com esse instrumento tecnológico, a administradora programa os pagamentos e o condomínio, na figura do síndicou e/ou outro representante, aprova. Com essa boa prática implementada, desvios só acontecem se houver conluio entre administradora e síndico.
No dia 19/3/23 (domingo), ela recebeu da FortHouse uma caixa com parte dos documentos do condomínio e tal carta de “desculpas” de João Carlos Capporicci.
Ela já conhecia uma síndica de outro condomínio também administrado pela FortHouse. As duas conversaram e combinaram de ir ao banco juntas no dia seguinte, 20/3. E lá ela se deparou com vários outros síndicos e se organizaram para tomar as providências.
Cheque especial
Quando falou com o gerente da conta do banco, Ana Leticie Herrera descobriu que o condomínio estava usando cheque especial desde 2015.
"O gerente havia proposto à administradora que o condomínio pagasse o cheque especial sem juros em 2021, num programa de incentivo pós pandemia, mas como precisava da minha assinatura como síndica para firmar o acordo, o João nem me repassou", lamenta. De acordo com ela, o sócio da administradora apresentava CNDs negativas falsificadas ao conselho.
Ação criminal e ação de indenização cível
A síndica providenciou minuta de contrato de confissão de dívida e estipulou que ele pagasse tudo até 25/3/23. João Carlos Capporicci não assinou o contrato. Segundo Ana Leticie, no dia 17/3 os funcionários foram demitidos e o escritório fechou as portas.
Embora na carta que enviou a todos os 40 condomínios o sócio da FortHouse assume toda a culpa pelo ocorrido, a síndica afirma que os funcionários tinham ciência do que estava acontecendo. "Poderiam não saber o tamanho do rombo, mas sabiam que estava tendo falcatrua. Eu pedia as certidões, extratos, cobrava pagamento das contas e davam desculpas", diz.
"No começo, a Forthouse trabalhava corretamente. Não é que fomos negligentes, e confiamos piedosamente. Foi um golpe arquitetado a partir de 2015. Apresentaram documentos falsificados, usaram procuração para fazer transferências e tirando autonomia dos síndicos de movimentar a conta, dizendo que era mais seguro para o condomínio, visto que há vários casos de síndicos que roubavam condomínios assinando cheques. Muitos síndicos não se preocupam, acabam dando procuração para facilitar o dia a dia das contas a pagar", comenta a síndica Ana Leticie Herrera.
Segundo Márcio Geraldo, advogado do condomínio de Ana Leticie, há dois caminhos para seguir:
1. Ação criminal para que o João Carlos Capporicci responda pelos atos dele. "Estamos tomando medidas criminais contra a pessoa física do dono da administradora. Nesta etapa, está atuando em conjunto em uma ação só de oito condomínios", diz o advogado. Entrou com a notícia crime na semana de 20/03/23 quando o golpe veio à tona.
2. Ação de indenização cível para tentar reaver o dinheiro ou parte dele. Cada condomínio vai fazer de forma independente, porque são valores diferentes.
“Em uma análise preliminar, entendo que houve fraude por abuso de confiança, estelionato e apropriação indébita. Outros crimes podem ser apurados pelo Ministério Público e a Polícia.”
Reorganização do condomínio e comunicação aos condôminos
Ana Leticie Herrera negociou com fornecedores para poder organizar as finanças e ter um pouco de caixa para conseguir colocar as coisas em ordem. Já conseguiu pagar o cheque especial e as contas de consumo atrasadas. As próximas negociações são com o INSS (R$ 180 mil) e a empresa de elevador (R$ 24 mil).
A síndica fez uma reunião com todos os condôminos no dia 25/3 (sábado) para colocá-los a par. Ela tem tido o cuidado de manter uma comunicação transparente e frequente para deixar todos por dentro conforme o andamento.
“Tive apoio e união dos condôminos. Estamos confiantes. Teremos assembleia nos próximos dias para explicar tudo oficialmente, para constar em ata, e aprovar um rateio extra para liquidar o que falta.”
