Relação entre a PEC das Praias e os condomínios à beira-mar
A PEC das Praias aquece o debate sobre aqueles condomínios à beira-mar que restringem o acesso da população a essas áreas, que na verdade, são públicas.
Recentemente, iniciou-se a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que trata das áreas à beira-mar, conhecida como “PEC das praias”. Muito se debateu sobre vários aspectos dessa proposta, incluindo impactos ambientais, ocupação desordenada e, sobretudo, a limitação do acesso público às praias.
O objetivo deste artigo não é detalhar a proposta, mas sim, trazer para o debate a situação atual do acesso público às praias, especialmente em relação aos condomínios que têm acesso à faixa de areia.
Segundo a legislação atual, as praias são bens públicos da União, de uso comum do povo, assegurando a todos o livre acesso a elas e ao mar. No entanto, na prática, é comum que condomínios sejam construídos à beira-mar, limitando o acesso da população a essas áreas.
Situações como essa já foram amplamente analisadas em processos judiciais em que se discute a ilegalidade na construção de muros, cancelas, portarias e outros meios de obstrução ao acesso público.
Em um desses processos, o Tribunal Regional da 4ª Região determinou que um condomínio residencial em Celso Ramos (SC) removesse todos os obstáculos como portões e cercas, que impediam o único cesso à praia e a circulação de veículos.
No caso desse município, uma das praias podia ser acessada apenas por meio da residência de um morador. Abaixo tem-se o relato da dificuldade que isso gerava aos populares:
“Em alguns casos, é verdade, o modo privativo com que os ocupantes se fazem de donos do bem de uso comum do povo salta aos olhos. Na Praia do Marcelo, por exemplo, o único acesso possível é através da residência do Sr. Marcelo, e tal acesso está obstruído por muros e portões, além de diversos cães de guarda que atacam qualquer pessoa que ultrapasse os portões ou que se aproximem com embarcações pelo mar, tal fato já é frequente conforme pode ser notado pelo Boletim de Ocorrência, correm histórias entre os moradores locais que muitas pessoas já foram afugentadas inclusive a tiros pelo próprio Sr. Marcelo.”
Situações como essa são frequentes e demonstram a falta de medidas concretas por parte dos municípios para impedir essas irregularidades.
Por outro lado, os condôminos também possuem direitos fundamentais, como o direito à segurança. Em algumas situações judicializadas, os julgadores decidiram pela manutenção dos muros e portões para resguardar a segurança dos moradores, mas ponderaram que o acesso público deveria ser permitido mediante a identificação dos pedestres que desejassem entrar no local.
Trata-se de solução equilibrada que atende tanto aos interesses da população, quanto dos condôminos, sem comprometer a segurança destes.
Assim, a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) das praias surge em um cenário onde já se observa, de fato, a restrição irregular ao acesso público às praias devido à ocupação privada e construção de obstáculos por parte de condomínios à beira-mar
Nota-se que o texto da Lei é claro ao afirmar que as praias são bens públicos, no entanto, na prática, os entes responsáveis por garantir a execução da lei pecam em assegurar esse direito fundamental à população.
A "PEC das praias" insere-se nesse contexto de falhas na implementação das normas existentes, evidenciando a urgência de medidas mais eficazes para evitar a ocupação desordenada e a restrição indevida do acesso público às praias.
(*) Graziela Rosa é advogada especializada em Direito Imobiliário e membro ativo do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário. Atua nacionalmente em casos condominiais, tanto extrajudiciais quanto judiciais. Palestrante e articulista na área. Siga o perfil do instagram: @grazielarosa.adv