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Administração

Censo 2022

BA: Divulgação de dados pode ser afetada por recusa de condomínios

quinta-feira, 11 de maio de 2023
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Resistência de condomínios de luxo prejudica Censo 2022 em Salvador

Nos bairros do Comércio e Caminho das Árvores, mais de 700 entrevistas precisam ser feitas até o dia 28

Os recenseadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge) precisam enfrentar uma verdadeira empreitada para conseguir acessar os moradores do Condomínio Salvador Prime, no Caminho das Árvores. Uma sala chegou a ser reservada para que os agentes do Censo realizassem entrevistas, mas as respostas só ganharam volume quando uma carta sobre a multa em caso de recusa foi enviada aos apartamentos.

Salvador possui 15 bairros em que mais de 5% dos residentes não responderam a pesquisa, o que pode inviabilizar a divulgação de dados detalhados do Censo Demográfico de 2022. Para que as informações coletadas pelo Ibge retratem bem a realidade, é preciso que pelo menos 95% dos residentes de uma determinada região respondam ao questionário.

A situação é mais crítica nos bairros do Comércio e Caminho das Árvores, onde o percentual de residentes que participaram é de 82% e 84% respectivamente. Se as 715 entrevistas que restam nesses locais não forem feitas até o dia 28 deste mês, é possível que a primeira divulgação oficial sobre os bairros de Salvador não seja realizada. 

“Salvador não tinha legislação sobre os bairros no último Censo, em 2010 [...] Estamos nos dedicando muito nesses dois bairros para não correr o risco de termos um dado de baixa qualidade ou que, de repente, o Ibge avalie que se não é possível divulgar as informações sobre todos os bairros, é melhor não divulgar para nenhum”, afirma André Urpia, superintendente do IBGE na Bahia. Segundo ele, a situação dos outros 13 não é tão crítica como a dos bairros já citados.

O Censo Demográfico permite que se tenha um retrato detalhado da população, o que deve ser utilizado para a criação e implementação de políticas públicas assertivas. Quando o Ibge não consegue realizar a entrevista em uma residência, faz um processo chamado de imputação - que consiste na suposição de dados para um domicílio a partir da média de um setor censitário.

“A imputação não tem o impacto de inviabilizar dados gerais, como a população de Salvador, por exemplo. Mas, quanto mais precisamos imputar, menos preciso é o dado, o que pode impactar nas informações detalhadas sobre bairros e aglomerados subnormais” explica Mariana Viveiros, que coordena a divulgação do Censo 2022 na Bahia. 

São exemplos de informações detalhadas: trabalho e rendimento, deficiência, migração, deslocamento para trabalhar ou estudar e dados sobre a educação. A previsão original era de encerrar as entrevistas em outubro de 2022 no país, mas o fim da pesquisa foi adiado diante das resistências e dificuldades em contratar recenseadores. 

Empecilhos 

Nas três torres do Salvador Prime, localizado na Av. Tancredo Neves, a coleta começou em novembro e cerca de 600 apartamentos ainda não foram recenseados. Esse é um dos condomínios em que os agentes do Censo foram proibidos de interfonar e abordar moradores. 

A administradora também se recusou a colocar o informativo oficial do Ibge em que aparece a foto e identificação dos recenseadores responsável pela região em um local visível. Já a justificativa para a decisão de não interfonar para os moradores foi porque a atitude poderia ser considerada uma “violação à intimidade”. 

A alternativa criada pela administradora do Salvador Prime, já que não era permitido a abordagem direta dos condôminos, foi colocar os recenseadores em uma sala de reunião. O problema é que boa parte dos moradores não foi avisada disso e, em cinco meses, apenas 37 entrevistas foram realizadas.

A pesquisa só começou a acelerar quando uma carta com a Lei 5.534/1968 - que estipula multa de até dez salários mínimos (cerca de R$13 mil) para quem não responder ao Censo - foi enviada aos domicílios no início de abril.

A carta também tem o contato de Margarete Machado, a agente censitária municipal (ACM) atualmente responsável por recensear uma das torres do Salvador Prime. Desde o envio das cartas, ela realizou 35 entrevistas - quase a mesma quantidade que os colegas fizeram em cinco meses. Margarete, na verdade, trabalha no posto de coleta e não foi contratada como recenseadora, que é quem realiza a pesquisa de campo. 

