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André Junqueira

Da ilegalidade praticada pelo CRA-RJ

Ofícios foram enviados para condomínios edilícios os intimando a se registrar no CRA

05/07/19 06:00 - Atualizado há 5 anos
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Ofícios foram enviados para condomínios edilícios os intimando a se registrar no CRA

Por André Junqueira*

Antes de adentrar o assunto que tem gerado perplexidade no segmento condominial fluminense, é relevante destacar a importante função dos Conselhos Profissionais.

Assim como Engenharia, Medicina, Contabilidade, Advocacia e muitas outras profissões, o Conselho Profissional de Administração, representado em âmbito federal pelo Conselho Federal de Administração (CFA) e estadualmente pelos Conselhos Regionais de Administração (CRA), tem a importante função, como autarquia federal especial, de contribuir e proteger a atividade do profissional de Administração.

Parte desse trabalho é o de fiscalizar o exercício ilegal da profissão

Na atuação dos CRAs, devemos ressaltar dois aspectos que possuem pertinência com o tema deste artigo. O primeiro é a dificuldade de se enxergar limites claros entre a carreira do administrador e outras profissões. Em nossa opinião, conhecimentos de gestão são tão necessários para qualquer profissão como é o domínio da língua portuguesa no Brasil.

O segundo é a quase absoluta dependência que os Conselhos têm em programas de computador que buscam em bases de dados públicas por CNPJ, CNAE (Cadastro Nacional de Atividades Econômicas) ou simples palavras que fazem parte dos objetos sociais de empresas registradas.

Ou seja, se uma palavra ou código do Conselho surgir na pesquisa, a pessoa jurídica é notificada, sem qualquer investigação adicional. Apesar dos softwares serem vitais para as atividades de fiscalização de qualquer Conselho, sua utilização sem análise termina sendo um desserviço à entidade e à sociedade.

Os dois elementos acima mencionados resultam na grave ineficiência e, como concluiremos, ilegalidade de determinados atos de fiscalização do Conselho.

Também é de algum valor citar que os Conselhos Regionais de Administração têm voltado sua atenção para empresas que administram condomínios e prestam serviços de síndico profissional. 

O segundo caso é bem mais recente, pois a figura do síndico profissional ou síndico externo (nomenclatura mais adequada) somente se disseminou nos últimos anos e há pouco tempo, tivemos a oportunidade de debater o assunto no “webinar” promovido pelo portal SíndicoNet A regulamentação do Síndico Profissional e o CRA

Enfim, há poucas semanas, o CRA-RJ enviou ofício padrão para um número indeterminado de condomínios que dizia, em resumo e em tom imperioso:

  • Ter o CNAE nº 8112-5/00 – CONDOMÍNIOS PREDIAIS obriga todos os condomínios a se registrar no Conselho como “pessoa jurídica”;
  • a fundamentação legal de tal obrigação está expressa no Art. 15 da Lei 4.769/65, no Art. 12 do Decreto nº 61.934/67 e no Art. 1º da Lei nº 6.839/80;
  • o condomínio tem 15 dias corridos a partir do recebimento do ofício para se registrar como empresa utilizando o “Pré-cadastro de Empresa” que existe no site https://sistemacrarj.com.br;
  • caso o condomínio não atenda ao prazo, estará sujeito à lavratura de auto de infração.

Pois bem, o CRA-RJ não poderia estar mais equivocado. Um condomínio não é dotado de personalidade jurídica e nem autonomia patrimonial. Juridicamente, o que se confere ao condomínio é uma personalidade jurídica funcional, apenas para que ele pratique determinados atos. 

Por essa razão, um condomínio pode se cadastrar no CNPJ, contratar prestadores, funcionários etc. Condomínio edilício é apenas uma alegoria jurídica que é utilizada para que os condôminos administrem suas partes e interesses comuns.

Em outras palavras, o condomínio é dotado de existência limitada para tão somente praticar atos de administração de patrimônio dos seus titulares, condôminos.

Assim também é com o espólio (nome dado à massa de bens de pessoa falecida até a sua partilha) e a massa falida (nome dado a todos os bens, materiais e imateriais, de empresa falida até a satisfação de seus credores. 

Pode-se até cogitar que a pessoa física ou jurídica que administra um condomínio, espólio ou massa falida tenha que ter algum registro profissional, mas não o instituto em si.

