Por estruturas mais seguras
Fausto Perreto orienta os administradores de edifícios a respeito das principais medidas a serem tomadas para manter a segurança das estruturas
O engenheiro civil estrutural Fausto Rafael Perreto tornou-se, recentemente, o primeiro e único profissional de Ponta Grossa a receber e fazer uso do selo de qualidade e excelência, oferecido pelo CREA-PR a engenheiro e arquitetos. O engenheiro explica quais os requisitos básicos de um bom profissional, e traça os principais problemas que podem levar um edifício a ruir.
Jornal da Manhã: Há quanto tempo o senhor trabalha como engenheiro civil?
Fausto Rafael Perreto: Estou formado há 6 anos. Embora isto não condiz com a vivência que tenho em obras. Meu pai e meu irmão mais velho, dentre outras atividades que exercem, são construtores. Portanto, desde a minha infância sempre estive em contato direto com a construção civil, literalmente colocando a mão-na-massa. E isto foi de extrema importância: em um primeiro momento para eu decidir o que iria fazer pelo resto de minha vida (exercer engenharia após formar-se) devido ao fascínio que a construção de edificações já naquela época exercia sobre mim, e depois pela bagagem que adquiri ao longo daqueles anos, desenvolvendo uma visão prática e crítica das obras, como relativo aos problemas que dia-a-dia surgem nos canteiros de obra e de que forma podemos resolvê-los e até mesmo precavê-los.
JM: Qual a importância de obter o direito de fazer uso do selo de qualidade e excelência, oferecido por um programa do CREA-PR? De que forma conquistou essa vantagem? Que valor esse selo oferece em seu trabalho?
Perreto: O CREA-PR está de parabéns por esta iniciativa, ele está desenvolvendo um Programa chamado Programa de Excelência, que tem por objetivo valorizar e destacar os profissionais (pertencentes a este conselho) mais capacitados que atuam em nosso estado. O programa baseia-se em aulas à distância e presenciais com avaliações de desempenho. Ao término das aulas e avaliações positivas ganhei o direito de submeter um projeto estrutural de minha autoria a avaliação de uma banca examinadora. Meu projeto foi aprovado, então passei a ser o primeiro e até a presente data, o único profissional da cidade a ser certificado por este programa. Atestando que realizo a elaboração de projetos estruturais com competência, ética, legalidade e alto grau de exigência. Com isto passei a poder fazer usar do selo de qualidade e excelência em meus projetos. Creio que isto se trata de um grande diferencial em meu trabalho, comprova toda a seriedade e comprometimento com que trato a atividade de elaborar projetos estruturais de engenharia.
JM: Diante de alguns casos recentes de desabamento de edifícios no País, qual o senhor acha que é o maior problema envolvendo a segurança de estruturas? Falta de fiscalização, falta de capacitação dos profissionais em obras, uso de materiais de qualidade inferior...?
Perreto: Realmente é lamentável o que estamos presenciando. Nos últimos tempos estamos acompanhando fatos horríveis. Edificações de norte a sul do país estão entrando em colapso, ruindo e levando junto com elas a vida de muitas pessoas. As edificações que tem a função de abrigar e proteger tornam-se constantes ameaças.
Podemos relacionar uma série de deficiências que direta ou indiretamente, com maior ou menor influência tem contribuído para estes acontecimentos. É preciso um esforço urgente e conjunto de toda a sociedade para que possamos minimizar ao máximo novas tragédias como as que têm ocorrido com cada vez maior freqüência. As universidades e faculdades precisam aumentar a qualidade e principalmente atualizar os conhecimentos que procuram transmitir aos seus jovens, sobretudo da parte prática. Os profissionais que optam exercer a engenharia precisam estar cientes de que esta profissão envolve uma responsabilidade desmedida, é imprescindível fazer nosso trabalho fazendo uso das melhores técnicas e de todo nosso conhecimento. Conhecimento este, que deve estar em constante expansão e atualização. Os empreendedores/contratantes devem conscientizar-se que, em média o custo a ser pago pelos projetos de uma edificação é de 5% do custo global desta obra (estimado em função do CUB; desde que não existam pavimentos tipo). Engenheiros projetistas que se submetem a cobrar valores menores são inexperientes tentando firmar-se no mercado ou são engenheiros desqualificados, desatualizados e inconseqüentes. Ambos incapazes de fornecer um projeto seguro, correto, atento as normas pertinentes, adequado e que gere racionalidade e economia com relação ao uso dos materiais de construção. A sociedade precisa entender que obras seguras, sólidas, precisam de um tempo adequado para serem construídas. Os prazos a que a engenharia está se submetendo estão cada vez mais exíguos e nocivos. Os proprietários devem ser temerários ao intervir em suas construções, é necessário consultar um engenheiro habilitado e principalmente capacitado. Os administradores de edifícios, síndicos devem procurar por ajuda profissional para que seu imóvel passe por inspeções, vistorias e manutenções (preventivas e corretivas) periódicas.
