Choro de pacientes
Justiça derruba multa aplicada por condomínio contra dentista no PR
Justiça derruba multa aplicada por condomínio contra dentista, em Curitiba; autuação foi por barulho de choro de pacientes
Decisão é provisória. Edson Higa foi multado em fevereiro devido ao choro de crianças atendidas por ele - a maioria com deficiência. g1 tenta contato com a defesa do condomínio
Uma decisão provisória (liminar) da 5ª Vara Cível de Curitiba suspendeu a multa aplicada contra o odontopediatra de Edson Higa, autuado em fevereiro pelo condomínio comercial onde trabalha, no Centro Cívico, por conta do choro de crianças que ele atende - a maioria tem deficiência.
O despacho favorável a Higa, emitido na última terça-feira (26), não significa o fim do processo, que continua em curso. Além da suspensão da multa, a decisão liminar também definiu que uma vizinha do odontopediatra não possa mais bater na janela dele, sob risco de multa diária. Leia mais abaixo.
O valor da multa expedida contra Higa foi de R$ 332,66, preço da taxa condominial. O documento enviado pelo condomínio ao profissional dizia que, em caso de reincidência, o valor poderia ser multiplicado por 10.
"Ressalto que em nenhum momento restou demonstrado que a atividade da parte autora ultrapassa o limite de decibéis previsto para a sua localização e que, assim, possa ensejar a alegação de barulhos excessivos", diz trecho do despacho, assinado pelo juíz Fábio Luis Decoussau Machado.
Segundo Hanna Baptista, advogada do odontopediatra, a suspensão da multa vem ao encontro ao que no direito é conhecido como "perigo de dano na demora".
"No caso dele, ter a chance de isentar a multa apenas ao final do processo ia causar um grande prejuízo moral e econômico, ele não conseguiria trabalhar direito. O risco dele ter que cessar o trabalho seria imediato. E no caso das batidas na janela, o risco se apresenta quando quando ele está com itens como o bisturi. Se ele machucar uma criança por conta das batidas, não tem volta".
O g1 entrou em contato com a defesa do condomínio, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem.
Para Higa, a decisão liminar proporcionou um sentimento de alívio.
"Vocês não imaginam o quanto isso me afetou, o quanto me machucou, como me senti injustiçado, atacado, não compreendido [...] e mais, o constrangimento das crianças com deficiência. Onde está a empatia e a compaixão?".
O caso
A multa contra Edson Higa foi expedida em 7 de fevereiro, mas o caso ganhou repercussão no início de abril, após o dentista divulgar imagens da penalidade. Uma manifestação favorável ao profissional foi realizada na capital.
Segundo Higa, antes de ser multado, ele foi notificado em 9 de dezembro de 2021. Na ocasião, o condomínio alegou que o barulho e o choro das crianças extrapolavam “o limite do seu imóvel”.
Ao g1, na época, a defesa do Centro Comercial Cândido de Abreu informou que o dentista "manipulou informações" sobre a solicitação do condomínio "para confundir a falta de preparo do laboratório dele com a violação aos direitos dos pacientes". Além disso, alegou que não existe discriminação no caso ou objetivo de prejudicar a atividade do dentista.
Na notificação, assinada pela síndica, foi solicitado que o dentista tomasse providências para “diminuição ou eliminação do barulho”. O documento solicitou, também, que ele fizesse isolação acústica do consultório, o que ele afirma ter acatado.
De acordo com Higa, no dia em que foi multado, ele estava atendendo uma criança com paralisia cerebral. Ele lembra que o paciente chorou e que, ao ouvir o barulho, uma vizinha bateu diversas vezes na janela do consultório. Na hora, o dentista disse que estava com um bisturi na mão.
“Eu acatei os pedidos que me fizeram. Contratei uma empresa pra fazer a acústica. Mas são crianças, um choro ou outro vai acabar sendo ouvido. Quando eu fiz o isolamento do ambiente, mandei documentos comprovando, inclusive assinados por um engenheiro. Mesmo assim fui multado”.
Denúncia
Em 12 de abril, o caso chegou à Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente, do Idoso e da Pessoa com Deficiência (Criai) da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep).
Na época, o órgão informou que oficiou o Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítima de Crimes (Nucria), da Polícia Civil, pedindo a investigação do caso.
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