Condômino que efetuava disparos de estilingue sai do prédio
Em julho, foi realizada a desocupação coercitiva do condômino Jin Ho Chang, cerca de 3,5 anos após o caso ganhar repercussão nacional. Processo segue em cumprimento de sentença
Finalmente um dos casos mais icônicos de condômino antissocial teve o tão esperado desfecho. Em julho de 2024, foi realizada a desocupação coercitiva (exclusão) do condômino Jin Ho Chang, que ficou conhecido pela suspeita de dar "tiros de airsoft" de seu apartamento, na cidade de São Paulo.
O caso ganhou repercussão nacional após reportagem exibida pelo Fantástico, da Rede Globo, em janeiro de 2021 (relembre o caso logo abaixo).
Como ele não cumpriu a decisão judicial de desocupação da unidade de forma voluntária dentro do prazo determinado, como parte do cumprimento de sentença do processo, o Oficial de Justiça cumpriu o mandado nº 002.2024/036214-1 de desocupação coercitiva.
No texto da decisão da juiza Marian Najjar Abdo consta:
"a) ficam autorizados o arrombamento e a força policial, se necessários; e b) eventuais bens e pertences deverão ser retirados pelo executado no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de serem mantidos por depositário indicado pelo exequente."
E no texto da certidão do mandado cumprido positivamente, com data de 10 de julho de 2024, o Oficial de Justiça relatou que notificou Jin Ho Chang, na pessoa do zelador do condomínio, em 23 de maio de 2024. E como passou o prazo de 30 dias sem que Chang retirasse seus bens, o oficial retornou ao condomínio e passou a proceder a desocupação do imóvel, retirando os bens e nomeando uma pessoa como depositária.
A execução agora continua para a apuração das multas aplicadas pelo Poder Judiciário, para cada dia de descumprimento da ordem de desocupação voluntária. A defesa do condomínio trabalha no levantamento dos bens de Chang para cobrir o passivo, estimado em R$ 50 mil.
Novo texto do Código Civil prevê expulsão de condômino antissocial
Está em tramitação anteprojeto de reforma do Código Civil com alterações no artigo 1337, que passa a prever a exclusão do condômino antissocial. Há expectativas de que a reforma aconteça ainda em 2024.
Saiba esta e outras propostas de alteração de artigos que afetam os condomínios nesta matéria do SíndicoNet.
Entenda o caso do morador antissocial que teve repercussão no Fantástico
A história ganhou repercussão nacional em janeiro de 2021, quando vizinhos aterrorizados do prédio onde o réu morava e do entorno achavam que ele atirava com arma de airsoft contra janelas dos apartamentos - na investigação, foi provado que ele usava bolinhas de metal e estilingue.
O condômino foi impedido de continuar residindo em sua unidade, segundo a sentença, pela comprovada impossibilidade da convivência em comunidade.
Em primeira instância, a decisão de 30/01/2022, do juiz Renato de Abreu Perine, levou em consideração o reiterado comportamento antissocial do réu Jin Ho Chang, que incluía condutas ofensivas contra o patrimônio e honra de condôminos, tais como:
- disparos de bolinhas de metal com estilingue contra janelas de apartamentos com cachorros;
- ameaça à integridade física dos vizinhos;
- xingamentos;
- arremessos de objetos da sacada;
-
bater com cabo de vassoura no teto e no piso, incomodando as unidades vizinhas;
-
jogar água com mangueira nas unidades de cima, de baixo e térreo.
Como consequência colateral, as atitudes do condômino vinham desvalorizando as demais unidades, deixando o prédio estigmatizado na vizinhança e no mercado imobiliário.
O síndico do condomínio, o administrador Gabriel Abduch, contou que sua família é dona de duas unidades do empreendimento de 120 apartamentos na Vila Andrade, Zona Sul de São Paulo, uma onde ele mora e outra destinada à locação. Devido à "má fama", o imóvel demorou mais de quatro meses para ser alugado.
"As pessoas se interessavam, mas desistiam de alugar ao saber que era o prédio que tinha saído no Fantástico", contou, referindo-se à reportagem veiculada pelo dominical da TV Globo, em janeiro de 2021.
Aliás, nesse dia, a comunidade achou que o caso daria por encerrado e teriam paz finalmente, já que a polícia levou o condômino para a delegacia. Mas foi apenas mais um capítulo na história que se arrastava praticamente desde a instalação do condomínio, há cerca de oito anos.
Condômino antissocial acumulou mais de R$ 20 mil em multas não pagas
Segundo o advogado do escritório que defende o condomínio, João Paulo Rossi Paschoal, foram esgotadas todas as possibilidades que estavam ao alcance do que o síndico poderia fazer de forma extrajudicial para resolver o caso, em apoio às decisões assembleares:
- registros de reclamações formais;
- inúmeros boletins de ocorrência de vizinhos;
- reuniões;
- assembleias;
- aplicação de advertências e multas;
- multas crescentes (art.1337 do Código Civil).