JM: Além de exames periódicos por parte de especialistas, que sinais podem fazer com que uma pessoa comum perceba problemas graves numa estrutura?
Perreto: Uma estrutura desde que corretamente projetada, saliente-se bem isso, apresenta ductibilidade, isto é, sofre razoáveis plastificações e deformações antes de seu colapso. Fissuras, trincas, armaduras de aço expostas, florescências de materiais, deslocamentos, infiltrações, deformações, vibrações, recalques e em última instância, inclusive estralos são sinais de que algo está fora do normal, reitero, contem com o auxílio de um engenheiro estrutural capacitado para uma análise cuidadosa e criteriosa.
JM: Em Ponta Grossa temos algumas estruturas bastante antigas, principalmente na área mais central da cidade. Uma casa desmoronou recentemente sobre carros estacionados e, há alguns anos, houve um prédio que desabou na Rua XV de Novembro. Como evitar que coisas assim se repitam? Qual é a orientação aos proprietários que desejem realizar uma reforma?
Perreto: Prédios desabam quando: são mal projetados; quando são construídos sem obedecer à boa técnica da engenharia e/ou as prescrições dos projetos; quando os materiais empregados são de resistência e qualidade inferior ao que deveriam ser; quando a edificação encontra-se em local perigoso sem que se tenham sido tomadas as medidas cabíveis para contornar este inconveniente e/ou quando as inspeções e manutenções não são feitas de forma correta.
Os proprietários que querem fazer uma reforma devem contratar um engenheiro capacitado. Dispomos nosso conhecimento à sociedade para que tudo transcorra de maneira adequada e saia tudo a contento. Em hipótese alguma, deve-se, por exemplo: demolir uma parede sem consulta e auxílio de um profissional. Caso contrário, pode-se avariar, desintegrar elementos essenciais de estruturação e as conseqüências podem ser catastróficas. Mesmo quando as paredes deveriam ser apenas elementos de vedação, dependendo do processo construtivo empregado ou se porventura existirem problemas estruturais, elas indevidamente, ajudam na sustentação da edificação. Não só a demolição, mas também perfurações em pilares, vigas e lajes para passar dutos e tubulações podem acabar comprometendo a estrutura. Vale lembrar também que a mudança de ocupação do imóvel, acréscimo de paredes ou fechamento de varandas e sacadas pode causar sobrepeso na estrutura.
JM: De quem é a responsabilidade de fiscalizar a segurança de edifícios? Existe uma verificação constante, ou depende do convite do proprietário?
Perreto: As construtoras e imobiliárias devem fornecer aos proprietários, uma espécie de manual para manutenção de edificações (procedimentos necessários) conforme consta nas Normas NBR 5674:1999 e NBR 14037:1998, de autoria da Associação Brasileira de Normas Técnicas. Estas Normas dizem, detalhada e didaticamente o que deve conter o Manual de cada obra, desde a descrição de sua construção, com os resultados do Controle e a Certificação da Qualidade do empreendimento, seguindo pela descrição dos componentes que dependem de manutenção, com garantias, procedimentos, prazos e métodos para a realização de inspeções e manutenção. E salienta: diz que tudo isto “é compromisso da Administração do Prédio que deve contratar um engenheiro responsável” para realizar estes serviços, de uma forma sistêmica e permanente, com planejamento, orçamento e etc. Portanto, estes planos de manutenção devem ser incorporados (pelos administradores e síndicos dos edifícios) às rotinas de uso e ocupação dos empreendimentos.
Vale citar uma lei de evolução de custos, conhecida como Lei de Sitter, ela mostra que os custos crescem segundo uma progressão geométrica de razão 5. Isto significa que a cada R$ 1 que deixamos de “gastar” (na verdade investir) em medidas adotadas na fase da elaboração dos projetos de edificações, iremos gastar 5 vezes mais em medidas adotadas extra-projeto tomadas durante a execução da obra ou iremos gastar 25 vezes mais em medidas de manutenção preventiva durante os três primeiros anos da edificação ou 125 vezes mais em medidas de manutenção corretiva efetuadas após surgimento dos problemas. Isto prova que precaver sempre é a melhor solução. Por isso a fase de elaboração dos projetos é extremamente importante e deve ser cuidadosamente concebida por profissionais respeitáveis e íntegros.
JM: O grande crescimento do ramo imobiliário vem exigindo uma fiscalização mais atenta? É preocupante o uso de materiais de qualidade inferior e a pressa na conclusão de projetos?
