Crianças e condomínios
Pequenos são responsabilidade de seus pais, mas podem participar da gestão
Por Alexandre Marques (*)
Em condomínio, uma das coisas que mais atormentam pais e responsáveis por menores de idade é o que fazer com as crianças quando não estão na escola ou em outras atividades e ficam “saracoteando” (como dizia minha avó...), por aí, livres, leves e soltas pelas dependências dos prédios.
Alguns são mais maduros que outros e já possuem um senso de preservar o patrimônio alheio, ou mesmo, já entendem que as áreas comuns e suas dependências não são uma extensão do “playground”, e mesmo essa área, não é uma zona livre de “combate”, onde vale tudo!
Outros, entretanto, como sabemos, são mais “imaginativos”, “audaciosos”, “irrequietos”, verdadeiros “Godzillas” nas dependências do prédio, achando que tudo que está lá, está com um único propósito, diverti-los e desafiar seus limites!
Nesta época de insegurança generalizada que vivemos, muitos pais e responsáveis, não podemos criticá-los, não deixam que seus filhos frequentem clubes, shoppings ou mesmo saiam à rua desacompanhados ou mesmo com “amiguinhos”. Porém, se por um lado isso os protege ou dá uma sensação de segurança, por outro, confina as crianças de uma forma que nem sempre é fácil lidar com o espírito inquieto dos pequenos. Então, o que fazer?
Lembramos que a responsabilidade pela guarda e segurança das crianças em tenra idade é dos pais e responsáveis, e não, do condomínio e seus prepostos, nesse sentido julgado do STJ em Brasília que já enfrentou o tema e assim fundamentou:
Afinal, segundo o regime da lei a responsabilidade civil dos genitores pelos atos dos filhos menores é natural decorrência do poder familiar, do qual lhes resulta o dever de guarda (artigo 1.634 do Código Civil e artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente). Nesses casos há, portanto, presunção “iuris tantum” de culpa, que só é elidida caso se comprove que o fato era inevitável e, por isso, não se podia dizer presente negligência no dever de guarda.
Na linha aqui indicada, aliás, está o entendimento da corte incumbida de ditar a inteligência da lei federal, como exemplifica acórdão do qual se destaca a seguinte passagem:
“A responsabilidade dos pais, portanto, se assenta na presunção juris tantum de culpa e de culpa in vigilando, o que, como já mencionado, não impede de ser elidida se ficar demonstrado que os genitores não agiram de forma negligente no dever de guarda e educação. Esse é o entendimento que melhor harmoniza o contido nos arts. 1.518, § único e 1.521, inciso I do Código Civil de 1916, correspondentes aos arts. 942, § único e 932, inciso I, do novo Código Civil, respectivamente, em relação ao que estabelecem os arts. 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e 27 da Lei n.6.515/77, este recepcionado no art. 1.579, do novo Código Civil, a respeito dos direitos e deveres dos pais em relação aos filhos.” (REsp.nº 777.327-RS, rel. Min. Massami Uyeda, 17.11.2009).”
Esse texto refere-se ao seguinte julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:
9090928-34.2006.8.26.0000 Apelação / Indenização por Dano Moral
Relator(a): Viviani Nicolau
Comarca: São Bernardo do Campo
Órgão julgador: 9ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 29/11/2011
Data de registro: 01/12/2011
Outros números: 4410904000
Ementa: “APELAÇÃO RESPONSABILIDADE CIVIL INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS Pleito deduzido em juízo pelos pais de criança que morreu afogada em piscina do condomínio-réu Improcedência Apelo dos autores Inconsistência do inconformismo - Fato ocorrido quando a piscina estava aberta Utilização das piscinas por menores e crianças acompanhadas ou não de inteira responsabilidade dos pais ou responsáveis segundo previsão expressa do regulamento interno do condomínio Culpa do condomínio pelo evento lesivo não configurada Sentença ratificada nos termos do art. 252 do Regimento Interno desta Corte Negado provimento ao recurso.”(voto 8800). Visualizar Ementa Completa
Por mais chocante que possa parecer a decisão da Justiça, traduz a realidade de que o condomínio não é obrigado a zelar pela guarda e segurança das crianças, essa atribuição é dois pais e responsáveis.
Uma das práticas mais recorrentes é aproximar os pequenos da gestão do condomínio, ganhando a confiança deles, fazendo-os sentirem-se importantes e parte integrantes da comunidade, atribuindo-lhes alguma “responsabilidade”, ainda que mínima e, obviamente, proporcional a sua idade e entendimento.
Por exemplo, criando uma “mini-administração” ou “mini-gestão”, onde os pequenos podem eleger seu “sindico-mirim”, subsíndico e conselheiros, por razões óbvias, quanto mais “participantes” houver deste “mini” grupo de gestão, melhor. E aí a ideia é distribuir estas atribuições com as devidas “responsabilidades”, permitindo que eles opinem e elaborem, por exemplo, uma minuta de regimento interno para uso da brinquedoteca, playground, piscina infantil, sala de jogos e tantas outras coisas. Que eles possam também auxiliar na organização de eventos a serem realizados no condomínio, como dia das crianças, festa junina, “halloween” e tantas outras brincadeiras.
Com os menores participando assim, ativamente, das questões condominiais, sendo supervisionados e orientados por adultos e mesmo profissionais de outras áreas, conseguir-se-á aproximar a gestão verdadeira do condomínio das crianças, tornando esse diálogo muito mais enriquecedor, prazeroso e genuíno, do que, simplesmente, aquela coisa do “síndico” manda e as crianças “têm que obedecer”.
Outro mecanismo a ser usado é criar assembleias-mirins, onde os menores possam reunir-se esporadicamente para discutir questões condominiais de seu interesse, elaborando uma ata a ser distribuída junto a todos os moradores, com os mesmos mecanismos de uma assembleia normal, com eleição de um presidente, secretário, etc. Eles se sentem supervalorizados.
Uma boa ideia também é a criação de um pomar ou horta onde as crianças podem aprender a manusear a terra e o plantio, e, observar as plantas crescendo, junto com seu próprio crescimento.
Todas essas medidas objetivam a integração da criança a vida condominial e o despertar nela de uma consciência futura do que é morar em condomínio e que, seu direito termina onde começa o do próximo, ainda bem! De modo que a criança problema no condomínio de hoje, pode ser a solução para os problemas desse condomínio amanhã. Seja você síndico e leitor um formador dessa opinião, divulgue essa ideia!
(*) Alexandre Marques Advogado militante Consultor em Direito Condominal; Colunista SíndicoNet; Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil; Especialista em Processo Civil pela ESA e Direito Imobiliário pelo UniFMU; Relator do Tribunal de Ética da OAB/SP , Diretor de Ensino da Assosíndicos (Associação de Síndicos de Condomínio Comerciais e Residenciais do Estado de São Paulo); Conferencista da OAB/SP, CRECI e SECOVI/RO; Sindicato dos Corretores de Imóveis de São Paulo, Conferencista convidado pela Faculdade Dois de Julho - Salvador/ BA, no curso de Pós-Graduação, Co-Autor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação”, Editora Saraiva, Articulista de vários meios de mídia escrita e falada.