Por Alexandre Marques (*)
É mais do que sabido que imóveis de um ou dois dormitórios, principalmente em “flats” ou “apart-hotéis”, localizados no mais das vezes na zona sul de São Paulo e nos centro de quase todas as principais cidades do País, são muitas vezes locados para pessoas que o utilizam para prostituição ou sua exploração.
Como deve a equipe diretiva do condomínio agir nessa hora? Como coibir ou proibir esta prática, sem incorrer erros que poderão levar a ações de danos morais e patrimoniais contra o condomínio, se mal conduzidas?
O imóvel foi locado, ponto pacífico. Não adianta mal dizer o locador, a imobiliária, corretor, enfim, quem quer que seja que intermediou ou facilitou a locação. Poderia-se argumentar que o locador tem o dever - o mesmo se aplica a imobiliária - de averiguar previamente a conduta do inquilino e que, não fazê-lo é meio caminho andado para essa malsinada locação. É verdade.
Mas, quem garante que uma ficha de crédito limpa, ausência de antecedentes criminais, são, por si só, suficiente para garantir que pessoa que está locando é de boa índole, conduta e costumes? No mais das vezes o locador também é vítima de um engodo, não supunha que a unidade seria utilizada para tal fim, e, depois de locada, vê-se na mesma situação difícil de livrar-se do inquilino problemático.
Essas pessoas, no geral, apresentam fiadores falsos ou mesmo pagam seguro fiança, honrando seus compromissos com locadores, quando não o fazem antecipadamente.
E, de repente, da noite para o dia o condomínio começa a ser mal frequentado, com um movimento de “visitantes” bem maior que o usual, pessoas que chegam para visitar a unidade “x”, sem saber, muitas vezes o nome da pessoa que lá reside, etc. Isso, como sabido, coloca em risco a segurança dos demais moradores, mesmo dos funcionários, riscos patrimoniais, e toda a sorte de crimes que pode-se imaginar. A prática da prostituição e o comércio de drogas, quase sempre andam de mãos dadas.
Nessa hora, detectada a prática o mais adequado é o síndico, acompanhado de duas testemunhas, procurar a pessoa ocupante da unidade condominial e indagar de suas atividades no imóvel, do visível número de visitantes e, desconfiando que algo está errado tomar as providências devidas. Digo desconfiando, porque em alguns casos a pessoa quando indagada revela abertamente sua atividade e diz estar em seu direito! (pelo menos assim o imagina!)
Confessada ou constatada a prática da prostituição nas dependências do condomínio, passa-se ao segundo passo que é a tentativa de se coibir ou mesmo proibir tal prática.
Como se sabe a prostituição no Brasil não é crime. A sua exploração, favorecimento, manutenção de casas de tolerância, ofensa ao pudor, ato obsceno, etc. essas sim, são práticas delituosas associadas a prostituição.
Portanto, não adianta ir à delegacia de polícia mais próxima para “denunciar” o fato a autoridade policial de plantão, que pouco poderá ou quererá fazer. Deve a equipe diretiva adotar atitudes e medidas eficazes para combater a prática, como?
Pode começar exigindo do locador que constada a desnaturação de finalidade da locação ou da prática de atividades que destoam da utilização que se espera do imóvel, este, ingresse com a devida ação judicial contra o inquilino objetivando a extinção da relação locatícia, com a correlata retomada do imóvel. Se não souber quem é o locador, buscar a informação junto à imobiliária responsável pela locação.
Qual a base para rescisão contratual daquela locação? O descumprimento por parte do inquilino das normas condominiais contidas na convenção e regimento interno (Inciso X do Artigo 23 da Lei 8.245/91). Quase todas as convenções trazem em seu bojo a previsão que é defeso aos condôminos portarem-se de maneira ofensiva ou que possa macular o bom nome do condomínio, contrária aos bons costumes, etc. O não atendimento a tais preceitos, caracterizam a infração ao ato-regra que é a Convenção, com base no dispositivo legal acima mencionado, logo, infração contratual passível de autorizar a rescisão daquela relação.
Além disso, o Código Civil em seu artigo 1.336, inciso IV determina aos condôminos:
Art. 1.336. São deveres do condômino:
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.
Nesse passo, a expressão “condômino” é mais abrangente contemplando igualmente o mero possuidor.
Claro que nessa altura dos acontecimentos o condomínio para ajudar o locador, já providenciou a devida carta de advertência pela conduta inapropriada do ocupante da unidade, quando não, já multou o possuidor e o proprietário, etc.
Então, pode o locador mover a ação devida objetivando a rescisão da locação.
Entrementes até que isso se efetive ou na ausência daquela providência por parte do locador (e se ele se recusar a fazê-lo o condomínio pode acioná-lo judicialmente, denunciado a situação e requerendo ao juiz que obrigue-o a rescisão contratual), extrajudicialmente pode ainda a gestão condominial adotar as seguintes providências: criar um controle de portaria anotando, nome, RG, CPF, endereço e telefone de todos os visitantes que adentrem o condomínio, pode parecer uma medida ineficaz, mas, muitos dos frequentadores destes locais, quando veem-se obrigados a tal número de informações, sentem-se constrangidos e, por vezes, retiram-se.