“Diversos moradores que entraram em contato comigo disseram que não sabiam que os recenseadores estavam no prédio”, revela

Procurado, o setor jurídico do Salvador Prime negou que tenha dificultado o trabalho dos recenseadores e afirmou que não pode ser responsabilizado pela “falta de vontade de seus moradores em participar da pesquisa”. “O Condomínio auxiliou em tudo que foi possível, comunicou a todos os condôminos e disponibilizou uma sala para os atendimentos, todavia as pessoas não se interessaram e não desceram”, pontua.

O Salvador Prime justifica ainda que seria inviável disponibilizar o interfone para interfonar para as 1.196 unidades residenciais. 

As dificuldades em conseguir respostas em residências de alto padrão, seja por burocracias dos condomínios ou resistência dos moradores, não é exclusividade de Salvador. No dia 18 de abril, o Ibge promoveu uma ação de conscientização em áreas nobres de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Cuiabá.

O presidente interino do Instituto, Cimar Azevedo afirmou, em entrevista ao UOL, que a rejeição de recenseadores chega a 30% em condomínios no Rio de Janeiro, enquanto a média nacional de entrevistas sem respostas é de 5%

As localidades em que mais de 5% dos residentes não responderam a pesquisa representam 8,8% dos 170 bairros da capital baiana. Entre elas estão: Piatã, Patamares, Fazenda Grande II, Areia Branca e Mussurunga.

Diante do cenário, Salvador ainda se encontra no grupo de 25 municípios baianos que ainda estão na fase de apuração do Censo 2022. Cidades como Porto Seguro, Santo Antônio de Jesus, Itabuna e Ilhéus também estão nesse estágio. 

Beira mar

Do outro lado da cidade, na Avenida Lafayete Coutinho, o drama se repete. A administradora do Porto Trapiche Residence, condomínio de luxo localizado em frente à orla, não autorizou a colocação do informativo sobre o Censo e nem ajudou os recenseadores na missão de falar com moradores.

Os agentes só foram autorizados a ficar na recepção, mas como o local também abriga lojas, é quase impossível identificar quem é visitante ou não. Lá ainda restam 40 apartamentos a serem recenseados.

Assim como aconteceu no Salvador Prime, o trabalho dos recenseadores ficou inviável e a supervisora Maria Beatriz Carvalho, 24, precisou ser realocada. A administradora levou duas semanas apenas para autorizar sua presença na recepção do edifício.

Através da abordagem direta, Maria Beatriz entrevistou apenas quatro moradores. Quando o Ibge enviou a carta contendo informações sobre a multa, seis residentes entraram em contato com a supervisora. 

“Geralmente, a gente imagina que em locais onde as pessoas não entendem muito bem seria mais difícil do que onde tem pessoas mais estudadas. Eu fico chateada porque eles sabem da importância do Censo e não respondem porque não querem”, desabafa.

Maria Beatriz conta que moradores se recusaram a fazer a entrevista mesmo ela se colocando à disposição aos finais de semana, presencialmente ou por telefone. 

Em nota, o Porto Trapiche afirmou que jamais dificultou o trabalho de qualquer órgão público. “[A] eventual ausência do morador em seu apartamento, impossibilitando o trabalho do IBGE não é de responsabilidade do condomínio”, justificou. 

Moradores de condomínios citados na reportagem ou de outros que não tiveram os dados coletados, podem ligar para 0800 721 8181 ou discar 137 e solicitar que um recenseador vá ao local. Nessa etapa, também é possível responder as perguntas por telefone.

Recusa impacta na remuneração

Os recenseadores são remunerados de acordo com o número de entrevistas que realizam e, como a pesquisa não andava no Salvador Prime, ficou inviável mantê-los por lá. Por isso, Margarete Machado, que recebe remuneração fixa como agente censitária municipal, foi realocada para o condomínio.

