Quórum assemblear para destituição do síndico
Alexandre Marques responde a dúvidas com base em entendimentos jurisprudenciais
Por Alexandre Marques*
Uma das questões que mais suscita dúvida entre os leitores do Síndiconet e mesmo entre administradores, síndicos profissionais e advogados, é a correta aplicação do quórum para destituição do síndico em assembleia especificamente convocada para tal fim.
Como regra geral o Artigo 1.349 do Código Civil, determina: “A assembleia, especialmente convocada para o fim estabelecido no § 2o do artigo antecedente, poderá, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, destituir o síndico que praticar irregularidades, não prestar contas, ou não administrar convenientemente o condomínio.”
Surge da leitura do texto legal a primeira dúvida: “...pelo voto da maioria absoluta de seus membros...”, o que é maioria absoluta? Essa maioria é da totalidade dos condôminos do empreendimento imobiliário? Ou apenas dos presentes na assembleia?
Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça em acórdão paradigma da lavra do e. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO (RECURSO ESPECIAL Nº 1.266.016 - DF (2011/0165343-2), o quórum em questão medir-se-á pelos presentes em assembleia, a conclusão de faz com escólio na doutrina e na analogia da interpretação dos demais artigos do Capítulo VII do Código Civil. Reproduz-se parte do julgado:
“Nesse sentido o entendimento do e. Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Francisco Eduardo Loureiro (in Código Civil Comentado, doutrina e jurisprudência, Cord. Ministro César Peluso, 5. ed., Barueri: Manole, 2011, p. 1.409), para quem "a maioria absoluta é dos presentes à assembleia, metade mais um das frações ideais dos condôminos aptos a votar, salvo se a convenção dispuser contagem por critério diverso".
J. Nascimento Franco (in Condomínio, 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 69), do mesmo modo, afirma que "o quórum para a destituição, segundo o art. 1.349, é a maioria dos membros da assembleia e não da massa condominial" . Por outro lado, também em uma interpretação teleológica da norma, a aprovação da destituição pela maioria dos presentes na assembleia melhor se justificaria.
Com efeito, a Assembleia Geral é o órgão máximo do condomínio, pois é através dela que se manifesta a vontade da coletividade dos condôminos. Daí a necessidade, portanto, de serem prestigiadas as deliberações tomadas pela maioria dos presentes na assembleia, sobretudo considerando o inexpressivo comparecimento de condôminos nas reuniões assembleares que a prática revela.
Nesse sentido, pertinentes as considerações feitas pelo pelo e. Desembargador Teófilo Caetano no julgamento do Agravo de Instrumento n.º 20100020065604, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que, interpretando o artigo 1.349, entedeu que "[...] as deliberações serão tomadas pela maioria dos condôminos que efetivamente participam dos negócios sociais, vez que não se afigura razoável a consideração, para fins de aferição da maioria, os condôminos que optam por manterem-se alheios à condução da entidade condominial.
Ademais, verifica-se que, com o advento do Código Civil de 2002, a destituição do síndico passou a ser necessariamente motivada...”
Portanto tome-se como quórum adequado o da maioria dos presentes na assembleia, ou seja, 50%+1 dos condôminos ou assemelhados nos termos da lei habilitados e aptos ao voto.
O Tribunal de Justiça de São Paulo em consonância com a corte Superior assim julgou caso análogo:
4012300-21.2013.8.26.0405
Relator(a): Kenarik Boujikian
Comarca: Osasco
Órgão julgador: 12ª Câmara Extraordinária de Direito Privado
Data do julgamento: 29/05/2015
Data de publicação: 01/06/2015
Ementa: Apelação. Condomínio. Destituição de síndico. 1. O quórum para a destituição do síndico de condomínio, segundo o art. 1.349 do Código Civil, é a maioria dos membros presentes na assembléia, e não dos condôminos existentes. 2. Omissis. Recurso do Condomínio provido. Recurso de José Renato Martins Gonçalves não provido. Visualizar Ementa Completa
Por fim, chama-se a atenção para a regra geral do Artigo 1.353 do mesmo diploma legal que determina: “Em segunda convocação, a assembléia poderá deliberar por maioria dos votos dos presentes, salvo quando exigido quórum especial.” Como se vê, quando houver a necessidade da aplicação de um quórum diverso daquele da maioria dos presentes na assembleia, a lei, expressamente fara menção a ele, a exemplo do que se têm nos artigos: 1.333, §2º,1.336, 1.337, §, 1.341, I e II, 1.342, 1.343, 1.351, 1.352, 1.355 (para convocação da assembleia pelos condôminos).
