Condomínios em implantação: garantias, pegadinhas e segredos
A gestão de condomínios em implantação é diferente. Nessa fase, síndicos e administradoras têm desafios peculiares, mas existem formas de superá-los. Conheça!
Administrar condomínios em implantação é preparar um empreendimento desde seu nascimento até sua maioridade. Trata-se de receber uma obra e transformá-la na residência das pessoas. Não tem como ser fácil, não é mesmo? Ainda mais que o mercado está expandindo cada vez mais.
Segundo um levantamento da Lello, a cidade de São Paulo, por exemplo, vai bater o recorde histórico de novos condomínios entregues em 2024, com 818 empreendimentos. Existe um campo fértil para atuação de síndicos e administradoras.
Mas para garantir o sucesso desse tipo de empreendimento, deve-se ter atenção especial a quatro principais pontos: manutenção/garantia, bons aliados (condôminos, conselheiros, funcionários e prestadores de serviço), comunicação afinada e planejamento.
A matéria apresenta 8 erros e pegadinhas da gestão de condomínios em implantação, as consequências, bem como os segredos para síndicos e administradoras conduzirem a instalação do empreendimento com sucesso. Vamos lá?
8 erros e pegadinhas na gestão de condomínios em implantação e suas consequências
Confira abaixo 8 erros e pegadinhas que síndicos e administradoras enfrentam ao administrar condomínios em implantação. Apontamos, ainda, as consequências de cada um deles.
1) Falta de vistoria especializada na entrega das áreas comuns
Para o síndico profissional Renato Alves, fazer uma vistoria superficial na entrega definitiva da construtora, sem uma perícia técnica e laudo fotográfico documentando tudo, é muito arriscado e ele aponta o porquê.
"Nesse momento de entrega do condomínio, há muitas inconsistências. Na maioria das vezes, o síndico ou o zelador não tem a capacidade técnica para fazer essa checagem, notando apenas a parte estética, mobília, acabamentos, etc. A aceitação tácita e prematura dos itens que poderiam ser questionados junto à construtora pode levar à perda da garantia", ele expõe.
- Veja também: Garantias da construtora na entrega do condomínio
2) Deixar de fazer manutenção por acreditar que a garantia da construtora cobre tudo
Por um conjunto de leis (Código Civil e Código de Defesa do Consumidor) e decisões judiciais, as construtoras devem oferecer uma garantia de, no mínimo, 5 anos ao condomínio e seus compradores.
Acontece que essa garantia não é irrestrita e diz respeito apenas aos vícios e defeitos de construção. Ou seja, a manutenção do condomínio deve ser feita normalmente, nos moldes definidos pela construtora e, se não for, os problemas decorrentes não são de responsabilidade da empresa, mas sim do representante legal do condomínio que está incumbido de conservá-lo, o síndico.
Renato conta, porém, que muitos síndicos deixam de executar as manutenções no condomínio por acreditar que a garantia da construtora resguarda tudo. É o que ele chama de 'economia burra'.
"Ele precisa entender que o condomínio é como um carro novo, tem que fazer as revisões e seguir o que está descrito no manual do proprietário. Portanto, economizar nesse aspecto, além de resultar na quebra de garantia e depreciar rapidamente o empreendimento, causa grandes transtornos aos moradores", ele comenta.
3) Previsão orçamentária inicial
Na implantação de um condomínios, é essencial que a previsão orçamentária seja realista e feita com cuidado, considerando todos os custos envolvidos. Isso garante uma gestão financeira eficaz e o bom funcionamento do condomínio.
Do contrário, haverá consequências negativas, tais como:
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Falta de recursos financeiros
- Atrasos no pagamento de contas
- Falta de manutenção adequada das instalações e serviços comprometidos.
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Aumento da taxa condominial
- Insatisfação e desconfiança dos moradores
- Risco de maior inadimplência
- Processos judiciais por má administração
- Desvalorização do imóvel
4) Não desmembrar o IPTU rapidamente
Sem o desdobro do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), a prefeitura continuará emitindo um único boleto para todo o condomínio. Assim, o cálculo será feito com base no valor do terreno e da construção como um todo, e não individualizado por unidade.