Inicialmente, ela acreditava que fazer a pesquisa em bairros periféricos seria difícil, mas se surpreendeu com a resistência dos moradores de condomínios de alto padrão

“Todo mundo sempre falou que o problema seriam os aglomerados [denominação do Ibge para comunidades] porque as pessoas têm menos informações. Mas a gente enfrenta mais resistência em condomínios”, conta Margarete Machado

Em Saramandaia, por exemplo, a pesquisa chegou a ser interrompida mais de uma vez por conta de conflitos armados e, mesmo assim, realizar as entrevistas na localidade foi mais fácil, segundo ela. 

O tratamento dado aos recenseadores não é igual em todos os condomínios. Quando a administração ou o síndico dá suporte aos agentes, a pesquisa deslancha rapidamente. No condomínio Mandarim, localizado em frente ao Salvador Shopping, por exemplo, 95% dos moradores já haviam respondido ao Censo em fevereiro. Lá, os recenseadores puderam colar informativos e interfonar para os moradores. 

Desistências de recenseadores e falta de verba dificultaram a coleta

O atraso para a finalização do Censo Demográfico foi resultado de uma série de fatores para além da resistência de condomínios e condôminos. Entre eles, está a desistência dos recenseadores. Em setembro do ano passado, eles chegaram a decretar greve nacional com o objetivo de pleitear por melhorias nas condições de trabalho e salário. 

Na Bahia, foram disponibilizadas 12.485 vagas para recenseador, mas 13.877 pessoas passaram por esses postos. Isso significa que mais 1,3 mil pessoas tiveram que ser treinadas e admitidas. 

“Tivemos dificuldades em contratar e permanecer com o pessoal. O planejamento foi feito de forma distanciada da execução, o que tornou os valores previstos para os recenseadores desinteressantes e perdemos muitos deles logo no início”, ressalta o superintendente do IBGE André Urpia

O orçamento destinado ao Censo também foi motivo de atraso. A pesquisa deveria ser feita em 2020, dez anos após a realização da última, mas as verbas que seriam utilizadas foram destinadas para o combate à pandemia. No ano seguinte, o levantamento foi suspenso por falta de recursos. Dos R$3,4 bilhões necessários, foram aprovados R$2 bilhões. 

Íntegra dos posicionamento dos condomínios citados na reportagem: 

Salvador Prime:

É necessário esclarecer a verdade dos fatos. O IBGE tenta, a todo tempo, transferir a ausência de estrutura e apoio do Estado para a administração do Condomínio, que em nada pode ser responsabilidade pela falta de vontade dos seus moradores em participar da pesquisa. 

As informações prestadas pelo IBGE não são verídicas, o Condomínio auxiliou em tudo que foi possível, comunicou a todos os condôminos e disponibilizou uma sala para os atendimentos, todavia as pessoas não se interessaram e não desceram, fato que a Administração nada tem a fazer.

 Quanto a solicitação de interfonar para as unidades, tal expediente é muito dificultoso quando se observa uma realidade de 1.196 unidades residenciais.

Não há como indisponibilizar o interfone por tanto tempo e nem o condomínio tem pessoal suficiente para destacar para tal tarefa.

A informação dada pelos prepostos do IBGE não é verdadeira e não deve ser veiculada, o que precisa ser feito é uma campanha de conscientização promovida pelo poder público  para obtenção de maior adesão dos cidadãos. Não há como se transferir para a estrutura do Condomínio o dever/encargo de motivar os seus moradores a participarem da pesquisa. O IBGE deve se modernizar e utilizar as ferramentas do Estado para a promoção da pesquisa, não tendo o condomínio Edilício meios de substituir a função Estatal.

 O Condomínio Salvador Prime atuou com presteza e apoio dentro das suas possibilidades e vem sendo insistentemente importunado e culpado pela baica adesão dos seus condôminos.

Informe que dentro daquilo que for possível atender será atendido sempre, contudo não será tolerada qualquer imputação de fato inverídico ou veiculação de inverdades sobre a atuação da administração.

Porto Trapiche Residence:

O condomínio Porto Trapiche ressalta que jamais dificultou ou dificultará o trabalho de qualquer órgão público. Informa ainda que eventual ausência do morador em seu apartamento, impossibilitando o trabalho do IBGE não é de responsabilidade do condomínio. Por fim, o condomínio mais uma vez se coloca à disposição do órgão.

Fonte: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/resistencia-de-condominios-de-luxo-prejudica-censo-2022-em-salvador/

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