O que você prefere: redução de despesas ou valorização patrimonial?
Os desavisados se apressam em optar pela redução das despesas. Não estão errados em querer isso, claro, mas estão errados em achar que essa é a escolha mais vantajosa

Eu poderia ficar aqui fazendo mil elucubrações sobre teorias financeiras mirabolantes que justificam a escolha mais acertada. Mas vou optar por contar uma história e por compartilhar um fato sobre empreendedorismo e criação de empresas. Parece que uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas, no final, você vai entender.
Vou começar por um fato sobre a criação de empresas que muitos brasileiros têm dificuldade em entender. Você sabe para quê um empresário cria uma empresa? Para ganhar dinheiro e viver dela? Para servir a sociedade? Para ficar famoso? Não! É PARA VENDÊ-LA!
E por que isso? Porque ao criar uma empresa do zero, fazê-la crescer e se valorizar, o maior ganho desse empresário geralmente ocorre quando ele a vende a terceiros.
Muitas vezes, mais do que a soma de todos os lucros líquidos obtidos durante todos os anos da gestão da empresa. Isso é chamado de equity, algo que muitos brasileiros têm dificuldade de entender, pois uma boa parte não sabe gerir empresas, e outra parte até sabe, mas se apega emocionalmente aos seus negócios e não consegue se desfazer deles quando o valuation está no seu ápice. Aliás, nem sabe o que é valuation… Mas sigamos.
Condomínio bem cuidado = valorização patrimonial
Agora vamos falar de condomínio. O que é o condomínio pra você? Sua casa. O lugar onde você mora com sua família, certo? Na maioria dos casos, é o patrimônio mais valioso da família. E, como a maioria dos brasileiros, um bem com o qual todos têm um imenso e compreensível apego emocional.
Mas deixa eu te fazer uma pergunta: você venderia o imóvel onde você mora? Claro que sim! Só depende de uma boa oferta, certo? Se for boa mesmo, tipo irrecusável, você pega esse dinheiro e vai morar num lugar melhor ainda, não é? Ou num lugar parecido e fazer outro investimento.
O fato é que ter um imóvel que seja valioso, permaneça valioso e, se possível, se torne mais valioso ao longo do tempo, pode representar mais do que o cidadão médio consegue compreender.
Por outro lado, se você tem um imóvel que um dia já valeu uma boa grana, mas, por negligência dos síndicos que administraram o condomínio, foi deixando de fazer as manutenções, foi ficando cheio de problemas, pendências, dívidas, etc, esse patrimônio vai valendo cada vez menos.
É como aquela empresa que ainda roda, mas já não gera mais lucro há algum tempo, mal pagas as contas do dia a dia (ou vive dando prejuízo), e se for vender, vai valer uma ninharia e você vai perder uma grana.
E geralmente isso ocorre - tanto na empresa quanto no condomínio - porque os donos preferem reduzir as despesas em detrimento do patrimônio. “Depois a gente faz isso, agora estamos apertados…”
A falta de educação financeira do brasileiro tende a fazê-lo enxergar mais valor na mera redução de despesas (que, quando feita de forma inteligente, deve sempre ser perseguida) do que na valorização do patrimônio.
Muitos jamais fizeram a conta pra verificar se isso que estou dizendo é papo furado ou se é real. Por isso, vou compartilhar com você um caso real que conduzi como síndico num condomínio que administrei.
O condomínio estava abandonado há anos. Assim que assumi, iniciei um programa de saneamento das finanças, reestruturação administrativa, mudança da portaria orgânica para remota, troca de gás em botijões por gás encanado, renegociação de contrato com fornecedores ou troca dos mesmos, parcelamento de dívidas, dentre várias outras, para trazer redução significativa de custos. Até aqui, muitos fazem exatamente como eu.
A diferença é que a maioria simplesmente repassa essa redução para as cotas condominiais, ou seja, se os custos baixaram, as cotas devem baixar proporcionalmente. E esse é o erro.
O destino correto dessa economia deveria ser para fazer investimentos no patrimônio para fazer reparos e reformas nas áreas comuns, por vezes sem precisar instituir taxa extra. E foi o que eu fiz.
As reduções de despesas mensais que obtive ao promover muitas mudanças internas correspondeu a uma redução na cota condominial de aproximadamente R$350/mês por apartamento. Bom, né? Mas ainda não é o filé.
Consultei um corretor de imóveis e verifiquei que o valor de mercado de cada unidade habitacional do condomínio, antes de qualquer reforma, era de R$600 mil. E vi que, pelo estado de degradação do prédio, havia um grande potencial de valorização se as reformas fossem feitas.
Negociei com os condôminos e propus que essa economia mensal de R$350 não fosse repassada às cotas condominiais sob forma de redução, e sim provisionada como capital a ser investido em patrimônio. Eles toparam.
Em dois anos de provisionamento, eles “renunciaram” a um total de R$ 8.400 (24x R$350) em reduções mensais da cota condominial. Juntamos esse dinheiro e fizemos as reformas.
Ao final da reforma, chamei o corretor novamente e pedi que avaliasse os apartamentos. O investimento feito nas áreas comuns trouxe uma valorização de 22% a 25% para cada apartamento, o que na época correspondeu a algo em torno de R$100.000. POR APARTAMENTO!
Resumo da ópera: os condôminos abriram mão de uma redução de despesas de R$ 8.400 em dois anos. Porém, receberam de volta R$ 100.000 em valorização do seu patrimônio. É uma alavancagem de 11,9 vezes o capital investido.
Entendeu agora o que eu quero dizer? A dificuldade do condômino costuma residir justamente no entendimento dessa conta, pois fomos educados para entender a linguagem do fluxo de caixa, com o dinheiro transitando na conta, e não no acompanhamento do valor patrimonial que, conforme acabo de comprovar, pode ser MUITO maior.
Não tem como reduzir mais nada? Institua taxas extras que caibam no bolso das pessoas. Só não ceda aos argumentos embolorados de “o condomínio já está caro demais”, ou “vamos fazer isso mais pra frente, agora está todo mundo apertado”. O momento ideal não chegará nunca.
E agora, quando fizerem a pergunta do início desse artigo, será que a sua resposta será a mesma?
(*) Sérgio Gouveia é síndico profissional, administrador, especialista em finanças, palestrante com experiência corporativa de sucesso no mundo condominial. Mais de 20 anos de experiência como gestor e mais de 9 anos de experiência como síndico. Autor do livro "Finanças Para Síndicos" (ed. Bonijuris) e influencer com o perfil nas redes sociais @derepentesindico