Esse cenário traz algumas consequências, como:
- Valor injusto, possivelmente, mais alto do que o necessário para os proprietários das unidades;
- Impacto no orçamento do condomínio e também das unidades, podendo haver rateios adicionais;
-
Problemas legais e burocráticos
- Não cumprimento das obrigações fiscais;
- Risco de multas, juros e outras penalidades pela prefeitura;
- Tempo e recursos para regularizar a situação junto ao órgão fiscalizador.
- Dificuldade de ser fazer a avaliação correta do imóvel, desvalorizando-o.
5) Demora na obtenção do CNPJ
A demora no processo de abertura do CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) para um condomínio em implantação pode acarretar alguns problemas, como:
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Dificuldades na administração financeira
- Abertura de contas bancárias;
- Recebimento de pagamento dos condôminos;
- Efetuar o pagamento de despesas.
- Contratação de serviços, comprometendo a manutenção e operação do condomínio
- Riscos legais e fiscais com a Receita Federal, por exemplo, acarretando em custos adicionais, multas e atrasos em processos administrativos.
Confira também: Condomínio e síndico em dia com a Receita Federal
6) Ausência de conta corrente própria em nome do condomínio
A conta bancária do condomínio deve ser utilizada exclusivamente para as transações financeiras relacionadas ao condomínio. Ela é fundamental para garantir uma gestão financeira eficiente, transparente e segura.
Dessa forma, utilizar contas pessoais de síndicos ou de terceiros para gerir as finanças do condomínio pode representar um risco de segurança, pois os fundos não estarão devidamente separados dos recursos pessoais.
Sem ter um canal adequado para receber e efetuar pagamentos, aumentam-se os riscos de fraude e má gestão financeira, uma vez que não haverá um controle adequado sobre as transações financeiras do empreendimento.
"Mais do que uma grande confusão contábil da gestão condominial, a principal consequência da ausência de conta bancária própria do empreendimento é a falta de transparência", reforça Roberto Piernikarz, sócio da administradora BBZ .
É a administradora quem conduz essa parte administrativa, burocrática e documental (itens 3, 4, 5 e 6 acima) durante a implantação de um condomínio.
"Parecem tarefas básicas, mas é importante relembrá-las, pois já vi muito condomínio demorar quase seis meses para ter um CNPJ, faturando por aí sem nota fiscal com o nome da construtora ou administradora. Isso não é correto e traz prejuízos para o condomínio", frisa o síndico profissional Renato Alves.
7) Abertura prematura das áreas comuns
De acordo com Renato, outro erro que a gestão comete na implantação de um condomínio é pular etapas do processo, cedendo às pressões tanto da construtora quanto dos moradores.
A construtora quer entregar o empreendimento rapidamente para não ter mais que arcar com a taxa condominial das unidades vazias. Já os moradores estão com aquela ansiedade natural de usar logo o que acabaram de comprar.
O problema disso é abrir os espaços sem nenhum tipo de preparo, como câmeras e regras de uso, afinal, dificilmente já existirá formalmente um regimento interno do condomínio.
Nesse cenário, é comum haver roubo de objetos e equipamentos, vandalismo, etc, causando uma depreciação muito rápida do condomínio.
8) Falta de comunicação próxima e clara com os moradores
Na fase de instalação, é fundamental investir tempo em se comunicar com os moradores, acolhendo e educando-os a viver em comunidade, além de sempre reforçar a eles que esse momento de implantação exige muita paciência.
Roberto Viegas, especialista em mercado imobiliário, entende que as construtoras e incorporadoras poderiam contribuir melhor para essa ambientação dos novos condôminos, muitos dos quais nunca tinham morado em condomínio antes.
"Para eles, muitas situações podem parecer restrição de liberdade ou privacidade, mas que, na verdade, representam o equilíbrio da vida em comunidade, com respeito às regras, às pessoas e muita tolerância", ele ressalta.
Os condôminos são impacientes e não têm tolerância mínima ao se deparar com algumas situações comuns que ocorrem em condomínios em implantação.
Elevador ou portão quebrados momentaneamente, o zelador ainda desconhecer os detalhes de uma área técnica, ou a portaria demorar alguns minutos para liberar o acesso de um prestador de serviço ou uma visita são motivos de queixa dos condôminos.
"Isso sem contar as reclamações por causa do barulho, sujeira, entulho abandonado na garagem e tantas coisas mais", acrescenta Viegas.
Para Renato, além de ter consciência do imóvel que adquiriram (lendo e cumprindo o Manual do Proprietário), os moradores devem colaborar, respeitar as normas estabelecidas, com o objetivo de contribuir para o bom convívio e construção de uma comunidade harmoniosa no condomínio. E a comunicação é a principal aliada nisso.