Superada a questão, outra dúvida recorrente é: E se a convenção do Condomínio expressamente trouxer o quórum de 2/3 (dois terços) do voto dos condôminos presentes a assembleia, a exemplo do regulado no §5º do Art. 22 da Lei Especial nº 4.591/64? Qual dos quóruns deve prevalecer? O previsto no artigo de lei do Código Civil ou o da Lei Especial, respeitado o instituto do ato jurídico perfeito (inciso XXXVI do Art. 5º da Constituição Federal e §1º do Art. 6º da Lei de Introdução ao estudo das normas do Direito Brasileiro)?
Salvo raríssimos entendimentos jurisprudenciais (mais antigos, ainda que sob a égide do ordenamento civil em vigor), deve prevalecer o quórum previsto na convenção do condomínio se sua redação for anterior ao Código Civil que entrou em vigor em Janeiro de 2003. Nesse sentido duas ementas de jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo:
1003917-84.2017.8.26.0011
Classe/Assunto: Apelação Cível / Administração
Relator(a): Campos Petroni
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 27ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 13/11/2018
Data de publicação: 14/11/2018
Ementa: em Condomínio edilício. Ação declaratória de nulidade de assembleia geral extraordinária. Quórum especial para desconstituição de síndico que não teria sido atendido. R. sentença de procedência, com apelo só da requerida. Quórum previsto na Convenção condominial (2/3 do total das unidades) que diverge do previsto no art. 1.349, do Cód. Civil (maioria absoluta dos presentes). Prevalência do estipulado na convenção, editada antes da vigência do Cód. Civil. Desatendimento das regras previstas pelo próprio Condomínio que eivaram o ato de nulidade. Intelecção do art. 252, do Regimento Interno deste Tribunal. Decisum mantido na íntegra. Nega-se provimento ao apelo da ré.
E mais:
Apelação. Ação Declaratória de Nulidade de Assembleia Condominial. Condomínio Edilício - Assembleia Geral Extraordinária convocada com a finalidade de destituição do síndico - Alegação de insuficiência de quórum e cerceamento de defesa - Sentença de improcedência - Apelo do autor - Convenção de Condomínio anterior ao Código Civil de 2002 estabelecendo quórum de 2/3 - Prevalência da Convenção sobre o Código Civil - Quórum insuficiente - Sentença reformada. Apelo provido. (TJSP; Apelação 1006327-13.2015.8.26.0100; Relatora: Maria Cristina de Almeida Bacarim; Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 31ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/06/2018; Data de Registro: 28/06/2018).
Assim, resumidamente: a. o quórum para a destituição do síndico em assembleia, como regra geral é o da maioria absoluta dos presentes hábeis ao voto, ou seja, 50%+1 dos condôminos na reunião assemblear; b. quando a convenção do condomínio for anterior ao código civil atual e trouxer previsibilidade expressa de quórum diverso, prevalecerá esse quórum, geralmente referenciado como 2/3 dos presentes na mesma reunião, regra da lei especial 4.591/64.
O ideal, como todos sabemos é evitar ao máximo a destituição do síndico que, se ocorrer deverá sempre ser motivada e é, em última análise o ato mais gravoso que pode ocorrer na seara administrativa e operacional do condomínio, por vezes com graves consequências.
(*) Alexandre Marques é consultor, advogado militante e professor na área de direito condominial; Mestrando pela FADISP, Coordenador do curso de Pós-graduação em Direito Condominial da FAAP/SP, especialista em Processo Civil pela PUC-SP, com cursos de extensão em Direito Imobiliário e Direito Civil; membro da Comissão de Direito Condominial do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário), palestrante do Departamento de Cultura e Eventos da OAB-SP; coautor do Audiolivro: “Tudo o que você precisa ouvir sobre Locação” (Editora Saraiva) e Autor do livro “Legislação Condominial: aplicação prática”; articulista dos programas “Metrópole Imobiliário” da Rádio Metrópole FM; “Edifício Legal” da rádio CBN-RO , “A hora do povo” da rádio Capital-SP e “Dito e Feito” da Rádio Nacional; sócio-diretor da Alexandre Marques Sociedade de Advogados.