Eleições 2022: Manifestações políticas em condomínios
Ouvir jingles de candidatos, panelaços, bandeiras nas sacadas, distribuição de santinhos podem ser práticas passíveis de advertência e multa. Veja os limites
A vida em condomínio tem se tornado cada vez mais um celeiro de novidades. Em especial, a partir do isolamento social em que fomos obrigados a nos recolher em nossas casas, e aquela unidade habitacional que por vezes era usada apenas como um dormitório, tornou-se um local onde as pessoas passaram a conviver diariamente por horas a fio, tendo que treinar seu senso comum forçosamente.
As relações de vizinhança, antes relegadas aos cumprimentos no elevador, de certa maneira se estreitaram e daí surge um olhar mais detido sobre identidade de ideias, valores, gostos e inclusive de escolhas políticas.
Ocorre que muitas vezes, as manifestações de pensamento político livre – direito constitucionalmente garantido –, acabam por incomodar os vizinhos e demais moradores de um condomínio.
O questionamento que se faz é: Qual o limite para manifestação política em um condomínio?
Pois bem. Refletindo sobre tal questão, ainda mais neste momento fervilhante de debates políticos em razão das eleições, sabe-se que os ânimos se exaltam.
Por isso, cabe ao síndico entender como agir e estabelecer regras para que haja harmonia na convivência daqueles que defendem posicionamento político diverso.
Alguns pontos que emergem dessa questão:
1) Ouvir constantemente em som alto jingles de candidatos
Em linhas gerais, ouvir música em rádio, celulares, assistir televisão são hábitos comuns. O que se discute é se isso se torna um incômodo para o sossego e descanso dos demais moradores.
Se o condômino quiser se valer do seu direito de ouvir o que quer que seja dentro de sua unidade, isso não pode incomodar os demais vizinhos, mesmo que não ocorra no chamado “horário de silêncio”, pois quando se trata de perturbação de sossego não há hora para que isso ocorra. Se um condômino de fato extrapolar do seu direito, e prejudicar os demais vizinhos, de acordo com as regras internas do condomínio, poderá ser advertido e multado.
ATENÇÃO! O síndico deve se pautar em reclamações fundamentadas e com provas para que não chame para si uma discussão da qual não terá como demonstrar futuramente.
2) Bandeira de partido e candidato na sacada
Muito comum durante o período de eleições que alguns moradores se sintam no direito de pendurar nas suas sacadas propaganda de partidos políticos e candidatos. Muitos condôminos acreditam que por se tratar de uma questão transitória tal atitude não causaria nenhum prejuízo a fachada do condomínio.
Porém, é importante ressaltar que a legislação em vigência é clara no sentido de que nenhum morador pode alterar a fachada do prédio, sendo que a colocação de adornos pode assim ser considerada. Algumas decisões judiciais têm entendido que, sem autorização de assembleia, não é permitida a colocação de bandeiras, mesmo que de forma transitória.
No entanto, se o condomínio decidir em assembleia sobre tal possibilidade, durante o período das eleições, não haverá por parte da gestão possibilidade de repreender quem assim agir.
A melhor alternativa é a discussão dessa situação numa assembleia onde todos possam opinar e definir pela possibilidade ou não de que os condôminos assim agirem. E ainda, se aceitarem tal colocação de bandeiras na fachada, que se determine o tempo em que podem permanecer, pois assim ninguém saíra prejudicado.
3) Panelaço e apitaço
Tem se tornado comum, quando do pronunciamento de algum político em rede nacional, que se faça barulho de panelas batendo e apitos como forma de repugnância àquele que está falando em rede nacional.
Esse é um tema complexo, pois de um lado se tem o direito da livre manifestação do pensamento; e de outro, o direito do bem-estar e paz social na vida em condomínio.
Deve-se analisar antes de punir quem participa do panelaço, qual a duração, o grau de repetição e a intensidade desse barulho, evitando-se, assim, que a conduta do síndico se transforme numa proibição de manifestação política.
Do outro lado, se o morador abusa do direito de se manifestar, competirá o síndico advertir e em caso de reincidência, aplicar a multa. Por isso, é uma análise que deve ser feita do caso em concreto.
4) Distribuição de “santinhos” e propaganda política nas dependências do condomínio
O Código Civil nada trata sobre tal proibição. Importante que se verifique se a convenção e/ou o Regimento Interno do condomínio faz menção a essa situação.
Em não havendo qualquer regulamentação interna nesse sentido, se a situação chegar num ponto de trazer incômodo aos demais vizinhos, é necessária a convocação de uma assembleia para definir os aspectos dessa propaganda política, e dessa forma, o síndico evita adotar medidas que possam ser consideradas uma afronta à liberdade de manifestação política.
Abordados os principais pontos que envolvem tais questões, chega-se à conclusão de que caminham no mesmo patamar de direitos fundamentais a manifestação política e o direito de viver plenamente em sossego na sua propriedade.
Assim, cabe à gestão do condomínio trabalhar com transparência, convocando os moradores para um diálogo. Dessa forma, impede que o momento de discussões políticas não se torne uma questão que venha trazer problemas internos e disputas desnecessárias aos vizinhos.
Na política, temos adversários de ideias e propostas; não inimigos. Pensem nisso!
(*) Advogada e mestre em direitos fundamentais.