Nesse primeiro momento, vale a gestão focar comunicações principalmente em relação a:
- Como funciona a vida em condomínio;
- Direitos e deveres dos condôminos;
- Funções do síndico, conselho e administradora;
- Prestação de contas em dia e de fácil acesso para os condôminos.
- Cuidados no controle de acesso;
"Visitantes eventuais, profissionais contratados para obras nas unidades, corretores e potenciais clientes têm de entrar e sair, a não ser que sejam moradores cadastrados. Por isso, o controle do acesso e saída de pessoas deve ter procedimentos desde o primeiro dia", alerta Viegas.
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Principais segredos da gestão de condomínios em implantação
Confira abaixo os segredos para que síndicos e administradoras possam passar pela implantação de um condomínios com sucesso.
PARA O SÍNDICO
1) Manutenção e garantia da construtora
Durante a implantação de um condomínio, o primeiro ponto de atenção no quesito "manutenção e garantia da construtora" é a contratação de um especialista em engenharia para avaliar as áreas comuns do condomínio antes da entrega definitiva da construtora.
Segundo Roberto Piernikarz, da BBZ, somente um especialista em engenharia tem o conhecimento técnico necessário para realizar uma inspeção minuciosa das áreas comuns do condomínio, identificando possíveis problemas estruturais, de instalações elétricas, hidráulicas, defeitos de construção, etc.
"Ele pode, inclusive, orientar o condomínio sobre os seus direitos e ajudar a negociar eventuais correções ou reparos necessários junto à construtora", sinaliza.
Com uma inspeção detalhada, é possível garantir que as áreas comuns sejam entregues em conformidade com as normas e padrões de qualidade esperados. Isso se traduz em durabilidade, prevenção e instalações mais seguras para os usuários.
Uma dica de Roberto Viegas é que o síndico fique atento aos prazos para revisão dos itens pendentes da construção, anotados em vistoria ou com ajuda de um engenheiro, que não podem demorar mais que 60 dias.
Já Renato recomenda que o síndico registre todas as ocorrências realizadas junto à construtora, para produzir todo um histórico de solicitações e estar resguardado com provas.
Em segundo lugar, a manutenção predial deve ser implementada logo nos primeiros dias do condomínio, mesmo que nem todas as unidades estejam ocupadas.
O gestor pode encontrar muitas das orientações de manutenção dos sistemas e infraestrutura do empreendimento no Manual de Operações, Uso e Manutenção das Edificações (áreas comuns) - também conhecido como Manual do Síndico.
Anexo a plantas e projetos, este é um dos documentos mais importantes que devem ser entregues pela construtora. Nele constam todas as informações básicas referente a prazos de garantias, bem como orientações sobre a periodicidade das manutenções preventivas de tudo que está nas áreas comuns, como bombas, elevadores, portões, fundação, etc.
De acordo com a engenheira civil Kelly Ramos, o Manual do Síndico abrange as recomendações presentes em diversas normas, tais como:
- NBR 15.575 - Normas de Desempenho
- NBR 5674 - Manutenção das Edificações
- NBR 14037 - Manutenção, Uso e Operação
- NBR 16.747 - Inspeção Predial
- NBR 16.280 - Reformas nas Unidades
- NBR 17.170 - Garantias
Veja mais: Conheça as principais normas ABNT para condomínios
Assim sendo, sem comprovar esses cuidados, a construtora pode questionar a responsabilidade por qualquer anormalidade nas instalações, recaindo tudo para o condomínio.
Por conta disso, vale guardar as notas fiscais dos contratos de manutenção e outros documentos que ajudem a comprovar que as manutenções foram feitas. Assim, fica claro que a manutenção preventiva foi executada nos moldes apontados pela construtora.
2) Formalize rapidamente as regras
É provável que, enquanto o regimento interno é elaborado, o condomínio já comece a ser ocupado, e isso pode criar um clima de "terra sem lei". Então, quanto mais rápida e precisa for a redação do documento, melhor para síndicos e moradores.
3) Tenha um plano de ação
Estabeleça as diretrizes da gestão para os primeiros 100 dias, com as medidas que garantam uma operação segura para as pessoas e para a edificação.
