Doação de morador ao condomínio não é tão simples assim
Ainda que ação do condômino seja bem-intencionada, assunto requer debate em assembleia
Por Jaques Bushatsky*
Nas assembleias de condomínio são resolvidas questões importantes. Dentre elas, relevantíssima, a destinação do dinheiro dos condôminos: gastar como e em quê? As alocações de recursos não são fáceis de definir, mas é assim mesmo, afinal, administrar é definir prioridades, nunca existe dinheiro disponível para tudo.
Em que investir? Em um novo brinquedão, na nova mobília para o hall de entrada, na reforma do piso da quadra?
Às vezes existe a vontade (redecorar o salão de festas, por exemplo), mas isso emperra na insuficiência de meios e, de outro lado, na inconveniência, mesmo que momentânea, de votar novos rateios. Prefere-se direcionar os valores disponíveis para outras premências.
Mas, às vezes, algum condômino desejoso da solução de determinado item quer doar o valor; quer pagar pela aquisição. Para ele, mais vale um gosto que um tostão no bolso, se tiver que pagar sozinho por algo que será de todos, que assim seja, ficará feliz. É possível?
Nada impede que alguém, um condômino, doe valor ou bem ao condominio. Doação é a transferência de bens ou vantagens por uma pessoa, de seu patrimônio para o de outro. Em nosso direito, se a doação for de pequeno valor, pode até se realizar verbalmente, bastando que a transferência seja feita imediatamente. Este costuma ser o caso em condomínios.
Pois bem. É legalmente viável que alguém doe e que o condomínio receba a doação. Mas isso não significa que o doador possa obrigar o condominio a receber o valor nem que possa impor a realização disso ou aquilo.
Como a doação é um contrato bilateral, ele somente se aperfeiçoará com a aceitação pelo donatário, lembrado que o silêncio significará a aceitação. Logo, se o condomínio não quiser o valor, ou se não quiser realizar aquilo desejado pelo coador, poderá rejeitar a doação.
Como se define se o condominio aceitará ou rejeitará a doação e mais, se regularmente se disporá a realizar o desejado pelo doador, caso a doação seja feita com algum encargo?
Essa definição se atingirá exatamente como são decididas todas as demais questões condominiais, em assembleia, na qual o único aspecto diferente consistirá no conforto de não haver busca pelos valores e rateios, eles estarão disponíveis graças ao doador.
Assim, a realização das obras dependerá dos votos de 2/3 dos condôminos se voluptuárias ou se forem acrescer as já existentes em áreas comuns com o fito de lhes facilitar ou melhorar a utilização; da maioria do voto dos condôminos se as obras forem úteis; da unanimidade dos condôminos, se falar-se da construção de novo pavimento ou da alteração da destinação de área comum; e assim por diante.
Sim, mesmo que haja o dinheiro (o que usualmente é um problema enorme nos condomínios), é essencial que os condôminos deliberem sobre a obra, a instalação ou a aquisição em foco.
E, evidente, é preciso que os condôminos deliberem sobre a aceitação da doação. Isso precisa ser lembrado, os condôminos avaliarão se querem, mesmo, assumir a situação de favorecidos, por certo nem sempre há consenso sobre isso, valendo lembrar que tecnicamente, o favorecido será o condominio, e não diretamente o condômino.
Mas, pode haver entrave a receber, empecilho decorrente da análise de quem é o doador, qual é a situação que cerca a doação, e assim por diante. Ao contrário do que alguns imaginariam à primeira vista, a realidade é que nem sempre se quer ou se deve receber algo gratuito, afinal.
Enfim, nada impede legalmente a doação, mas esse contrato somente se concretizará se houver a concordância do condomínio, ao qual cumprirá a definição, em regular assembleia.
(*) Jaques Bushatsky é advogado; pró-reitor da Universidade Secovi; sócio correspondente da ABAMI (Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário para S. Paulo); coordenador da Comissão de Locação do Ibradim e sócio da Advocacia Bushatsky.