Enquete ou assembleia? Apenas uma tem validade jurídica
Entenda as diferenças de finalidade de cada formato e veja qual deles vale perante a lei
Por Jaques Bushatsky*
É enorme a quantidade de questões acumuladas desde a pandemia, avolumando-se as dúvidas, afinal, ninguém tinha experiência/conhecimento sobre o mal que nos afligiu. Como lidar com o assunto?
Cientistas e médicos manifestaram suas divergências, pessoas anunciadas como boas administradoras experimentaram desastres – quando não a terrível inação – e até findaram agindo de maneiras criminosas. Nesse panorama, é de se entender que síndicos de condomínios tenham vivenciado perplexidades (não percamos a perspectiva de que a maior parcela dos síndicos é formada por pessoas bem-intencionadas, dispostas e dedicadas, mas nem sempre treinadas para a administração).
Mencione-se, mesmo antes da pandemia do coronavírus, se apresentavam (sempre ocorreram) situações e temas que geravam incertezas ao síndico e, para sanar hesitações pontuais, foram crescentemente incrementadas as enquetes. Talvez melhor façamos ao abandonarmos por instantes esse galicismo, optando pelo vocábulo “sondagens”, termo que melhor expressa o significado dessa ação de indagar, apurar.
São sondagens de opinião, levantamentos, pesquisas. Bastante práticas para sanar dúvidas, resolver dilemas pontuais: qual a opinião sobre a segurança no prédio? A limpeza? O atendimento pelos empregados? O que você acha da organização do uso das quadras esportivas? Contente com a sua vaga de garagem?
A sondagem de opinião poderá indicar a necessidade de providências pela administração do condomínio. Por exemplo: apreciável quantidade de condôminos manifesta descontentamento com o estado do playground. Ato contínuo, zelando pela prestação dos serviços de interesse dos condôminos (como dispõe o artigo 1348 – V, do Código Civil), o síndico deverá consultar técnicos, colher orçamentos e projetos para finalmente levá-los à deliberação em assembleia.
Sim, a pesquisa pode indicar ideias, insatisfações, sugestões. Mas, somente na assembleia de condôminos (devidamente convocada) é que serão profundamente debatidas e votadas as questões, serão definidos os investimentos, as obras e assim por diante, respeitado o quórum legal para cada situação.
O apego à legalidade é essencial, exatamente para que as decisões sejam tomadas adequadamente – e tenham validade. Nem mesmo ratificações posteriores, em situações em que não se tenha alcançado o quórum legal, são admitidas, exatamente porque, como ensinou o Ministro Massami Uyeda “a assembleia, na qualidade de órgão deliberativo, é o palco onde, sob os influxos dos argumentos e dos contra-argumentos, pode-se chegar ao voto que melhor reflita a vontade dos condôminos...” (STJ, RESP 1.120.140, julgamento: 06/10/09).
Em suma, se cuida de distinguir com lucidez a forma adequada de agir: para auscultar opiniões, se fazem pesquisas, sondagens, enquetes; para tomar decisões, se fazem assembleias.
(*) Jaques Bushatsky é advogado; pró-reitor da Universidade Secovi; sócio correspondente da ABAMI (Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário para S. Paulo); coordenador da Comissão de Locação do Ibradim e sócio da Advocacia Bushatsky.