É como se uma imobiliária, devidamente registrada no CRECI (Conselho Regional de Corretor de Imóveis), tivesse o imóvel que intermediou e administra, e não ela mesma, notificado pelo Conselho – o bem imóvel e não a empresa.

Ora, se um condomínio edilício (residencial ou não) serve para administrar as partes comuns pertencentes aos condôminos, estar-se-ia enquadrada na atividade de “administração de imóveis próprios”.

E nesse caso, a jurisprudência majoritária do Tribunal Regional Federal da 2ª Região é contrária aos interesses do CRA-RJ, como se pode ver nos julgados a seguir:

 

“0005895-40.2018.4.02.5101 (TRF2 2018.51.01.005895-5) Ementa: ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO CÍVEL - CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO - REGISTRO DE EMPRESAS- ATIVIDADE BÁSICA - ART. 1º DA LEI Nº 6.839/80 - OBJETO SOCIAL - HOLDING "PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL DE OUTRAS EMPRESAS" E ATUAÇÃO NO RAMO IMOBILIÁRIO - ATIVIDADES NÃO ATINENTES À LEI Nº 4.769/65 - VERBA HONORÁRIA MAJORADA - ARTIGO 85, § 11, DO NCPC - ENUNCIADO 7 DO STJ. - O registro no respectivo Conselho, bem como a aplicação de penalidades, só se torna possível em decorrência da atividade básica exercida pela empresa, ex vi do art. 1º da Lei nº 6.839/80. - O fato de uma empresa ser ou não uma holding não é determinante para fins de registro junto ao Conselho Regional de Administração. Tal excepcionalidade, destarte, afigura-se prescindível ao deslinde da presente controvérsia, centrada que está na verificação da atividade básica desenvolvida. - Como não se encontra a empresa apelada constituída para promover a prestação de serviços técnicos de administração a terceiros, mas a "participação no capital de outras empresas" e " administração de imóveis próprios", atividades estas que não guardam relação com as definidas na Lei nº 4.769/65, não há que se cogitar de sua sujeição à fiscalização operada pelo CRA/RJ. - Verba honorária majorada para o percentual de 12% (doze por cento) sobre o valor da causa, a teor do art. 85, § 11, do NCPC, c/c Enunciado Administrativo nº 7 do STJ. - Recurso não provido.” (grifa-se)

Bastaria ler os artigos que o próprio ofício menciona para que se chegue à conclusão de que não há possibilidade de enquadramento do condomínio edilício no Conselho Profissional.

Pelo Art. 12 do Regulamento inserido no Decreto Federal nº 61.934, a inscrição se aplica às sociedades de prestação de serviços profissionais. É muito difícil crer que o CRA-RJ não consegue distinguir um condomínio, instituído e Registrado no Cartório de Registro de Imóveis de uma sociedade empresária, instituída e registrada na Junta Comercial local.

Ao encaminhar ofício despido de qualquer base legal, ameaçando condomínios de autuação, o CRA excede sua prerrogativa de fiscalizar e abusa de seu direito (art. 187 do Código Civil Brasileiro). O ato do CRA não é nada diferente de qualquer cobrança indevida e abusiva, devendo, se for o caso, ser responsabilizado por todos os danos, morais e materiais, decorrentes de sua conduta. 

O dano mais facilmente verificado são as despesas que condomínio já contraiu para a resposta ao ofício do CRA, que se recomenda ser feita por advogado, tendo em vista seu teor jurídico, especialmente se tiver que se defender de autuação (aplicação de multa) ou, pior, de uma execução fiscal movida pelo Conselho.

Melhor seria que o CRA-RJ admitisse seu equívoco, como um bom gestor faria. Porém, não se retratando, o Conselho apenas confirma a suspeita de que o que deseja é ampliar sua arrecadação e não fortalecer a carreira de Administração. Resta apenas a esperança que o CRA-RJ não persista no erro e não promova qualquer autuação de condomínios.

Por fim, conclui-se que o CRA-RJ deve ser respondido formalmente pelos condomínios, de preferência, através de seu jurídico, utilizando-se de protocolo eletrônico no site indicado no próprio ofício.

A resposta deve contestar de forma completa o descabido ofício do CRA-RJ, deixando claro que o condomínio (seja residencial, não residencial ou misto) não explora atividade econômica e sua estrutura administrativa, conforme preceitua o Código Civil Brasileiros a partir do art. 1.331, visa apenas seu funcionamento puro e simples. 

(*) Professor, advogado com mais de 14 anos de experiência e autor do livro “Condomínios – Direitos & Deveres”.

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