“Chuveirinho” na calçada
Ação de condomínio contra moradores de rua é contestada
Prédio estaria usando "chuveirinho" para evitar presença de moradores de rua na calçada
Medida foi confirmada por um funcionário de um dos condomínios envolvidos. Síndicos não atenderam a reportagem
Segundo relato de moradores da região, blocos de edifício do bairro Independência, em Porto Alegre, estariam usando uma instalação hidráulica para molhar as calçadas e, assim, evitar que pessoas usem as marquises do prédio para se abrigar durante a noite.
A situação chamou a atenção da moradora Cláudia Reis, que fotografou os "chuveirinhos" em ação na noite de quinta-feira da semana passada (25). Cláudia é moradora do bloco A do Edifício Esplanada, prédio de 15 andares na Ramiro Barcelos. A prática estaria sendo feita próximo aos blocos C e D — cada bloco tem uma administração condominial independente.
"Já reclamei nas portarias dos dois prédios. Uma das síndicas chegou a ligar para me insultar. As duas mandaram os porteiros me responderem que se eu estava com pena, deveria levar os mendigos para casa. Respondi que não se trata de uma questão pessoal, mas social, e que como moradora e cidadã eu não concordava com aquilo", conta Cláudia.
GaúchaZH esteve no local na tarde de segunda-feira (29). Em quatro pilares é possível verificar um pequeno cano vertical e uma instalação hidráulica. Não estava caindo água no local naquele momento, mas a calçada estava molhada mesmo com tempo seco. Dois homens estavam sentados entre os pilares e confirmaram que o sistema é ativado à noite com frequência.
"Durante o dia, eles ligam de vez em quando. Não tem muito horário certo. Mas quando fecha a farmácia aqui ao lado, aí eles ligam por um bom tempo e encharca tudo. Eles também passam creolina nos cantos dos pilares para o cheiro ficar desagradável", conta um dos homens.
Um funcionário de um dos prédios, que pediu para não se identificar, confirmou a prática. Disse, todavia, que ele procura avisar os moradores de rua antes de ativar o sistema, para não surpreendê-los.
"Eu aviso que depois que a farmácia fecha (às 22h), a água liga automaticamente. Na verdade, é a gente que ativa. Em geral, depois desse aviso, eles agradecem, levantam dali e vão para outro local. Não é algo que eu goste de fazer", declara o funcionário.
Segundo a assessoria jurídica do Sindicato da Habitação (Secovi/RS), uma obra hidráulica como a presente nos pilares do local deve ser aprovada em assembleia pelos condôminos.
"Mas isso não quer dizer que os moradores são coniventes com esse tipo de prática. Pode ter sido uma obra para facilitar a lavação da calçada sem o uso de torneira, por exemplo. Depois, se essa obra está sendo usada para esse outro fim, o condomínio precisa debater", declara o assessor jurídico do Sistema Secovi/RS, Tiago Strassburger.
A reportagem de GaúchaZH tentou contato com a administração dos condomínios, mas não foi recebida e não houve retorno dos pedidos de entrevista.
De acordo com a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), "não existe uma legislação que impeça essa atitude". Todavia, a Fasc ressalta que a forma correta de atuar junto à população de rua é contatar a prefeitura a fim de que seja realizada uma abordagem social. A Central de Abordagem Social funciona no telefone 156 ou (51) 3289-4994 (das 8h30min às 21h). Após 21h, o telefone para contato da abordagem noturna é (51) 3346-3238.
Fonte: gauchazh.clicrbs.com.br