Em Salvador, inadimplência em condomínios chega a 30%
Mais de três mil ações de cobrança
A crise econômica que assola o país tem feito com que muitas pessoas precisem fazer um verdadeiro malabarismo na hora de pagar as contas que se acumulam mês a mês. No entanto, na hora de elencar as prioridades, geralmente a taxa de condomínio acaba ficando em segundo plano, seja por conta do baixo valor cobrado pela multa de atraso, 2%, ou pelo condômino muitas vezes considerar que é mais fácil, posteriormente, negociar a dívida junto ao síndico ou a administradora do condomínio.
Mas, tal atitude já faz com que a inadimplência nos condomínios de Salvador esteja na casa dos 10%, segundo o presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais do Estado da Bahia (Secovi-Ba), Kelsor Fernandes.
“Eu acredito que a tendência ainda seja de mais aumento. No entanto, se for além disso, chegando a ficar entre 15% e 25%, não tem como administrar. A não ser que o síndico convoque a assembleia e comece a cobrar de quem paga em dia, a cobertura, o que ninguém vai aceitar”, contou.
Trabalhando há mais de 20 anos no ramo, o dono da ACS Administração de Condomínios, Jurandyr Machado, diz que a média de inadimplência dos empreendimentos que a empresa faz a gestão é de 18%, mas que há casos de locais em que mais de 30% dos condôminos estão em dívida. “Temos um condomínio de 756 unidades com uma inadimplência alta. Se você tem uma expectativa de receita prevista de R$ 151 mil, a gente acaba recebendo na faixa de uns R$ 100 mil a 110 mil. Mas, claro que ela não é cumulativa, por que, se fosse assim, não teria condomínio que resistiria”, salientou.
De acordo com Fernandes, a atual momento que o país atravessa acaba justificando esse aumento. “Estamos passando por um problema na nossa economia, o desemprego está começando a crescer e, infelizmente, onde as pessoas cortam primeiro a despesa é no condomínio. Logicamente, o que ele vai priorizar inicialmente é a alimentação e o bem estar da sua família”, analisou.
Mais de três mil ações de cobrança
Mas, às vezes, a inadimplência chega a tal tamanho que não tem jeito: acaba sendo necessário que o síndico ou a administradora do condomínio precise recorrer a Justiça na tentativa conseguir com que o condômino pague o que deve. De acordo com dados do Secovi-Ba, até junho deste ano, existem mais de três mil ações de cobrança de despesas condominiais em andamento. A média de 2015 é de 592 processos por mês, contra 628 no ano passado e 607 em 2013. Ou seja, a perspectiva é de que este número seja ultrapassado.
No entanto, tanto para o presidente do Sindicato, quanto para administradores e síndicos, a recomendação é de que a Justiça seja apenas acionada em último caso, quando todas as formas de negociação estejam esgotadas. Síndico de um edifício no bairro do Imbuí, Ivan Chastinet, diz que não é interessante para o condomínio ter que chegar a este ponto.
“É sempre bom negociar com o devedor, principalmente a forma como ele vai poder pagar o débito. Apenas não abrimos mão das taxas e multas que ele tem.
No mais, a gente aqui faz de tudo para que não precise acionar a justiça”, disse. Ele citou uma situação de um antigo morador do local que teve de vender o apartamento para saldar as dívidas após fracassadas tentativas de negociação.
Atualmente, segundo ele, entre oito e dez dos 48 apartamentos – o síndico está isento de pagar a taxa – estão inadimplentes por lá.
Para Kelsor Fernandes, o síndico tem que ser mais atuante na hora de fazer as cobranças.
“Eu acho que, por exemplo, no primeiro mês, se o condômino atrasou 10, 15 dias, o síndico já tem que notificar, de forma civilizada, que a pessoa está prejudicando o condomínio e está no aguardo do pagamento. No segundo mês, ele tem que ser mais incisivo na cobrança. Mas, se ele perceber que a pessoa não responde, não tem outra via: o jeito é colocar o devedor na justiça. Do contrário, sua gestão pode ficar inviabilizada”, destacou.
Há ainda a figura do chamado condômino reinadimplente, que faz um acordo para pagar uma dívida já existente, mas deixa de pagar as atuais taxas do condomínio onde mora. “Aí fica complicado, por que vai chegar a um momento em que ele vai deixar de pagar as duas coisas e teremos que acioná-lo novamente. O problema é o tempo que leva para se resolver isso no Juizado de Pequenas Causas. É muito relativo, podendo levar de seis meses até dez anos”, destacou Jurandyr Machado, da ACS.
Legislação não autoriza corte de serviços a condôminos devedores
Apesar disso, os entrevistados discordaram em pontos como, por exemplo, a forma de punição ao condômino devedor, com a não utilização de serviços comuns aos moradores do condomínio como salão de festas ou quiosque.
“Eu sou a favor do que a legislação determina, que é a proibição do corte de serviços a moradores inadimplentes, a não ser àqueles que se tenha uma dificuldade para dialogar”, disse Fernandes.
“No nosso caso, os que estão devendo só não tem acesso a salão de festas ou algum serviço que necessite do pagamento de taxas e necessita de reservas para sua utilização. Isso tudo desde que esteja em convenção do condomínio”, falou Machado. Atitude semelhante é adotada no edifício em que Chastinet é síndico.
Há alguns anos, uma situação polêmica chamou a atenção no Espírito Santo. Depois de dois meses sem pagar a taxa de condomínio, a moradora de um prédio que tem apenas um apartamento por andar foi surpreendida ao ver que o elevador não mais parava nele.
O caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que decidiu em favor da condômina devedora, e ainda ganhou R$ 10 mil por danos morais. Na decisão, a ministra Nancy Andrighi alegou que o elevador é essencial para que a moradora exerça seu direito de propriedade.
Outro ponto divergente é com relação à inclusão do nome do condômino em programas de proteção ao crédito como o SPC e o Serasa. “Nós geralmente fazemos isso após três meses de atraso”, disse Ivan Chastinet.
Segundo Kelsor Fernandes, isso, em alguns casos até faz com que o devedor procure o síndico para resolver as pendências que ele tem junto ao condomínio. Por outro lado, Jurandyr Machado, discorda. “Nós não recomendamos isso e já tivemos problemas, quando um condômino devedor acabou entrando na Justiça e ganhou R$ 12 mil”, comentou.
E no caso de se colocar o nome das pessoas devedoras no mural, o procedimento está correto? “Isso nenhum sindico deve fazer, pois não há respaldo legal e o administrador pode ser responsabilizado por isso. O que aconselho é que ele coloque o número dos apartamentos que estão pagando em dia.
Automaticamente, as pessoas vão saber quem não está pagando”, falou o presidente da Secovi. Nos condomínios administrados pela ACS, o procedimento realizado é semelhante. “Apesar de que há advogados que dizem, inclusive, que você pode até colocar os apartamentos que não pagaram, desde que os nomes não sejam mencionados”, citou o dono da administradora de condomínios.
Por fim, os entrevistados disseram que, por viver em uma comunidade, as pessoas precisam criar uma maior consciência já que, quando elas deixam de cumprir determinadas regras, como o não pagamento da taxa de condomínio, acabam prejudicando a todos os que moram no local, além dele próprio.
“Acho que o diálogo e a negociação tem que ser sempre praticados para que as contas do condomínio não fiquem fortemente complicadas. Além disso, um eventual conflito acaba gerando, entre o condômino e o sindico, uma indisposição”, finalizou Fernandes.
Fonte: http://www.tribunadabahia.com.br/
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