Pode ainda, colocar vários avisos bem sinalizados de que as áreas comuns (halls sociais, entradas, portaria e elevadores) estão sob gravação de imagens, isso, certamente ao mal intencionado causa constrangimento.
Se com essa medida dois ou três desistirem de sua empreitada delituosa o condomínio já conseguiu uma primeira vitória.
Pode ainda orientar os porteiros a informar que a moradora da unidade “x” que estão procurando mudou-se ou não está no momento. Certamente que corre-se o risco da medida ser confrontada pela pessoa junto a ocupante da unidade, mas, em sua defesa o funcionário pode desculpar-se informando que se “enganou”...
Ora, são mais meia dúzia de indivíduos que irão se retirar, sem confrontar a informação com a parte interessada e, com isso...mais um ponto para os condôminos em geral.
Sei que a essa altura alguns leitores devem estar recriminando essa orientação e pensando tratar-se de uma medida ilegal ou que, no mínimo represente um risco a massa condominial. Porém, acredite os fins justificam os meios quando existem situações como estas, em que o condomínio terá que se desincumbir, em juízo, de provar suas alegações, lidando com uma pessoa que fará de tudo para encobrir seus atos. Há de se ter criatividade para se lidar e achar soluções para algumas situações que ocorrem no dia-a-dia condominial, sob pena de assim não sendo, com base somente nas previsões legais de 1964 (Lei 4.591) e do atual código civil, não se conseguir abarcar todo o rol de possibilidades contempladas pela mente humana.
O condomínio pode estar contando uma pequena “mentirinha”, mas, a pessoa que está sendo, em tese, prejudicada também o está, afirmando não fazer o que faz, sendo que todos sabem a verdade. Ou não?
Pode-se ainda, pesquisar junto aos próprios frequentadores qual o nome de “guerra” digamos assim da profissional do sexo e, pesquisar-se na internet se existe algum anúncio de sua atividade com o endereço do condomínio. Nós mesmos já conseguimos flagrar uma situação dessa, quando contratados por um condomínio para resolver tal questão. E isso é prova a ser usada em eventual ação judicial.
O intuito de todas essas medidas é restringir ao máximo o acesso destas pessoas estranhas ao condomínio a unidade daquela pessoa, causando-lhe, por óbvio, um prejuízo financeiro por impossibilitar suas atividades e, trazendo-lhe tais dificuldades a pessoa pode achar que está na hora de se mudar daquele local e buscar um espaço menos “regulado”, digamos assim.
Sim, pois, diante de tantas dificuldades e inúmeros desgastes com a equipe diretiva, moradores, administradores, locador, imobiliária, etc., a pessoa pode chegar a conclusão de que morar ali naquela condomínio não é a melhor opção, mudando-se simplesmente, já tivemos a possibilidade de testemunhar tal fato.
O que não deve a equipe diretiva fazer é escrever em cartas, notificações, mencionar em assembleias que a pessoa da unidade “tal”, exerce aquela atividade, ofendendo lhe a honra, a moral, pois, ela poderá utilizar-se de todos os “escritos” para judicialmente prejudicar o condomínio.
Deve-se evitar ao máximo a judicialização da questão, pois, ainda que se enquadre a postura da possuidora como antissocial (Artigo 1.337 do Código Civil), multando-a em até dez cotas condominiais e requerendo sua exclusão em juízo do seio daquela comunidade condominial, não há nenhuma garantia de provimento estatal ao pleito e mais a única certeza é que, eventual ação judicial, transmutar-se-á em verdadeira batalha jurídica, arrastando-se por anos.
Claro que uma ação como esta de multar a unidade em dez cotas, poderá compelir o proprietário do imóvel a mover a desejada ação de rescisão contratual de locação em face da indesejada inquilina, porém, ainda assim, poderá a questão arrastar-se por anos. Até porque, como cediço a multa por infração ao regimento interno e a convenção pode ser cobrada do locatário e do locador.
A tentativa de solução deve ser prioritariamente extrajudicial. Deve sim, a equipe diretiva buscar o apoio de um advogado, de seus administradores, para que possam orientar, coordenar e executar as medidas necessárias para coibir tal prática ou, no mínimo, incomodar o suficiente para que a pessoa desista de seu Desiderio naquele local e...boa sorte!
(*) Alexandre MarquesAdvogado militante Consultor em Direito Condominal; Colunista SíndicoNet; Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil; Especialista em Processo Civil pela ESA e Direito Imobiliário pelo UniFMU; Relator do Tribunal de Ética da OAB/SP , Diretor de Ensino da Assosíndicos (Associação de Síndicos de Condomínio Comerciais e Residenciais do Estado de São Paulo); Conferencista da OAB/SP, CRECI e SECOVI/RO; Sindicato dos Corretores de Imóveis de São Paulo, Conferencista convidado pela Faculdade Dois de Julho - Salvador/ BA, no curso de Pós-Graduação, Co-Autor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação”, Editora Saraiva, Articulista de vários meios de mídia escrita e falada.
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