Lições aprendidas
A partir do golpe da FortHouse e do relato de Ana Leticie Herrera e Márcio Geraldo, pode-se extrair algumas lições para outros síndicos, conselheiros e condôminos:
- Fiquem atentos a instrumentos que limitam a ação da administradora na movimentação bancária;
- Nunca baixar a guarda e nem trabalhar na base da confiança. Dependendo do timing, quem pode responder é o síndico, segundo o Código Civil. Ele pode ser responsabilizado civilmente por omissão. "Criminalmente não, a não ser que ele tenha se beneficiado com o produto do desvio, se provado", elucida Geraldo;
- Participação mais ativa de subsindico e conselho, estão ali para auxiliar e também fiscalizar a gestão. "Em muitos condomínios, os conselheiros só assinam a 1ª página da pasta, nem conferem", diz o advogado;
- Condôminos: comparecem às assembleias;
- Condôminos: acompanhem os balancetes. "Em cinco anos como síndica, nunca um condômino questionou as contas, nunca solicitou uma pasta", comenta Ana Leticie.
- Qualquer assunto que sai da rotina, o síndico deve levar para assembleia, que é soberana;
- Fazer uma auditoria independente. Isso serve também para o síndico que assume pela primeira vez, para se certificar, por meios isentos, a real situação do condomínio.
O que fazer em suspeita de irregularidades na administração do condomínio?
É responsabilidade do síndico acompanhar o trabalho da administradora mensalmente. O gestor não pode alegar, depois de meses, que não tinha conhecimento de irregularidades praticadas pela empresa.
Como visto anteriormente, ele pode, inclusive, responder com seu próprio patrimônio por “erros” cometidos durante a sua gestão.
Se síndico, conselheiros ou moradores sentirem que algo não está correto com os serviços da administradora, o ideal é pedir uma prestação de contas detalhada dos serviços realizados.
“Prestar atenção nas datas dos pagamentos, se estão batendo com as datas de vencimento das contas, por exemplo, é importante. Se o condomínio está com o caixa em dia, tudo deve ser pago dentro do prazo”, aponta Marco Gubeissi, advogado e diretor de administradoras do Secovi-SP.
Com a prestação de contas da administradora em mãos, fica mais claro perceber se está havendo atrasos, saques indevidos, entre outros.
“Caso fique claro para o síndico de que realmente há falhas e/ou fraudes na prestação de serviços, o síndico pode entrar com uma ação judicial pedindo o ressarcimento dos valores em questão”, ensina Roberto Bigler, da ABADI.
O processo, via de regra, corre na Justiça comum. Se ficar comprovado que realmente houve danos ao condomínio no curso da ação, o juiz sentencia a administradora a arcar com o prejuízo em questão – e pode penhorar os bens da empresa e dos sócios.
Aqui, é importante dizer que a empresa escolhida deve ter lastro para fazer frente a esse tipo de prejuízo causado.
“Ao escolher, é fundamental que se opte por uma administradora que tenha solidez de mercado, com um capital social robusto, que siga as boas práticas do mercado, de preferência filiada às entidades de classe da sua cidade ou estado”, assinala José Roberto Graiche Júnior, presidente da AABIC (Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo).
Em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro, há certificações das entidades de classe para as administradoras.
O PROAD (Programa de Autorregulação das Administradoras), da AABIC e Secovi-SP, em São Paulo, e o Procondo (Programa de Autorregulação da Atividade de Administração Condominial), do Rio de Janeiro, são programas de qualidade das administradoras, que usam empresas de auditorias externas para qualificar o trabalho das empresas que buscam a certificação.
Como denunciar uma administradora de condomínio?
Primeiro, como falamos acima é necessário ter provas concretas. Achismos e boatos geram processos de calúnia e difamação para o condomínio.
Dessa forma, com as provas das fraudes e golpes em mãos, o recomendado é procurar a Polícia ou apresentar os documentos para o advogado do condomínio e juntos irem à polícia.
Na delegacia, será feito um boletim de ocorrência e, posteriormente, o advogado podem entrar com uma ou mais ações, a depender dos desdobramentos do caso, para ter ressarcimento, como citamos acima.
Além disso, não é necessário falar com os representantes da administradora sobre as suspeitas, pois eles podem dar um jeito de sumir com as provas ou desaparecerem. Desse modo, é importante agir com discrição e planejamento com orientação de uma assessoria jurídica.
Portanto, fazer a fiscalização da administradora de condomínio não deve ser algo pontual, mas sim uma rotina do empreendimento para evitar as situações relatadas acima.
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Fontes consultadas: José Roberto Graiche Júnior (AABIC), Marco Gubeissi (Secovi-SP), Roberto Bigler (ABADI), Márcio Geraldo (advogado), Ana Leticie Herrera (síndica), Rosana Candreva (síndica).