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Convivência

Violência doméstica

Vítimas contam como vizinhos salvaram suas vidas

quarta-feira, 14 de julho de 2021
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Meter a colher salva mulher: 'Se não fosse vizinho, meu ex teria me matado'

"Quando estava lendo sobre o caso do DJ Ivis, que foi denunciado por agredir a mulher, Pamella de Holanda, tudo o que vivi há onze anos voltou à minha cabeça: em junho de 2010, meu ex-marido tentou me matar. Me chamou a atenção o fato de Pamella ter contado com a ajuda da vizinha. Eu também passei por isso.

Meu ex trabalhava à noite e eu quase não o via. Naquele dia, ele chegou de madrugada e eu levantei para ir ao banheiro. Quando voltei para o quarto, ele perguntou se eu tinha pego não sei o quê que estava no banheiro. Eu disse que não, mas ele não acreditou e veio atrás de mim, ameaçando, me mandando devolver o que ele queria, que eu nem me lembro o que era. Pedi que ele me deixasse voltar a dormir, porque eu tinha trabalhado o dia todo e estava morta de cansaço.

Então, ele pegou meu celular novo e quebrou no meio. Fui para cima dele, tentar pegar de volta e começou a briga. Ele me jogou contra a janela e começou a me bater. Eu gritei por socorro até que o vizinho apareceu, pulando por cima de um muro de quase três metros. Só me lembro dele tirando meu ex-marido de cima de mim, pegando meu filho no colo e me mandando correr.

A mãe dele conseguiu chamar a polícia e avisar meus pais, que moram umas seis casas para baixo da minha. Meu pai e meu vizinho ficaram dentro da minha casa com o meu ex-marido até a polícia chegar. Enquanto isso, fiquei na casa da minha mãe.

Por sorte, meus dois filhos mais velhos [que na época tinham 3 e 7 anos] não estavam em casa e não viram o que aconteceu. Estávamos só eu, meu ex-marido e meu filho caçula, que na época tinha três meses.

Quando a polícia chegou, eu fui pra delegacia. Lá fui humilhada pelo escrivão, que ficava repetindo a pergunta: 'Mas você teve três filhos do agressor?'. Nesse mesmo dia, o juiz emitiu uma medida protetiva e ele teve que sair da minha casa.

A vítima de violência não é acolhida como deveria. Sempre tem alguém para questionar, fazer piadas, e isso machuca muito. Quando me separei, ouvia: 'Quem vai querer você com três filhos pequenos?' E 'apanhou por quê? O que você fez?'.

Esse vizinho foi diferente, ainda bem. E ele não era uma pessoa que a gente tinha amizade, era só 'bom dia' e 'boa noite', mas ele foi de extrema importância para a minha vida e para a vida dos meus filhos. Se ele não tivesse aparecido para me salvar, eu teria morrido. Algumas semanas depois, meu ex-marido invadiu minha casa com uma faca — queria me matar, com certeza. Por sorte, ouvi ele tentando entrar pelo telhado, antes de conseguir entrar na casa, e tranquei a porta do quarto. Ele conseguiu arrombar uma das portas e passou a noite toda na sala.

De manhã, enquanto ele dormia, consegui sair de casa correndo e chamar a polícia. Ele foi preso por descumprir a medida protetiva e passou seis meses na cadeia — nesse período, saiu o divórcio litigioso e nunca mais o vi."

"Eu não sorria, vivia nervosa. Minha vida era um inferno" 

"Aquela não foi a primeira vez, ele já tinha me agredido antes — meu filho mais velho, inclusive, presenciou algumas agressões.

Passamos oito anos casados e temos três filhos. Ele ficou agressivo desse jeito depois que eu engravidei da minha filha do meio — passei tanto nervoso durante a gestação que a bebê nasceu prematura, com 35 semanas. Tive uma outra gestação, mas perdi o bebê depois que ele me bateu com um capacete.

Quando não era agressão física, eram xingamentos. Eu tinha muito medo, porque ele me ameaçava e dizia que, se eu denunciasse, ia matar toda a minha família.

Além disso, tinha vergonha dos meus pais e, por conta da religião, sentia culpa ao pensar em me divorciar. Mas eu estava decidida a não apanhar mais. Fui até a igreja, contei para o padre, que me apoiou muito — como ele era amigo dos meus pais, ligou para eles e contou o que estava acontecendo.

Eu vivia pisando em ovos, morria de medo que ele me matasse. Para evitar brigas, me anulava completamente. Um dia, numa véspera de Natal, enquanto eu estava grávida, sumiram R$ 20 da carteira dele. Eu disse que não tinha pego o dinheiro, mas ele ameaçou enfiar uma faca na minha barriga se eu não devolvesse. Chorando, abri minha carteira e dei R$ 100, com medo dele me machucar ou machucar minha filha. No outro dia, ele levantou como se nada tivesse acontecido.

Minha vida era um inferno. Eu não sorria, vivia nervosa. Eu sustentava a casa sozinha porque, se eu pedisse dinheiro para as contas ou para alguma coisa das crianças, ele brigava comigo. Se ele achasse que eu era culpada de alguma coisa, pronto, acabou.

Até hoje, não consigo ver uma briga em que o cara está sendo agressivo e não intervir. Esses dias ouvi uma briga na rua. Abri o portão, entrei no meio e coloquei a moça para dentro de casa, enquanto o cara gritava que ia me matar também.

Agora eu entendo que poderia ter agido antes, que não deveria ter sido impedida pelo medo, porque sei que sou mais forte que meu agressor. Apesar de ainda doer muito, tudo o que aconteceu me deu força." Ana Paula Nachbar Camargo tem 40 anos, é comerciante e mora em Jaú (SP)".

Como denunciar

Se você está sofrendo violência doméstica ou conhece alguém que esteja passando por isso, ligue para o número 180, a Central de Atendimento à Mulher. A ligação é gratuita e o canal funciona em todo o país e no exterior, 24 horas por dia, recebendo denúncias, dando orientações e encaminhando as vítimas para serviços de proteção e auxílio psicológico.

O contato também pode ser feito pelo Whatsapp, no número (61) 99656-5008.

Outra sugestão, caso tenha receio de procurar uma delegacia, é ir até o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da sua cidade. Em alguns deles, há núcleos específicos para identificar a principal necessidade da mulher agredida pelo marido, psicológica e financeira, por exemplo, e dar o encaminhamento necessário. Também é possível realizar denúncias de violência contra a mulher pelo aplicativo Direitos Humanos Brasil e na página da Ouvidoria Nacional de Diretos Humanos, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

https://www.uol.com.br/

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