Perreto: Nos últimos tempos “o negócio da construção” está em alta, inclusive pela visibilidade e ênfase positiva que as mídias têm dado ao setor. Em função disso, foram atraídas pessoas que não eram do ramo, a exercer alguma atividade ligada à construção civil, isto é perigoso! Tenho visto edificações de pequeno porte estarem sendo muito mal feitas, seguramente apresentarão problemas futuros! As patologias da engenharia normalmente não aparecem do dia para a noite, irão surgir a médio e longo prazo! Atualmente, praticamente todos querem construir abaixo de um prazo natural. O concreto, por exemplo: é um material que necessita do tempo adequado para ganhar resistência e conferir a segurança adequada. Os prazos precisam ser revistos, costumam estar muito apertados. A data de entrega da obra jamais deve ser reduzida por ganância, e as obras públicas não podem estar condicionadas seu término com base em interesses políticos.
JM: Casas e edifícios estruturados em aço vendo sendo mais utilizadas? Quais as vantagens e desvantagens desse modelo?
Perreto: Edificações estruturados em aço vem com o passar dos anos abocanhando uma fatia maior do mercado, embora este crescimento não me parece expressivo. Algumas das vantagens são: é uma estrutura mais leve (comparada ao concreto armado) o que resulta em um peso próprio menor, aliviando as fundações; é um tipo de estruturação mais flexível, permite intervenções/modificações de maneira mais prática e rápida; a estrutura metálica dispensa o escoramento, reduzindo a área do canteiro de obras e ocorre uma redução do prazo da obra. Mas ainda apresenta no Brasil um custo elevado, proibindo o seu uso em larga escala. Além disso, temos uma forte tradição em concreto armado, devido a ser um material muito versátil e suas técnicas de execução serem razoavelmente dominadas em todo o país. Desde a queda das torres gêmeas, em Nova Iorque (World Trade Center) as estruturas metálicas, que se apresentavam como a solução mais viável para edifícios de enorme porte, estão sendo questionadas. Aqueles edifícios foram atingidos pelos aviões, seguidos de enormes explosões, agravadas fortemente pelo combustível que eles continham. As temperaturas atingidas foram elevadíssimas, e isto acarretou o colapso de vigas e pilares metálicos. Caso a estrutura fosse em concreto armado, com toda certeza o tempo entre o impacto dos aviões e a queda dos edifícios seria estendido, o que possibilitaria salvar uma quantidade maior de vidas, das pessoas que ocupavam o prédio e não tiveram tempo de abandoná-lo antes do desabamento.
JM: Mencione em poucas linhas um breve currículo seu. Você é natural de Ponta Grossa? Onde estudou? Que cursos adicionais fez? Quais trabalhos de maior importância gostaria de destacar?
Perreto: Sou natural de Ponta Grossa-PR. Obtive minha formação acadêmica também aqui, na UEPG. Trabalho atualmente, em escritório técnico próprio, com a elaboração de projetos estruturais em concreto armado e projetos de fundações. Desde a universidade sempre foquei minha atenção na engenharia estrutural, inclusive fiz meu trabalho de conclusão de curso voltado à área de estruturas, com a orientação do excelente professor Engº Nelson Madalozzo. Há pouco tempo, fui enaltecido com o direito de usar o selo de qualidade e excelência em meus projetos. Cada trabalho em que tive a oportunidade de me dedicar apresenta sua importância, posso citar: residências de alto nível em condomínios fechados (Colina dos Frades, La Défense, Villa Vicenza), edifícios comerciais (abrangendo: lojas, escolas, restaurantes/casas noturnas) e residenciais, construções agro-pecuárias, reservatórios de armazenamento de grandes volumes de água, muros de contenção e muros de arrimo etc. Totalizando dezenas de milhares de metros quadrados projetados estruturalmente e acompanhados executivamente. Obras estas, localizadas tanto em Ponta Grossa, como em outras cidades e estados, podendo destacar: Ipiranga-PR, Maringá-PR, Itapeva-PR, São Paulo-SP etc. Quero fechar a entrevista re-envindicando um apelo dos engenheiros projetistas capacitados e capazes: eles devem ser valorizados e remunerados conforme sua capacidade, responsabilidade e nível de projeto ofertado. Vou sintetizar com uma frase de autor desconhecido, que merece reflexão: “Dificilmente haverá alguma coisa que alguém não possa fazer pior e cobrar um pouco menos. As pessoas que só consideram preço são suas merecidas vítimas!” É fato comprovado que, a justa remuneração de engenheiros projetistas capacitados é totalmente viabilizada pelos ganhos decorrentes de seu trabalho.
Fonte: http://www.jmnews.com.br
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