- Saiba mais: Plano de ação para condomínios recém-implantados
4) Treine muito bem os funcionários
Eles são grandes aliados! Defina as rotinas e tarefas das equipes de portaria, limpeza e manutenção, criando mecanismos de avaliação do desempenho dos funcionários e do tempo de resposta das empresas terceirizadas (se aplicável).
5) Saber se comunicar com condôminos
Na visão de Renato, o síndico tem que ter ciência de que a implantação é um momento delicado, de muita política e sangue frio, pois algo será inevitável: seu trabalho será criticado por muita gente.
A saída sempre é tentar se aproximar dos moradores, mantendo-os constantemente a par dos seus passos, em especial os mais ansiosos.
Adote um canal de comunicação oficial do condomínio, seja por meio aplicativos, como Nok Nox, site da administradora, disparos de e-mails, grupos de WhatsApp, murais nas áreas comuns ou telas digitais nos elevadores.
6) Boa relação com conselheiros
A forte interação entre os condôminos, em geral em grupos fechados de comunicação, e a influência de conselheiros acabam criando uma administração paralela de certa forma.
"É preciso alinhar expectativas. Síndico, conselheiros e moradores devem caminhar na mesma direção. Por isso, o síndico deve definir junto com eles as prioridades, as linhas mestras da gestão e planos de curto, médio e longo prazo. Sem isso, o condomínio passa a caminhar ao sabor do vento", reflete Viegas.
Muitas vezes, os conselheiros querem disputar poder com o síndico, excluindo o gestor de determinadas decisões ou até barrando suas iniciativas. Isso retarda a evolução da implantação.
Essa situação ocorre principalmente no caso do síndico profissional. De acordo com Viegas, o grupo busca reduzir e minar a autonomia do gestor contratado porque, na maioria dos casos, se trata de indicação da incorporadora e por isso, desconfiam se sua atuação diante do condomínio é, de fato, a favor dos interesses dos condômino e não da empresa.
Para Viegas, o síndico pode até compartilhar decisões com os conselheiros, mas não pode se tornar refém deles, devendo ter pulso firme e saber se posicionar.
Procure sustentar uma boa relação com os conselheiros, promovendo reuniões informais periódicas para manter o grupo ciente de suas ações ou quaisquer mudanças no plano de ação.
"Crie aliados nas relações de condomínio por meio do diálogo e evite que a mesa da assembleia separe os presentes em dois grupos, como se todos não tivessem os mesmos objetivos", adverte Viegas.
7) Atendimento em emergências
Esteja sempre preparado para enfrentar e reverter situações críticas, com planos de contingência para questões de segurança, enchentes, falta de energia elétrica, etc.
8) Estimule a boa convivência
Seja um maestro das atividades no condomínio, possibilitando seu uso pleno por todos os condôminos, praticando e pregando a cultura de paz e de respeito às pessoas, nas relações entre condôminos, corpo diretivo e funcionários.
PARA A ADMINISTRADORA
1) Comunicação com condôminos
A administradora precisa ser ágil e transparente nas respostas a todas as dúvidas que tratem, sobretudo, deste assuntos:
- Previsão orçamentária;
- Informação e disparo de boletos de condomínio;
- Pagamento de notas fiscais e de despesas de fornecedores;
- Auditoria;
- Prestação de contas mensal.
Os meios de comunicação podem ser diversos, conforme já mencionados lá em cima.
2) Tarefas financeiras
Foco na arrecadação para assegurar o pagamento dos compromissos do condomínio, inclusive os boletos de unidades não vendidas sob a responsabilidade da incorporadora, e manter um processo de cobrança acessível, sensível e eficiente.
3) Tarefas administrativas
Estabelecer e cumprir prazos de envio de atas e, se possível, enviar comunicados que resumam as deliberações de assembleias, bem como agilizar a obtenção de CNPJ e a transferência para o condomínio de todas as contas de concessionárias e contratos existentes.
4) Mediação: a solução de conflitos de convivência
Conflitos são comuns na fase de implantação. A administradora deve buscar o equilíbrio sobre a velocidade entre as decisões e as ações, os limites do caixa do condomínio, as responsabilidades dos envolvidos e a obediência às leis e à convenção do condomínio.
Fontes consultadas: Roberto Piernikarz (sócio da administradora BBZ); Renato Alves (síndico profissional); Kelly Ramos (engenheira civil) e Roberto Viegas (especialista em mercado imobiliário).