Garagem X Propriedade nos Condomínios Edilícios
Tratar de garagem em condomínio é sempre polêmico
Por Cristiano de Souza*
Compreender que morar em condomínio é viver com regras de convivência conhecidas e definições não tão conhecidas, mas existentes, não é fácil. Principalmente se temos a ideia de que toda a propriedade tem um caráter absoluto com as seguintes características:
- Direito de fruição do imóvel, podendo do mesmo tirar vantanges, tais como o uso e ocupação do bem em toda a sua extensão, profundidade e altura (CC, art. 1.229);
- Direito de transformar o bem, modificando ou alterando no todo ou em parte, inclusive destruindo sua destinação;
- Direito de alienar o bem, por qualquer dos meios existente na lei.
Felizmente as doutrinas mais atualizadas, envolvendo o Direito Civil com uma visão Constitucional, ao definirem propriedade em Condomínio Edilício esclarecem que a mesma lei que garante ao proprietário o caráter absoluto da propriedade, tal qual vista acima, o restringe reconhecendo uma propriedade exclusiva inserida em uma propriedade maior e coletiva, cujo conjunto denominamos Condomínio.
A restrição imposta, em favor de uma coletividade, é inserida no condomínio edilício desde sua instituição, quando se define a destinação de cada unidade (residencial, comercial, mista, industrial, entre outras), conforme artigo 1332 do Código Civil, passa pelos direitos e deveres dos condôminos, previstos nos artigos 1335 e 1336 do mesmo Código Civil e chega inclusive ao uso das garagens previstos no artigo 1338 da mesma lei, entre outros exemplos, das quais destacamos o respeito as limitações físicas de áreas e o respeito as normas internas do condomínio.
Surge assim a razão de não ser possível utilizar a vaga de garagem para guardar móveis, material de obra, ou até motos junto com carros, quando, por exemplo, as normas internas do condomínio definem ser a área de vaga de garagem exclusiva para guarda de um veículo.
A jurisprudência se divide, ora aceitando a infração a regra, ora conferindo as normas do condomínio a gloria que merece tal documento por ser algo decidido coletivamente, sendo esta posição a maioria das decisões atuais, até porque, nas decisões contrarias as regras, geralmente temos fundamentações com conceitos antigos de propriedade e principalmente, interpretações equivocadas da propriedade em condomínio em uma espécie de defesa própria pelo uso irregular, cercados por descaso e considerações de que condomínio seria algo de menor importância. Tais questões desrespeitosas a legislação, geram grande tumulto na vida e administração condominial, pois a permanência de uma moto, por exemplo, em uma vaga de garagem que já possui um carro, ainda que nos limites da área, quando a convenção proíbe, gera uma instabilidade à sociedade e em especial a coletividade condominial, pois discussões referentes a responsabilidade por danos causados pela moto ou na moto fatalmente chegam as portas do judiciário, tendo como decisões tanto a responsabilidade do condomínio como sua isenção.
Outro ponto é o seguro condomínio que sempre seguirá o que a documentação determina, ou seja, “não paga pois não podia estar lá a moto”. Tais decisões, SMJ, nos parece um desserviço a Sociedade e ao Estado.
Outro ponto polêmico sobre este mesmo assunto, e que já tratamos anteriormente nesta coluna, é o tamanho dos carros em face do espaço físico, quase sempre desrespeitados por mero deleite do proprietário que ao comprar um veículo, diferente do que faria em uma casa, se esquece de medir sua vaga de garagem, desrespeitando o seu próprio interesse em morar em condomínio e ser respeitado em seus direitos.
As Restrições à propriedade são aplicadas ao condomínio edilício, em razão de uma garantia de estabilidade de se morar sem preocupação, de forma organizada, sem exceções, individualismo ou egoísmos, buscando-se atingir o fim social da propriedade, que tanto se menciona e apregoa na Constituição Federal.
Por conclusão lógica, em qualquer solução de conflitos condominiais, deveria o Poder Judiciário dar prevalência aos direitos da coletividade condominial e não aos interesses de um único condômino, por mais respeitáveis que sejam, sem esquecermos que a regra é sempre o cumprimento das normas, e a exceção a infração cometida.
Fica assim uma reflexão sobre a propriedade, tanto para quem quer morar em condomínio, como para quem julgar causas em condomínio, cabendo ao síndico além de um farto diálogo, providencias imediatas caso perceba excessos.
(*) Dr. Cristiano De Souza OliveiraAdvogado, Consultor Jurídico Condominial e Sócio Consultor da DS&S Consultoria Condominialcdesouza@aasp.org.br / cdesouza@adv.oabsp.org.br