Nada disso resolveu a questão.
"Pelo contrário, serviu de gasolina para que ele piorasse o seu comportamento com atos antissociais. Chegou naquele ponto crítico em que o condomínio não tinha mais o que fazer. Em assembleia, 3/4 dos proprietários presentes decidiram democraticamente pela propositura de uma ação de exclusão do condômino antissocial", explicou o advogado.
Só de multa, o condômino acumulava até março de 2023 em torno de R$ 20 mil das mais de 18 multas aplicadas e não pagas, segundo o síndico Gabriel Abduch. "Praticamente toda semana ele cometia uma infração. Em 2021, o montante chegou a R$ 5 mil".
O réu é, ainda, devedor contumaz das despesas condominiais, e este argumento também foi levantado pela defesa do condomínio para reforçar que outras obrigações não vem sendo cumpridas pelo condômino.
Aliás, Gabriel, que mora no mesmo andar do condômino antissocial, relatou que foi vítima dos surtos do homem.
"Uma vez estava chegando do supermercado com a minha esposa, carregando sacolas, e, sem querer, a porta corta-fogo bateu e fez um barulho forte. Ele veio para cima de mim com grosserias e quase chegou às vias de fato", contou.
Réu argumentava sofrer discriminação racial e perturbação ao sossego
Durante o julgamento, o condômino réu Jin Ho Chang negou conduta antissocial, inadequada ou ilícita, bem como qualquer envolvimento em conflitos com outros moradores que pudessem justificar a medida extrema de sua exclusão do condomínio.
De posse das provas (vídeos) e dos depoimentos das testemunhas, a sentença concluiu inexistência de "qualquer indício de atos de perseguição, por discriminação racial, como foi alegado pela defesa, por parte dos demais moradores".
"As testemunhas foram importantes para conferir realidade ao que foi narrado na petição inicial, de que os atos sociais eram verdadeiros e perduravam no tempo, causando aquele mal estar completo e total a ponto de que certos condôminos abandonaram o prédio e foram morar em outro lugar em função dos problemas sofridos com o réu", explicou Paschoal.
A defesa de Jin Ho Chang recorreu à decisão de primeira instância, mas em março de 2023, o TJ-SP manteve a sentença de exclusão do condômino antissocial do condomínio, em um prazo de 90 dias corridos, sob pena de multa diária de R$ 2 mil pelo descumprimento.
O acórdão, de 03 de março de 2023, negou provimento ao recurso do réu e praticamente liquidou o assunto, mesmo com o caso seguindo o trânsito em julgado.
O morador antissocial pôde recorrer da decisão de segunda instância junto aos tribunais superiores, mas não houve reversão do que foi julgado.
"Tanto no STF (recurso extraordinário) quanto no STJ (recurso especial), a discussão foi somente sobre direitos; não mais sobre provas ou fatos", pontuou o advogado do condomínio na ocasião.
O condomínio esperou findar o prazo para recurso da defesa e começou, então, a execução: retirar o côndomino antissocial do prédio, concluída em julho de 2024.
Limites do direito de propriedade
O advogado João Paulo Rossi Paschoal disse que a decisão engrossa a lista de outras que seguem a mesma linha que reconhece a possibilidade de, em situações limite, impedir o condômino antissocial de morar em sua unidade, desde que respeitados os direitos da ampla defesa ao contraditório.
O amparo que se encontra nessa sentença afronta a função social da propriedade e reconhece a concepção moderna de como se lida com o direito de propriedade.
"O proprietário não pode tudo. Se ele opta em morar em comunidade, o mínimo que se espera é que ele aja respeitosamente, com urbanidade, siga as regras condominiais e não inviabilize a vida de todos. Se fosse seguida aquela linha ortodoxa de que o judiciário não pode intervir em tais situações, os demais condôminos não teriam mais o que fazer, senão tolerar essas ofensas, ameaças e atos antissociais", defendeu Rossi Paschoal.
Como lidar com casos de condômino antissocial?
Morar em condomínio é um exercício de coletividade e de espírito comunitário que nem todas as pessoas cultivam. Para saber mais sobre o tema, o SíndicoNet tem este conteúdo completo sobre condômino antissocial para te apoiar na hora de lidar da melhor forma caso enfrente uma situação do tipo.
Você também pode assistir ao bate-papo com o advogado João Paulo Rossi Paschoal no vídeo abaixo. Nesta live, o especialista dá o passo a passo de como resolver o problema com um condômino antissocial. É só clicar abaixo:
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Fonte: João Paulo Rossi Paschoal (advogado), Gabriel Abduch (síndico), conteúdo SíndicoNet.